Capítulo 4 - Lucas

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O dia amanheceu cinzento, como a tempestade de ontem fez prever. Ainda assim, as ruas da capital estão apinhadas de mercadores, de Vespasianos que tentam fazer negócios com os respetivos Clientes (4) e de plebeus desesperados por algum lucro. Normalmente, é nos dias em que as piazzas estão cheias de gente, como hoje, que se conseguem encontrar produtos essenciais a bom preço. Caso contrário, é quase impossível.

Tento passar pelo aglomerado de gente o mais depressa possível, empurrando várias pessoas para conseguir chegar a minha casa. Sophia, a minha irmã mais nova, mandou um Cunciliatori entregar-me um bilhete com uma única coisa escrita: Sophia Praetextatus, Vespasiana de Sangue. E eu sei que ela só me envia bilhetes assim quando alguma coisa se passa.

Finalmente, avisto as colunas perfeitamente pintadas de branco e a porta de madeira de minha casa. Na entrada dos Clientes, alugada a algumas famílias que o meu pai conhece, uma mulher e uma criança tentam regatear o preço de um vaso, mas Petrónio parece irredutível. A criança começa a chorar e a mãe tenta acalmá-la.

Quando me aproximo, Petrónio olha para mim de sobrolho franzido. Sabe que lhe posso estragar o negócio: se os plebeus que por aqui passam me conhecerem e tiverem medo suficiente para se afastar, o dia estará arruinado.

— Lucas Praetextatus – diz ele, trincando o maxilar. – Não há quem o veja. Suponho que a família não seja importante para um Esgrimista, está claro.

A mulher que regateava o preço do vaso olha para mim e, ao avistar o meu uniforme militar, recua ligeiramente. Pega na mão da criança que a acompanha, puxando-a contra o seu corpo.

— Eu não tenho tempo para os teus sermões, Petrónio – digo, enquanto olho com desagrado para a fruta podre que ele deixou acumular-se numa das divisões da minha casa. – Aquele vaso. Quanto custa?

— Treze kromes de bronze.

— Estás louco! – Olho para o vaso. É simples, mais simples do que as pedras da calçada. Não pode custar isso. – Dou-te sete por ele. E é se não quiseres que avise o meu pai de que a parte da casa que está ao teu cargo mais parece uma lixeira.

Os olhos de Petrónio movem-se furtivamente para a fruta podre, enquanto ele franze o nariz para tentar descobrir se o cheiro já chega aqui. Chega; estou a senti-lo.

— Parece que não gostas de fazer negócio na rua principal da capital do império, Petrónio – começo, quando ele não diz nada. – Se o dominus do clã Praetextatus vir aquilo, vais parar ao olho da rua. Mas tu é que sabes. A escolha é tua.

Começo a caminhar em direção à porta principal, mas ele chama-me.

— Espere. – Olho para trás e reparo que a mulher e a criança ainda estão no mesmo sítio. – Não sei para que é que um Esgrimista poderá querer uma quinquilharia como esta, mas aqui tem. Sete kromes de bronze.

Tiro o dinheiro do bolso e dou-lho, pegando no vaso. Realmente, não é muito bonito. Não é cheio de arabescos, como aqueles que decoram o átrio de minha casa, mas compreendo o motivo pelo qual a mulher estava tão interessada nele: é útil para transportar água.

Aproximo-me dela e da criança. Sei que não vão olhar para mim; provavelmente, vão tentar afastar-se o mais depressa possível. Mesmo assim, estendo a mão na sua direção e ofereço o vaso à mulher, sorrindo um pouco. Ela olha para mim, desconfiada.

— Aceite, por favor – digo, continuando a sorrir. Não é algo que faça regularmente, por isso sinto-me desconfortável. – É um presente.

A mulher não aceita. Em vez de esticar o braço e pegar no vaso, parece encolher-se ainda mais contra a parede, segurando a mão da criança como se a sua vida dependesse disso. Talvez isso fosse verdade, se estivesse perante outro Esgrimista. Um menos humano, menos moral.

Um Império em ChamasOnde histórias criam vida. Descubra agora