Epílogo

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Serkan entrou no jardim florido e sorriu ao ver a quantidade de tulipas plantadas no corredor de acesso à casa central. Era sua assinatura pessoal. 

Sentiu o pequeno menino inquieto se mexer freneticamente em seus colo e soltou-o no chão, mas não sem dar a ele instruções de comportamento. 

- Não pise em nenhum canteiro e não grite, está bem? Acho que Sila está aqui também, vá encontrá-la para que possam brincar. 

O garoto concordou rapidamente e se pôs a correr, deixando o homem livre para procurar aquela que era o motivo de sua visita. Avistou-a abaixada perto de um vaso, cuidando cuidadosamente de uma rosa solitária. 

- Tendo dificuldades por aí? - Exclamou alto, chamando sua atenção. Ela olhou-o assustada, mas logo sorriu levantando-se e esperando que se aproximasse. 

- Serkan? O que está fazendo aqui? - Perguntou sincera enquanto o recebia para um abraço. Ambos fecharam os olhos desejando que pudessem demorar mais alguns segundos naquele aconchego, mas o bom senso fez com que se afastassem antes das coisas ficarem estranhas.

- Vim te encontrar. Você sabe o motivo. - Ela balançou a cabeça e engoliu em seco. Sabia. Era mais um aniversário desde o dia em que deveriam ter casado. E, embora a tradição parecesse mórbida para alguns, a garantia de que se encontrariam nessa data todos os anos acalentava o coração dos dois. 

O ato não poderia ser classificado como uma comemoração ou algo do estilo, mas sim uma prova silente de que passasse o tempo que fosse aquilo permaneceria especial para ambos. 

E era verdade. 

No íntimo de seus seres nada havia mudado e provavelmente nem iria, amavam-se perdidamente, mas secretamente. 

E assim levavam ano após ano o segredo de se encontrarem, aonde quer que fosse, com as circunstâncias que o dia lhes oferecesse, como naquela tarde ensolarada de quarta-feira em que Eda tinha se recolhido em um dos jardins que projetava e Serkan havia ido até ela. 

Nada demais acontecia em nenhum desses encontros, é claro. Estavam, afinal de contas, ainda comprometidos com outros e eram responsáveis e corretos o suficiente para respeitar as situações sem que os sentimentos lhes tomassem as rédeas. Mas tinham conseguido chegar em um meio termo em que o simples fato de passarem algumas horas juntos pudesse ser combustível para meses e meses de contato escassos. 

Haveria de bastar. 

- E como me achou? - Ela perguntou curiosa. - Eu iria te ligar quando saísse daqui. 

- Melo. - Ele deu de ombros e sorriu, arrastando consigo o sorriso da mulher a sua frente também. - Ela disse que você estava terminando este jardim para que possamos entregar a casa pronta na semana que vem. E disse que Sila estaria aqui também. Espero que não se importe, mas trouxe Baki comigo, achei que seria bom para que a distraísse um pouco

- Claro, Claro. Melo! Eu deveria ter imaginado. - Eda fingiu achar ruim e Serkan rolou os olhos. - Venha, vamos entrar, vou te fazer um café. As crianças vão ficar bem por aí.

Entraram na grande casa que Serkan tinha projetado há não muito tempo e Eda sorriu. Seus jardins e as plantas dos imóveis de Serkan eram extremamente complementares, como se os projetos não pudessem caminhar bem sozinhos, como se o talento de um fosse feito para que pudesse ser aliado ao talento de ambos. Eram uma boa dupla em qualquer âmbito. 

Não demorou muito para que estivessem compenetrados em conversas diversas. Falavam de tudo, sentiam de tudo, queriam de tudo, mas recolhiam-se à linha tênue de um limite imaginário traçado silenciosamente entre ambos. Eram o que poderiam ter.

Voltaram ao jardim depois de um tempo e seus olhos instantaneamente recaíram sobre o pequeno par que brincava perto de onde estavam. 

Sila ouvia atentamente a explicação de Baki sobre as rosas e sorria. Serkan falava tanto sobre flores que o menino havia desenvolvido um interesse pessoal nelas e aprendia, dias após dia, sobre o tema. Era o pedacinho da Eda Yildiz que ele havia, silenciosamente, plantado no filho, e era sua parte preferida no garoto. 

Eda inconscientemente havia feito o mesmo com a filha. Comentava tanto sobre as estrelas que a menininha já sabia de cor e salteado as constelações e suas localizações, e já havia decorado também a localização exata da estrela preferida da mãe, mesmo sem saber o motivo. Se Eda não poderia tê-lo para si, tinha ao menos feito com que sua menininha pudesse lembrá-lo. 

- Eles se dão muito bem. - Comentou Serkan despretensiosamente. 

- Ah sim, muito. Talvez tenhamos trabalho com os dois no futuro. 

- Você acha? - Ele perguntou se questionando pela primeira vez se a amizade entre as crianças poderia florescer dali a alguns anos. 

- Acho que sim. Talvez eles possam viver por nós o que tivemos que deixar para trás. - Eda comentou mais baixinho e olhou em seus olhos esverdeados. Viu ali compreensão e carinho e sabia que o seu olhar estava espelhado com exatamente os mesmos sentimentos. Queria tocá-lo, abraçá-lo mais uma vez, mas na frente das crianças não seria adequado. 

- Que eles sejam sortudos o suficiente para isso, então. - Serkan concluiu mordendo os lábios e balançando afirmativamente com a cabeça. - Não dizem que os pais sofrem e vivem com seus filhos? Espero que possamos finalmente sentir tudo através deles. 

- Que Allah permita que sim. - Ela concordou, chamando a filha em seguida e colocando-a nos braços. - Acho que devemos ir, está tarde já. 

Serkan pegou o menininho pela mão e olhou para cima, encontrando uma feição doce sendo dirigida aos dois. Queria que o quarteto ali presente pudesse dividir um sobrenome só, que Sila também fosse sua, e que sua Peri Kizi e ele pudessem juntar sua parceria para além do ambiente profissional. Mas só poderia querer...

- Foi um prazer encontrá-las, senhoritas. - Disse doce paras as meninas, que alargaram o sorriso. 

- Nossos sentimentos são mútuos, Serkan Bolat. - Eda respondeu de brincadeira. 

Acenou em silencio e virou as costas com o garotinho, que acenava freneticamente para trás. Permitiu deixar seu olhar recair sobre Eda mais uma vez e sentiu o coração apertar de saudades. Sabia que o dela deveria estar igual... ah, o amor, não importava o tempo, ele jamais mudava! 

Entrou no carro já contando os dias para que a essa mesma data chegasse logo no ano seguinte. Mal poderia esperar. 


Kalp UnutmazOnde histórias criam vida. Descubra agora