Prólogo

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    O chão da estação de ônibus de San Diego era quase todo de pontas de cigarro. Um milhão de anos atrás, o prédio provavelmente era chique, como a Grand Central ou aqueles lugares enormes que você vê nos filmes. Mas agora tudo parecia cinza, como um depósito cheio de panfletos de bandas amassados e homens bêbados.

Era quase meia-noite, mas o saguão estava lotado. Ao meu lado, uma parede de armários descia até o fim. Um dos armários estava vazando um pouco, como se algo tivesse derramado e estivesse pingando no chão. Estava grudando nos meus sapatos.

Havia máquinas de venda automática do outro lado do saguão e um bar no canto, onde um bando de homens grandes e barbudos fumegavam em cinzeiros, curvados sobre suas cervejas como duendes. A fumaça fez o ar parecer nebuloso e estranho.

Eu me apressei, perto dos armários, mantendo meu queixo abaixado e tentando não parecer óbvio. De volta à minha casa, quando eu imaginei essa cena, eu tinha certeza que seria capaz de me misturar na multidão, sem problemas. Mas agora que eu estava aqui, era mais difícil do que eu imaginava. Eu estava contando com o caos e o tamanho para me cobrir. Afinal, era uma rodoviária. Não imaginei que seria a única aqui que ainda era muito jovem para dirigir.

Na minha rua ou na escola, era fácil ignorar – doze anos e altura média, forma, rosto e roupas medianas. Tudo normal, exceto meu cabelo, que era comprido e vermelho e a coisa mais brilhante sobre mim. Eu o prendi em um rabo de cavalo e tentei andar como se soubesse para onde estava indo. Eu deveria ter trazido um chapéu.

Nos guichês, duas garotas mais velhas com sombra verde e minissaias de borracha discutiam com o cara atrás do vidro. Seu cabelo estava tão bagunçado que parecia algodão doce.

— Vamos lá, cara. — disse uma delas. Ela balançava a bolsa de cabeça para baixo no parapeito da janela, contando as moedas. — Você não pode me dar um tempo? Não falta quase nada. Apenas um dólar e cinquenta.

O cara parecia sarcástico e entediado em sua camisa havaiana surrada.

    — Isso parece uma instituição de caridade? Sem dinheiro, sem passagem.

Enfiei a mão no bolso da minha jaqueta de frio e corri os dedos sobre o meu próprio bilhete. Economia de San Diego a LA. Eu paguei com uma nota de vinte da caixa de joias da minha mãe e o cara mal olhou para mim.

Andei mais rápido, grudando na parede com o skate debaixo do braço. Por um segundo, pensei em como seria foda colocá-lo no chão e disparar entre os bancos. Mas eu não fiz. Um movimento errado e até mesmo um bando de guardas noturnos idiotas notariam que eu não deveria estar aqui.

Eu estava quase no final do saguão quando uma onda de nervosismo passou pela multidão atrás de mim. Eu me virei. Dois caras em uniformes bronzeados estavam de pé perto das máquinas de venda automática, olhando para o mar de rostos. Mesmo do outro lado da estação, eu podia ver o brilho dos seus distintivos. Policiais.

O mais alto tinha olhos claros e rápidos, braços longos e magros como os de uma aranha. Ele estava andando para cima e para baixo entre os bancos da maneira que os policiais sempre fazem. É uma caminhada lenta e oficial que diz posso ser uma vagem assustadora, mas sou aquele com o distintivo e a arma. Isso me lembrou do meu padrasto.

    Se conseguisse chegar chegar ao final do saguão, poderia escapar e até a garagem onde os ônibus pararam. Eu deslizaria no meio da multidão e desapareceria.

    Os caras nojentos no bar se curvaram sobre suas cervejas. Um deles apagou o cigarro, deu aos policiais um olhar longo e desagradável, e cuspiu no chão entre seus pés. As garotas na bilheteria pararam de discutir com o caixa. Elas estavam parecendo realmente interessadas em suas unhas, mas pareciam bastante nervosas com o Oficial String Bean. Talvez elas tivessem o mesmo tipo de padrasto que eu.

    Os policiais caminharam até o meio do saguão e olhavam ao redor da estação de ônibus como se estivessem procurando por algo. Uma criança perdida, talvez. Um bando de delinquentes que não prestam.

    Ou um fugitivo.

    Abaixei minha cabeça e me preparei para me misturar. Eu estava prestes a sair para o terminal quando alguém pigarreou e uma mão grande e pesada se fechou em volta do meu braço. Eu me virei e olhei para o rosto ameaçador de um terceiro policial.

    Ele deu um sorriso entediado e plano, cheio de dentes.

    — Maxine Mayfield? Vou precisar que venha comigo. — Seu rosto estava duro e áspero, e parecia que ele disse a mesma coisa para crianças diferentes cerca de cem vezes. — Você tem gente em casa muito preocupada com você.

Stranger Things: Runaway MaxOnde histórias criam vida. Descubra agora