Capítulo Bônus II

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Jeremi Clifford





Se fossemos desmembrar a palavra vida, teríamos diversos significados e conjecturas. Ela pode ser entendida simplesmente como o oposto da morte, por exemplo, mas também pode ser compreendida ao percebermos a forma em que se vive. E é aí que entramos em um ponto de muita divergência, o que seria viver? Existir? Aproveitar a vida? Perdurar no tempo? Como alguém que já viveu muito, posso dizer que viver é de fato prazeroso, que realmente é existir enquanto perdura o tempo. No entanto só se vive de verdade quando se tem uma razão. Algo que alimente sua vontade de viver. E eu perdi a minha.

Cassandra Lewandowski era a garota perfeita, desde meus tempos de adolescente. Seus olhos eram duas esmeraldas brilhantes, que faiscavam cada vez que eu dizia que a amava. Sempre alegre, com um sorriso encantador nos lábios. Fomos amigos de infância, crescemos juntos e logo entramos em um relacionamento sério. Cem anos de casamento depois tivemos nosso primeiro filho, mas infelizmente Conor não chegou a nascer. O brilho no rosto da minha esposa começou a desvanecer, seu sorriso não alcançava seus olhos, sua alegria já não era àquela que uma vez fora. Apesar de tudo não desistimos, e vinte anos após o acontecido meu segundo filho nasceu.

A tristeza foi embora e a alegria reinou em minha casa. Valentim cresceu forte e saudável, era travesso e adorava importunar as crianças dos serventes. Com três anos seus poderes apareceram, Valentim começou a se distanciar das demais crianças da sua idade e iniciou seus estudos. Não foi uma decisão fácil, nenhum pai gostaria de trocar a infância de um filho pelo aprendizado precoce.

_ O que adianta pai? As outras crianças não sabem fazer magia ainda, como vou brincar com elas? Eu não sou normal.

Era o que ele sempre me dizia quando eu tentava fazê-lo ser e agir como uma criança normal. Normalidade. Era comum que as heranças despertassem por volta dos dez, doze anos. A probalidade de que o despertar acontecesse antes era muito baixa, tão baixa que naquele século pouquíssimas pessoas foram inseridas nesse "quesito". Mas quando alguém despertava sedo demais era visto como alguém incomum, como uma pessoa anormal. E era assim que Valentim se sentia.

Enquanto nosso menino se tornava um homem, as coisas em nossas vidas foram se tornando rotineiras. Estávamos tão acostumados com a vida tranquila e monótona que tínhamos que esquecemos de que sempre levamos rasteiras quando menos esperamos. E a rasteira que a vida nos deu nos fez cair de uma forma devastadora.

Cassandra partiu.

Se entregou nos braços de Morfeu* e nunca mais retornou. A vida que tínhamos ficou vazia. No lugar do coração restou apenas uma cicatriz profunda que nunca pôde ser tratada, sangrando intensamente enquanto pulsava a dor da perda. Seguimos vivendo, apesar de tudo, ainda que parecíamos mais mortos que vivos. E àquele que mais sofreu, foi, sem dúvida, Valentim. Meu filho era tão grudado em sua mãe que por vezes pensei na possibilidade de nunca ter netos, afinal, quando seria presenteado com uma nora quando meu filho sequer conseguia deixar a barra da saia de sua mãe?

_ Pai? _ disse Valentim, enquanto olhava a propriedade pela janela do escritório, olhei para ele, mostrando que tinha minha atenção _ Eu vou partir.

Os documentos que estavam em uma das mãos caíram, assim como a caneta que estava na outra. Ele iria embora? Por quê? O olhei sem entender, ainda processando a informação.

_ Qual seria o motivo de sua repentina partida?

Valentim não ousou me encarar nos olhos. Estava tão quieto, mais do geralmente era.

_ Eu não aguento mais pai _ meu filho suspirou longamente. Virou-se em minha direção, caminhou até a poltrona que havia a minha frente, próximo a minha mesa, onde se sentou _ Eu não consigo mais viver aqui, faz anos que ela se foi e ainda não consegui superar. Nossa casa é tão grande e ficou tão vazia. Não consigo passar pela sala sem vê-la ali, aproveitando a quentura da lareira nos dias frios. Quando vou a cozinha, consigo vê-la fazendo àqueles biscoitos amanteigados que só ela sabia fazer. Quando vou ao quintal, vislumbro o jardim, onde ela passava seu maior tempo. Quando eu me olho no espelho, vejo a minha mãe em mim, e se não fossem pelos meus olhos, eu poderia jurar que ela estava ali, na minha frente.

Levantei do meu assento e fui ao seu encontro. Me ajoelhei a sua frente, segurei firme suas mãos. Ele soluçava, sua mãos tremiam tanto, até mais que o corpo, que balançava a cada soluço.

_ Eu sinto tanta falta dela.

_ Eu sei filho _ dei vários tapinhas em sua costa, como forma de consolá-lo _ Eu também sinto.

Ficamos ali, daquela forma, por bastante tempo, consolando um ao outro. Dois dias depois ele partiu. Não me disse para onde ia, em seu lugar disse me que vagaria por aí, e por mais difícil que fosse, tive que deixá-lo ir. Quem sabe nomeio de sua jornada ele encontrasse algo ou alguém que desse um novo sentido para sua vida, que lhe resgatasse daquele rio de amargura, que o engolia cada vez mais.

Anos mais tarde me isolei, desapareci com meu rastro, assim viveria sem ter problemas com o concelho. Não voltei a ver ou me comunicar com meu filho. Até que tive uma visão.

Eu era apenas um observador, não podia me falar com ninguém, era invisível para eles. Meu filho sorria com um pequeno pacote nos braços. Ao seu lado havia uma garota, cabelos negros azulados e olhos azuis como o oceano. Ambos se olhavam com tanto amor e carinho que sabia que àquela garota havia sido a salvação de Valentim.

_ Ela será Samantha, minha doce Sam _ disse a mulher, olhando para o embrulhos nos braços de Valentim _ Espero que cresça com muito amor e graça, que seja simplesmente a nossa pequena luz.

O embrulho se sacudiu, soltando risos fofos e alegres de um bebê. Cheguei mais perto dela, de forma que pude contemplar sua beleza, os traços que herdara de Valentim foram poucos, apenas se via os lábios bem desenhados e cheios, com as bochechas bem salientes, mas era quase a cópia perfeita da mãe.

Quando encarei seus olhos fui surpreendido. Bastou meus olhos entrarem em contato com os dela para que eles tomassem uma coloração diferente. Seus olhos se tornaram alaranjados. E essa coloração podia significar apenas uma coisa. Àquela criança havia recebido uma grande benção, e, ao mesmo tempo, uma terrível maldição.

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*MORFEU -  é o deus do sonho na mitologia grega. Quando usamos a expressão vá para os braços de Morfeu, significa "ter um sono tranquilo, com bons sonhos".

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Beijinhos, Katryni.

Eu Não Sou De Vidro - HIATUSOnde histórias criam vida. Descubra agora