Depois do incidente em West Village eu saí praticamente espumando de raiva. Desde que mudei para a Califórnia aquele jardim têm servido de refúgio pra mim, e eu me sentia completamente longe dos meus problemas quando eu ia ali. Foi o que tentei fazer naquela noite: fugir dos meus problemas. Mais uma vez aquele meu chefe tinha me enchido o saco por eu ter atrasado mais uma entrega, e como eu tenho estado distraído. West Village pareceu um bom lugar para esquecer todo o estresse que tenho passado por ali, mas tudo se tornou pior quando vi a silhueta de Eleanor andando pelo estacionamento. De primeira fiquei feliz por termos uma chance de esclarecer o que aconteceu na noite em que nos conhecemos, e mesmo ter a chance de tentar mudar a primeira impressão que ela teve de mim. Porém, quando notei a presença de Luke minhas veias ferveram de ódio, já que percebi que ele estava a um passo à frente na merda do acordo que fizemos. Toda a minha sanidade sumiu, e eu quase iniciei uma briga ali mesmo. O que me segurou foi a presença de Eleanor, porque sinceramente, eu e Luke não queríamos que ela soubesse o que está acontecendo por enquanto.
De qualquer forma aquele incidente acabou com a minha noite e me fez acordar com um mal humor indescritível. O caminho até o galpão de Richard — O meu chefe e também chefe dos "negócios" de Brooks aqui na Califórnia — é quase que torturante. Eu estava me preparando psicologicamente pra mais uma bronca por estar atrasado.
— Bom dia, flor do dia. — Um de seus seguranças, provavelmente Thruman (prefiro chamá-lo de lambe-saco do Richard), percebeu meu estresse e me provocou. Entrei no galpão revirando os olhos e dei de cara com Richard completamente estressado.
— Certo, Leonardo, é o seguinte... — Ele começou. — Trabalhei a merda do turno noturno inteiro e tive que te esperar mais 20 minutos porquê estava atrasado. Que merda é essa? Quem está dando ordens aqui?
— Desculpa, chefe. — Arrisquei, desviando o olhar do seu rosto e quase explodindo de raiva.
— Acha que desculpas são o suficiente? — Ele parece quase pior que eu, seu humor estava péssimo. "Precisa comer a merda de uma vadia", pensei comigo mesmo. Aquele cara não deve transar há anos. — Você fez a entrega? Encontrou Axel?
— Sim. — Respondi, rígido. Eu provavelmente iria apanhar.
— Ótimo. — Richard parecia pensar, andando de um lado para o outro. — Não honraria meu sobrenome se saísse daqui intacto. Sou a merda de um Crawford.
Previsível. Completamente previsível.
— Thruman, Chester, terminem logo isso. — Ele ordena, pegando uma pasta e saindo do galpão em seguida. Ambos vêm em minha direção, me fazendo sentir minha cabeça virar brutalmente quando um punho alcança meu rosto. Havia só começado.
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— Que merda é essa no seu rosto, cara? – Kurt pergunta, franzindo as sobrancelhas quando me vê entrando em seu carro. Antes que eu responda, ele gira a chave e começa a dirigir em direção ao bar que combinamos. Hoje seria uma comemoração de algumas pessoas do colégio dele sobre a última semana de aula.
— Uns caras me viram ajudando uma mulher com as compras e acharam que eu estava assaltando. — Menti. Tá aí uma coisa que sou terrivelmente péssimo: mentiras. Aparentemente Kurt caiu e começou a rir.
— Que merda. — Ele comenta ainda entre risos. — Deve ter apanhado muito, eles acabaram com você.
Checo o espelho do seu carro e percebo a região roxa perto do meu olho. Ignorei o que Kurt dizia e prestei atenção na rua, ainda refletindo sobre tudo que tinha acontecido naquela semana.
— Leo. — Ele chama minha atenção depois de alguns minutos calado, com algo como Bon Jovi tocando bem baixo, se não me engano. — Aquele lance com Luke não é certo, cara.
— Eu sei. — Bufo, me lembrando do assunto. — Fui impulsivo.
— Foi idiota.
— Não tenho o que fazer, Luke está entrando com tudo nisso. Ontem eles dois saíram.
— É, eu vi ele chamando a Eleanor. — Kurt comentou, parecendo preocupado. — Só... não force a barra. Ele está forçando pra caralho.
— Imaginei.
Mais alguns minutos e já estávamos na entrada do Bill's, mostrando nossas identidades. O bar já parecia cheio e já não tinha espaço nas mesas de sinuca, o que me fez olhar ao redor e procurar o que eu estava realmente interessado. Lá estava Eleanor, perfeitamente confiante como sempre. Trocamos olhares por um segundo e essa era minha deixa, ela queria conversar. Pensei que fosse me evitar e fiquei feliz por estar errado, aparentemente ela pensou mais no assunto e percebeu como foi orgulhosa. Kurt foi em direção ao pessoal e eu busquei uma cerveja antes de ir até Eleanor, que estava sozinha em um dos bancos próximos ao barman.
— Como foi com Luke ontem? — Arrisquei, decidindo ser invasivo.
— O que você quer, Leo? — Ela ignorou completamente minha pergunta, tomando mais um gole de sua cerveja.
— Não precisa me atacar. Só estava curioso. — Abri um breve sorriso de canto de boca, em tom provocativo.
— Sinceramente, hoje têm sido um bom dia e não quero que estrague isso. — Ela finalmente me encara. — Se for me fazer passar raiva como da última vez, pode se retirar. Você foi completamente invasivo.
— Pode me chamar de invasivo, mas não de mentiroso. — Arqueio as sobrancelhas. Eleanor parecia refletir. — Sabe que fui sincero. O que queria que eu fizesse?
— Que tivesse uma conversa comum? Que soubesse flertar e não me acusar de coisas que não tem sentido?
— Então queria que eu flertasse? — Sorri em aprovação, bebendo mais um pouco da cerveja. Eleanor parecia sem reação.
— Não. Não foi isso que quis dizer! — Gaguejou, evitando qualquer contato visual.
— Certo, Eleanor. Vamos fazer o seguinte, então... — Desvio o olhar, me certificando de que Luke não estava próximo o suficiente para ser uma ameaça. Tudo parecia bem. Volto a olhar nos olhos de Eleanor e ela presta atenção. — Vamos recomeçar. Eu paro de te "julgar", e você para de achar que sou invasivo e me tratar assim. Vou simplesmente ser o cara normal que flerta e que te agrada e você vai ser a garota confiante e durona que finge ser.
Ela revira os olhos e desvia sua atenção. Claramente ela estava pensando na proposta, o que me fez ficar convencido de que poderia dar certo.
— A gente se apresenta e finge que nada daquilo aconteceu. — Concluo.
— E o que eu ganho com isso?
— Eu paro de encher seu saco e te trato da forma "correta". Em troca, você deixa as coisas entre nós acontecerem naturalmente.
Eleanor parece pensar. Seu olhar parece distante o suficiente pra ela considerar outras coisas durante sua reflexão. Não fiquei totalmente satisfeito com a proposta que fiz, mas era a única forma de impedir que Luke conseguisse o que queria, e me aproximar de Eleanor. A única coisa que eu iria insistir é em tirar essa máscara dela que me incomodava tanto.
— Certo. — E seus olhos voltam aos meus. — Tudo pra você parar de me tratar assim.
— Ótimo. — Sorrio, satisfeito. — Sou Leonardo DiCaprio, muito prazer.
— Prazer, Leonardo. — Ela aperta minha mão, se apresentando. — Eleanor Crawford.
Crawford? Mas que merda é essa?
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Underground (1992)
Fanfic"Underground" tem o cenário marcante dos anos 90' na Califórnia, e conta a história de Eleanor, que em seus 18 anos aproveita seus últimos dias de aula do ensino médio e arrisca ir para a faculdade. Mas diferente de qualquer garota na sua idade, ela...