Carnívoro

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Correndo... Sue enfim estava correndo, correndo como jamais havia corrido, correndo para escapar, para se libertar, para sobreviver. Ela corria por sua vida ou quem sabe direto para o fim... A verdade é que isso já não importava.

Naquele momento, tudo o que ela queria era continuar correndo e nem mesmo a boca amordaçada ou as mãos atadas a incomodavam, tampouco a certeza de acabar perdida no meio da mata fechada a assustava. Manter as pernas livres para correr era a sua única preocupação, certa de que nada na floresta à sua volta teria condições de lhe dar uma morte ainda mais horrenda que aqueles que a perseguiam. Então sob a luz inconstante de um pálido pôr do sol e com uma angustiante série de gritos ecoando ao fundo, ela continuava avançando incansavelmente, seguindo através de um caminho obscuro, confuso e repleto de obstáculos.

Os gritos eram de Juan e Alberto, seus melhores amigos, pobres vítimas de um dos mais torturantes métodos de execução, o esfolamento, algo que certamente também teria sido o destino da própria Sue, caso a mesma não tivesse conseguido atingir os testículos do líder dos sequestradores, quando este fez menção de violentá-la. E por isso ela agora corria, porque tinha como combustível tanto o odor acre do homem que havia tentado se forçar sobre ela quanto a imagem de Alberto com quase toda a pele do corpo arrancada, enquanto seu carrasco já afiava o facão de carne, se preparando para fazer exatamente o mesmo com Juan.

"Eles ainda estão gritando... Ainda estão vivos!? Por favor, Deus... Permita que morram de uma vez, eles não merecem sofrer assim.", ela implorava em silêncio, desejando com todas as forças que de algum modo aquele tormento chegasse logo ao fim, mas infelizmente isso ainda estava longe de acontecer...

De repente, um forte estampido abafou momentaneamente todos os sons do ambiente e Sue acabou tombando logo em seguida, subjugada por um nível de dor que jamais imaginara experimentar. Um projétil de baixo calibre havia acabado de lhe trespassar o ombro esquerdo e a subsequente queda que ela veio a sofrer, não poderia ter ocorrido em um lugar menos propício, pois a mesma estava bem ao lado de uma ribanceira quando tudo aconteceu.

Ela então rolou morro a baixo, despencando diretamente para o meio de um denso e espinhento matagal. O atirador chegou ao local da queda não mais que alguns segundos depois e sequer se deu ao luxo de pensar duas vezes, voltou sua arma para baixo e disparou novamente, a fim de se certificar de que seu alvo havia sido abatido.

***

"E quando tudo parecia perdido, quando a morte e a desesperança se faziam tão perenes quanto céus e terras, uma voz clamou na escuridão..."

Um poderoso urro bestial, tão imponente quanto o rugido de um leão e tão aterrador quanto o estrondo de um trovão, repeliu as trevas e rasgou as sombras em instantes, arrastando a consciência de Sue para fora da mais obscura das profundezas abissais.

Ela despertou abruptamente e se levantou em um salto, certa de que havia algum tipo de monstro no seu encalço.

Estava apavorada, com o coração disparado e a respiração vacilante, quase como se já estivesse prestes a desmaiar novamente. Por sorte, não precisou de muito para perceber que na verdade se encontrava completamente sozinha, o que a levou a concluir que aquele som aterrorizante jamais poderia ter vindo de outro lugar que não de um pesadelo.

Tentou se acalmar enquanto já ia removendo a mordaça de sua boca e as amarras de suas mãos, mas terminou apenas trocando o irracional medo de monstros por um bem mais palpável, seus ferimentos.

Fora o óbvio estrago causado pelos tiros, agora estava cheia de hematomas e outras feridas leves, além de um profundo corte no joelho, sem mencionar que vinha sentindo uma pontada forte toda a vez que respirava um pouco mais rápido, um possível indício de que uma de suas costelas estava quebrada. Ainda assim, sua determinação era tamanha e seus níveis de adrenalina continuavam tão elevados, que nenhum desses ferimentos se fez capaz de impedi-la, muito pelo contrário, dor era agora tudo o que ainda a mantinha plenamente consciente. (...)

Contos de CorianderOnde histórias criam vida. Descubra agora