Proposta tentadora

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2021

— Você perdeu, Bright.

Existia alguma coisa no mundo mais monótona do que jogo online? Era tão... sem graça, ficar de frente para um computador, apertando o teclado sem parar. Eu vivia me perguntando como Aof gostava daquilo. Como o bom amigo que eu era, deixava que ele falasse sobre a tecnologia e sobre tudo o que sabia para mim. Permiti que me mostrasse algum jogo online, e depois, percebi que, definitivamente, acabou entrando para a minha lista mental de que foi uma das piores coisas que eu já decidi nesses vinte e três anos de vida. Era inútil.

— Não entendo como você acha graça nisso. Você é alguém que gosta e entende de tecnologia. Deveria fazer algo grande, não?

— Um dia, quem sabe.

Minutos depois, mamãe apareceu no meu quarto com uma bandeja nas mãos e um sorriso no rosto. Sempre que eu levava Aof para a minha casa, mamãe fazia questão de levar todo tipo de comida para experimentarmos, porque ela era dona de um restaurante, e sempre tentava criar receitas, usando o próprio filho e Aof de cobaia.

Eu gostava da minha vida do jeito que era. Eu era um adolescente com notas boas na faculdade, não tinha uma gangue me perseguindo por eu ser um nerd, e tinha um melhor amigo, — mesmo que ele fosse o único, valia por mil. Eu era um garoto com planos e sonhos, sempre vivendo um dia de cada vez, torcendo para que eu conseguisse tudo o que eu desejasse no futuro, independente dos medos que andavam ao meu lado.

2023

Eu estava prestes a ter a minha primeira entrevista de emprego. Era um estágio em um escritório de advocacia e eu não poderia estar mais nervoso. Apesar do ar-condicionado trabalhando na sala de espera, as minhas mãos suavam, o coração palpitava e a crise de ansiedade dava um sinal de que estava ali. Como todos os meus outros medos, eu ignorava.

Na sala de espera, Aof tentava me convencer de que tudo daria certo através de mensagens pelo celular. As mensagens não estavam ajudando. Eu ficava mais nervoso a cada segundo.

[quinta-feira, 15:46] Aof:

relaxa. vai dar tudo certo

é um estágio. não é como se você fosse pedir para trabalhar na casa do presidente

[quinta-feira, 15:46] Você:

não é você que está prestes a ser entrevistado

e a sua vida já está feita. no auge dos trinta, você já trabalha em uma empresa que é considerada umas das mais bem-sucedidas do país

isso me faz lembrar que eu não sei nada sobre o seu trabalho

[quinta-feira, 15:50] Aof:

no futuro, se der certo o que eu estou planejando, eu conto

eu tenho que ir. boa sorte, hein?

Aof não era muito de me esconder as coisas. Éramos amigos desde o ensino médio. Ele era o meu melhor amigo, eu era o melhor amigo dele, e não tínhamos segredos. Ele sabia que eu queria ser advogado criminalista, e eu sabia que ele tinha um sonho em criar robôs. Porém, enquanto crescíamos, Aof... mudou. Se afastou. Talvez fosse a vida adulta, mas, chegar ao ponto de não me falar o que ele fazia em relação à vida profissional dele, era... estranho.

— Sr. Bright?

Com vinte e cinco anos, eu ainda morava com os meus pais, e não enxergava nenhum problema naquilo. Obviamente, eu tinha muita vontade em ter um lugar apenas meu, e ser independente era algo que eu queria mais do que tudo, e eu estava no caminho para aquilo, agora com um emprego. Só que... morar sozinho? Era complicado. Viver sozinho me amedrontava.

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