Chovia como um anúncio do fim do mundo e a parelha de fortes cavalos arrastava com dificuldade a pequena carruagem pela estrada enlameada.
Açoitado pela chuva, consegui no ver a estrada somente a cada vez que o clarão de um relâmpago espoucava como um flash, iluminado o negror absoluto da noite, o cocheiro gritava com os cavalos, tentando controlá-los e fazendo estalar as rédeas em suas ancas.
No interior da carruagem, Kin Jihoon, o famoso doutor Kin, não conseguia manter-se seco, pois as pequenas cortinas, encharcadas, eram batidas pelo vento para dentro da cabine, como se quisessem esbofeteá-lo.
Ele sabia ser uma loucura parar à beira da estrada para esperar o fim da tempestade. Era preciso que os cavalos conseguissem levar a carruagem até a pequena estalagem, algumas léguas adiante.
Na estalagem, ele é o cocheiro poderiam secar-se e tomar um caldo quente. Dormiram até a manhã seguinte e o médico sabia que sua esposa não haveria de preucupar-se. Era normal, em sua profissão, impor períodos de solidão à família.
Voltava de um parto complicado que lhe dera trabalho até a madrugada, e estaria satisfeito com o pequenino verão que ajudará a vir ao mundo se aquela tempestade não tivesse desabado com tanta fúria.
Pensou na exaustão daquela noite. O bebê estava virado dentro do útero e ele pode sentir que o cordão umbilical estrangulava-lhe um dos bracinhos. Não teria condições, naquela casa de fazenda distante, de fazer a operação dos césares. Se ele tentasse cortar o ventre da mãe para livrar o filho, talvez salvasse o bebê, mas a mãe morreria, na certa.
Lembrou-se do rosto pálido da mulher, gemendo de dor e esbugalhando os olhos para ele, suplicando por duas vidas.
Ele conseguirá, com as mãos, virar o bebê e desembaraçar o cordão umbilical. Em seguida, o nascimento ocorreu normalmente, operando o milagre que são todos os nascimentos. Um milagre que nunca deixava de fasciná-lo.
Se o tempo não tivesse tão desastroso, ele na certa voltaria dormitando no ritmo do sacilejar da carruagem e sorrindo feliz com mais aquele sucesso na profissão que escolhera.
Ele gostava de sua profissão. Sabia que nascera para aquilo. Para lidar com a dor, para desafiar a morte.
"A morte...", pensava ele. "A morte deve andar aborrecida comigo. Ela sempre acaba vencendo, mas muitas vezes eu consigo adiar a hora marcada... Só que eu ainda sei tão pouco, tão pouco...".
De repente, um tranco afastou-o de seus pensamentos.
O cocheiro gritava com os cavalos e puxava as rédeas com força.
Sentindo a dor dos cabrestos a apertarem-se contra suas bocas, os cavalos estacaram bruscamente, empinando e fazendo fazendo a carruagem rabear na lama.
O doutor Kin debruçou-se na janela, recebendo a chuva em meio ao corpo como se estivesse em um chuveiro. Sua cartola voou, arrancada por um tapa violento do vento.
O clarão de um raio, mais forte do que todos, iluminou de branco-azulado toda a estrada à frente, revelando rochas nuas que se alegavam à esquerda da estrada e, à direita, despencaram para baixo, a pouco mais de meio metro de onde se debruçava o médico.
Mas, à frente da carruagem, ocupando o centro do clarão, como a principal figura de um quadro, dava para perceber um vulto.
Do vulto, parecia vir um grito, desesperado.
De braços estendidos para a frente, o vulto parecia querer deter a carruagem, bloqueando a estrada com seu corpinho frágil.
- Uma criança! É uma criança! - gritou o doutor Kin, descendo apressado.
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Descanse em paz, meu amor...
Horror"Há muita coisa que a gente não consegue explicar. Algumas, como a deste livro, nos deixam gelados de pavor. Mas o principal assunto desta história é a amizade, aquilo que a gente não precisa explicar. ...