Entretanto no mundo dos deuses Yehudi apercebeu-se do roubo do instrumento e ficou preocupado. Procurou imediatamente o pai.
- Há muito que devia ter mandado para longe esse rebelde! – queixou-se o deus-do-céu. – Só nos arranja problemas!
- Como é possível agora desfazer o encantamento da Alma? – indagou Yehudi pensativo, andando de um lado para o outro – Talvez deva procurar o meu velho mestre.
Assim pensando, Yehudi montou no Cavalo-Incansável e procurou o sábio das terras das Grandes-Montanhas.
- Não me surpreende o que me contas, Yehudi. Temos de agir rapidamente. – disse o velho sábio – senão a princesa começa a perder toda a memória até esquecer-se completamente de si-mesma. É trágico, muito trágico! Eu bem te disse para guardares muito bem esse instrumento!
Agitado, o velho mestre pôs-se a andar de um lado para o outro com a mão no queixo, pensando, pensando...
- O que posso fazer? – perguntou o jovem deus.
- É preciso ir ao lago de Todos-os-Espelhos.
- E onde fica isso?
- Muito longe, muito longe... é para lá do Grande-Deserto. O lago de Todos-os-Espelhos contém as imagens e memórias de todos os seres. Não é qualquer um que consegue aproximar-se. Precisamos de retirar o espelho que guarda a imagem da princesa Alma e levá-lo até ela...
- Então é isso que farei! – respondeu prontamente o jovem deus.
- Não é fácil... ainda são sete dias de viagem ou mais. É preciso apressares-te!
Yehudi tomou as palavras do velho sábio como uma ordem e saltou de imediato para cima do cavalo.
- Ah, espera! Um aviso muito importante! – disse o sábio agitadamente – cuidado com o Grande-Deserto onde não há sentido nem direção! Não serás tu a conduzir o cavalo, mas será ele a conduzir-te. E, sobretudo, não o forces. Quando ele quiser parar, deixa-o parar. Quando ele quiser andar para trás, não o contraries. Confia no cavalo-Incansável. Ele levar-te-á ao teu destino. Agora vai e apressa-te! E não te esqueças do arco e flecha.
- Ah, espera, espera! Mais uma coisa importante que só agora me lembrei! Vais ter de enfrentar o guardião do lago de Todos-os-Espelhos. Nada de especial, apenas uma miragem, um monstro disforme que se move em todas as direções... Não o queiras combater, senão aí é que o caso é 'sério'...
- Como é que... é 'sério'...?? – interrogou apreensivo Yehudi já montado no cavalo.
- Pois se acreditares que o monstro existe, então ele existirá mesmo. E tu não terás a nenhuma sorte, mesmo sendo um deus... por isso é melhor não acreditares em nada do que vires no lago de Todos-os-Espelhos. – esclareceu o velho mestre.
- Tenho a impressão que ainda não me contaste tudo... mais alguma coisa que eu deva saber...? – perguntou Yehudi.
- Sim, por acaso há. Também só agora é que me lembrei. Mas, caramba, é tanta coisa... não consigo lembrar-me de tudo, afinal eu já estou velho!
- Calma, calma...não há tempo para lamentações. Mais alguma coisa que eu deva saber?
- Ah sim, sim... é uma coisa complicada! O regresso não pode ser pelo mesmo caminho...
- E porquê?
- Porque esse caminho deixará de existir, - respondeu o velho sábio em tom sério. – Por isso, não procures encontrar o que antes era. Eu sei que isto é complicado de perceber, mas é assim que as coisas são.
