Com Artur de volta à vila, eles viam-se todos os dias, pois todos os dias ambos saíam à noite, e com as mesmas pessoas, pois tinham imensos amigos em comum. Com as saídas foram-se tornando amigos, e Anabelle percebeu que afinal talvez Artur não fosse só aparências, e talvez fosse mais do que um idiota convencido, egocêntrico e mais ou menos drogado. Ficaram mesmo bastante amigos, trocaram números de telemóvel, e começaram a falar por mensagens durante quase todo o tempo em que não estavam juntos. Ela não se apercebia, ou pelo menos não era um detalhe a que ela tomasse atenção, mas muitas das vezes era ele a começar a conversa. Então houve um dia em que ele e André foram pô-la a casa, depois de irem pôr a Sílvia. Ela despediu-se de André com dois beijos na cara, como sempre, e aproximou-se de Artur para fazer o mesmo. O que se passou a seguir foram segundos, mas para Anabelle pareceram horas; Artur fez um ligeiro sorriso, inclinou-se para frente, pôs a mão no ombro esquerdo dela, rodou a cara para a direita, e fingiu que lhe ia dar um beijo na cara, quando de repente virou a cara na direção oposta e lhe deu um beijo na boca; Anabelle ia tendo um ataque, pois estava à espera de tudo menos daquilo. Foi apenas um toque de lábios, que deve ter durado um segundo. Para o cérebro de Anabelle, foi um completo choque; para o estômago, borboletas a voarem por todos os lados, e nas pernas, ficou sem força. Quando os lábios se afastaram, ela tinha os olhos esbugalhados de surpresa. Ele fez aquele sorriso tão característico dele, olhou para o chão, virou costas e começou a descer a rua, e disse baixinho: - estava a brincar! - Anabelle não percebeu o que é que ele tinha querido dizer com aquilo, mas pronto. André também tinha ficado surpreendido, pois estava de boca aberta, no mesmo sítio, a olhar para a figura dele a descer a rua. André acabou por segui-lo, e gritou para Anabelle, que continuava imóvel à porta da sua casa: - FOI O PRIMEIRO DE MUITOS! - e depois riu-se. Anabelle fez-lhe o dedo da asneira, como quem diz "vai-te lixar", sem conseguir tirar o sorriso estúpido que tinha na cara, e sem conseguir deixar de rezar para que André tivesse razão. A tremer, enfiou a chave na porta, entrou em casa, encostou-se a uma parede, sempre a sorrir, e deixou-se escorregar até ficar sentada no chão. O coração dela estava acelerado como nunca, e foi aí que se apercebeu que estava apaixonada por ele.