Leo

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As malas estavam prontas. O pouco que eu havia trazido à Califórnia foi colocado em algumas mochilas velhas que Kurt havia me dado. Ele têm me ajudado a passar por essa situação, tenho que admitir... ele têm sido tudo o que me sobrou desde aquele dia.

Já fazia quase um mês. Eleanor não havia me procurado de forma alguma, sequer ouvi o nome dela pelos seus amigos. Jack, Matt e até mesmo Luke também têm tentado entrar em contato com ela, mas nada adiantou. Eleanor decidiu sumir. Não fisicamente, claro... nós todos sabíamos que ela estava em sua casa, completamente segura - se é que dá pra chamar "morar na mesma casa que um chefe de tráfico" de segurança. Essa não era a questão. A questão é que Eleanor decidiu sumir, decidiu por si própria. E mesmo que isso doesse, nós respeitamos. Os caras entenderam que ela precisava de um tempo e simplesmente aceitaram. Mas eu entendia o que aquele silêncio significava. Eleanor estava em choque, e não conseguiu aceitar o que aconteceu. Não conseguiu me aceitar. Eu sei, parece idiota pensar em como tudo aconteceu tão rápido, pensar que na realidade nunca tivemos nada sério, sequer nos beijamos, e eu realmente não entendo o que me faz estar tão acabado, como se... como se eu tivesse perdido tudo. Mas a verdade é que eu não tinha nada. Nem mesmo tive Eleanor, e nem cheguei perto disso, graças às decisões idiotas que tomei no passado.

Ainda me pergunto se tudo isso teria acontecido caso eu não tivesse aceitado aquela proposta no início de tudo, em New York.

E lá vou eu de novo. De volta a New York, com três mochilas cheias como se eu ainda tivesse um destino ou a porra de uma esperança, quando estava quase que estampado na minha cara que eu não tinha mais nada. E talvez eu nunca tivesse tido.

- Tudo pronto? - Kurt me pergunta quando me vê passar pela porta do quarto com as malas. Seu rosto parecia cansado, mas nem de perto parecido com o meu. Eu sentia o peso das minhas olheiras caindo sobre as minhas bochechas, e meus olhos ainda ardiam pelo choro recente. Eu não estava pronto, definitivamente.

- Sim. - Assinto com a cabeça, esperando alguma reação dele além de pura e genuína dó.

- Você já falou com Brooks? - Ele pergunta pela segunda vez na semana. Kurt não conseguiu aceitar a decisão que tomei, e sinceramente, nem eu.

- Sim, Richard entrou em contato com ele. Está tudo certo.

- E como vai ser? - Kurt insiste.

- Assim que chegar em New York, vou pedir um táxi... - Gaguejo, relembrando o plano que Brooks escreveu na carta que Richard me entregou. Completamente lacrada. Nem mesmo Richard sabia o que aconteceria.

Kurt me olha com cautela, engolindo em seco.

- ...e o pedir para me levar ao presídio no The Bronx. - Ainda sem conseguir encarar Kurt, consigo sentir a piedade exalando de seu olhar. - Vou me entregar. Eles vão pedir o nome do fabricante ou fornecedor que me comandava, vão pedir o "chefe"... E eu vou entregar Richard Crawford.

A carta que Brooks me enviou de New York através de Richard estava lacrada, e ele dizia ser extremamente confidencial. Pelo que Kurt me disse, Brooks ameaçou qualquer um que sequer a tentasse abrir. No começo eu não tinha entendido, mas quando a abri ficou mais do que claro. Brooks queria que eu entregasse Richard Crawford: o chefe dos seus negócios aqui na Califórnia; meu chefe... o cara que descobri ser o pai de Eleanor. Pelo que entendi, Richard não têm colaborado com alguns negócios por aqui, e têm pedido cada vez mais o aumento do valor que ele ganha com as entregas. De acordo com ele, "a Califórnia consume muito mais do que grande parte do país, e tenho uma família para sustentar". Chega a ser engraçado.

- Acha que vai conseguir? - Kurt me perguntou de novo. Eu estava prestes a responder, já que não duvidava das minhas capacidades, mas ele me interrompe: - Me refiro à entregar o pai dela.

Tive que refletir sobre a situação. Ele estava certo, o que me prenderia à confessar seria Eleanor. Mas sinceramente, ela é o motivo pelo qual decidi fazer isso. Eu precisava sair do tráfico, precisava ser punido por ter feito parte dele. Talvez dessa forma eu pudesse merecer estar com ela um dia. Merda, eu pareço um idiota inconsequente e iludido.

- É porquê você é. - Kurt desperta meus pensamentos, me fazendo perceber que eu não só pensei, mas falei a frase em voz alta - Que merda, cara... vocês nem se beijaram, ou sei lá!

- É meio bizarro. - Um breve riso escapa da minha boca antes que eu percebesse.

- É estranho. - Kurt concluiu.

O relógio no canto da sala apitou, me lembrando que faltava 1 hora para o vôo. Kurt me ajudou com as malas, descendo as escadas e me acompanhando até a porta do prédio. Um táxi estava parado logo na frente e me perguntei se Kurt já havia o chamado, tentei me lembrar de ter o visto usando o telefone do apartamento para chamar algum, mas não consegui. Quando o olhei, ele parecia tão confuso quanto eu. Suas sobrancelhas se franziram e logo depois, as minhas. Mesmo que fosse comum encontrar táxis pelo meu bairro, raramente eles paravam na frente de algum prédio ou alguma casa, a menos que alguém tenha solicitado. E pela cara de Kurt, tão perdida quanto a minha, nenhum de nós o fez. Segundos depois a porta traseira se movimentou, e um par de tênis pretos se apoiaram no chão. Uma das mãos se apoiou acima da porta e sua cabeça surgiu.

Era Eleanor. E por mais incrível que parecesse, ela parecia melhor do que nunca. Estupidamente perfeita, chegava a ser humilhante. E dessa vez não usava calças e uma blusa estilosa e estampada com o nome de alguma banda que eu era completamente viciado... ela usava um vestido curto e solto, preto como os tênis. Preto como seu cabelo, preto como o leve lápis de olho que ela usava. Mesmo se Eleanor um dia tentasse forçar o preto a se tornar algo agressivo nela, em um enterro, uma crise de rebeldia ou o que quer que seja, ela não conseguiria. O preto se encaixava nela como a peça de um quebra-cabeças que havia sumido há muito tempo, e que agora ela a achou. Não tirava nem uma pequena parte da personalidade sensível e frágil que vivia dentro da máscara de Eleanor, era quase como se fizesse parte dela. E ali, na minha frente, era como se ela fosse uma visão, alguma ilusão de ótica projetada pela minha cabeça. Eu não acreditava que um dia voltaria a ver Eleanor, pra ser sincero. Meu plano era me entregar à polícia de New York pra que eu pudesse me perdoar primeiro, e acreditar que um dia eu pudesse merecer conhecer alguém como ela.

Mas eu estava errado.

Não há e nunca haverá alguém como Eleanor.

E quando a vi naquele momento, de pé em frente àquele táxi amarelo, o destino deixou isso muito claro.

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N/A

Espero que vcs não tenham desistido de mim kkkkkk
Me perdoem, parece que há uns dias essa história têm passado pela minha cabeça várias vezes e senti muita falta dela. Já tenho tudo em mente, e tô muito animada pra continuar ❤

Um eterno obrigada a vocês por continuarem vontando e comentando, quero lembrar vcs que é isso que me mantém motivada. Vcs são incríveis, 3.2K de views... SURREAL! ❤❤❤❤

Underground (1992)Onde histórias criam vida. Descubra agora