A bala, veloz como uma sentença predestinada, cortou o ar noturno em direção à testa de um dos guardas que escoltava o homem de olhos cor de mel. O disparo reverberou como um prenúncio sombrio, uma sinfonia mortífera que ecoou pelos jardins da mansão, lançando uma onda de tensão sobre todos os presentes. O impacto fatal deixou-os em alerta, suas respirações suspensas diante da súbita intrusão que desferiu um golpe certeiro na guarda real.
Contudo, para Mescla, a assassina destemida de olhos penetrantes, aquele tiro não passava de uma estrofe no poema caótico que habilmente tecia. Sem dar trégua, ela prosseguiu disparando em diferentes direções, uma dança macabra que negou qualquer chance de reação. Os corpos tombavam, vítimas de tiros letais, em uma coreografia implacável.
"Vossa Majestade deveria zelar com mais afinco por seus homens. Seria trágico se algum deles revelasse traição", pronunciou Mescla, sua voz ecoando como um sussurro ameaçador. "Com sua permissão, Majestade, retirarei os corpos do jardim..."
Uma repreensão indignada de um soldado ressoou pelo ambiente tenso. "Quem é você para falar assim diante da realeza? Mostre mais respeito!"
"Lamento minha insolência, Majestade, mas meu dever é proteger todos vocês. Não poderia permitir traição pelas mãos daqueles que deveriam jurar lealdade..." Mescla ajoelhou-se diante dos príncipes. "Se desejarem, podem me punir por salvar suas vidas..."
Intervindo com sagacidade, um homem de bela aparência, sereno e perspicaz, estendeu a mão para Mescla. "Por que punir esta bela donzela por nos salvar? Por favor, nos diga seu nome, bela dama."
"Meu nome é Mescla, Vossa Majestade, sou responsável pela segurança de todos na mansão."
O príncipe herdeiro, cujos olhos cor de mel ardiam como brasas, indagou: "A qual clã você pertence?"
"Não pertenço a nenhum clã, Alteza, o Lorde Damiano me resgatou da miséria e me deu uma razão para viver, desde então, o sirvo com minha vida..." Mescla sorriu, mas seus olhos não compartilharam da mesma ternura.
"Entendo, está dispensada", afirmou o príncipe herdeiro. "Apesar de que esses corpos acabaram aprimorando a decoração..."
Mescla continuou seu caminho, ciente dos olhares atentos que a seguiam. Uma inquietação pairava no ar, alimentada pelo comportamento peculiar do segundo príncipe. Mesmo assim, ela seguiu em frente. Algo dentro dela desconfiava do segundo príncipe...
"Há um sobrevivente. Traga-o até mim", ordenou Mescla, seu olhar penetrando a escuridão noturna que se fechava sobre o cenário sombrio que se desenrolava diante deles. A resposta, emergindo da escuridão, sussurrou promessas de revelações que estavam prestes a desvendar-se.
"Como desejar, minha senhora!" Com estas palavras, uma sombra emergiu das profundezas da escuridão, deslizando em direção a ela.
"Tem certeza de que deseja mais um? Isso poderia atrair a atenção daquele verme."
"Éracle, já lhe disse para manter boas maneiras. Não somos mercenários de beira de estrada. Somos civilizados. Não é assim que agimos. E em relação ao suposto 'verme' ao qual você se refere, ele não passa de um animal peçonhento. Vou lidar com ele no futuro...", declarou Mescla, exibindo um raro sorriso genuíno.
"Desculpe, minha senhora! Farei conforme me foi ordenado." O jovem de cabelos negros, pele bronzeada e olhos acinzentados emergiu das sombras com um leve sorriso. "Aliás, você está deslumbrante, Destiny."
"Tenho que ir. E quando eu voltar, quero tudo impecável!" disse Mescla. "Não chame a atenção de ninguém... Você estava certo sobre os príncipes. A estadia deles será um incômodo. Quero uma sombra acompanhando cada um deles, especialmente o terceiro, tenho um pressentimento sobre ele."
"Que assim seja, Lady Destiny", respondeu ele antes de se dissolver na escuridão.
Após dar suas ordens, Mescla finalmente chegou ao salão de festas, dirigindo-se ao lorde para informá-lo sobre o ocorrido. No entanto, antes que tivesse a chance de falar, seu rosto foi atingido por um tapa excepcionalmente forte, fazendo-a tombar no chão. O som ressoou tão alto que metade do salão o ouviu, interrompendo a música.
"Estou muito decepcionado com você, Mescla. Não foi para isso que lhe confiei essa responsabilidade", disse ele com um tom falso de descontentamento em sua voz. "Como pode permitir que assassinos entrem na mansão e ainda atentem contra a vida de nossos amados príncipes?"
"Sinto muit..." Mescla foi interrompida novamente por Damiano.
"Oh, como fui tolo ao pensar que você, Mescla, conseguiria realizar uma tarefa tão simples. Afinal, eu a adotei quando você não passava de uma criança desamparada, cuidei de você, providenciei comida e um teto quando a miserável sorte a abandonou. E agora, esse é o pagamento que recebo? Uma falha tão monumental!" O lorde proferiu suas palavras com uma mistura de pesar e sarcasmo, cada sílaba carregada de desilusão.
"É uma verdadeira agonia para mim, Mescla. O ato de ter que dizer isso é quase insuportável, mas desta vez, não posso fechar os olhos para esse erro tão... insignificante, se é que posso usar essa palavra. Como você ousa cometer um deslize tão grave sob minha confiança? Estou começando a achar que minhas expectativas são simplesmente demais para alguém da sua... habilidade." O sarcasmo nas palavras do lorde era evidente, como se estivesse questionando a própria lógica de confiar em alguém como Mescla.
"E agora, como um gesto magnânimo de minha parte, vou conceder a você a tarefa mais apropriada para sua destreza atual. Limpe o sangue que, de forma tão inconveniente, você derramou no meu salão. Afinal, não podemos deixar que as manchas atrapalhem a imaculada atmosfera deste lugar. E depois, talvez, pensemos em seu destino. Quem sabe se minha generosidade não se estenderá até lá?" O lorde encerrou suas palavras com um sorriso de desdém, como se estivesse prestes a decidir o destino de um mero inseto que cruzou seu caminho.
"As ordens são suas, meu senhor..." Mescla murmurou com uma voz contida, seus olhos refletindo a resignação diante da avalanche de desgosto que a envolvia. Com gestos medidos, como se cada movimento fosse um fardo a mais sobre seus ombros já sobrecarregados, ela retirou um lenço do próprio vestido.
Antes que pudesse começar a lidar com a mancha de culpa que manchava o salão, no entanto, uma nova interrupção se fez presente. O momento de humilhação e tarefa imposta parecia se estender, prolongando a agonia de Mescla. O destino parecia brincar com ela, empurrando-a ainda mais fundo na teia do drama que se desenrolava.
" Com a língua, Mescla!" Ele pronunciou essas palavras com um sorriso de satisfação cruel estampado em seu rosto.
"Não acha que está exagerando, Lorde Damiano Signatus?", questionou o segundo príncipe com uma expressão ponderada. "Afinal, foi a senhorita Mescla quem salvou nossas vidas."
"Meu caro príncipe Diego, Mescla precisa ser punida por falhar. É assim que meus súditos são disciplinados", respondeu Damiano com firmeza, defendendo sua posição.
"Meu senhor... " Uma voz calma, pertencente a Mescla, interrompeu a discussão entre o lorde e o príncipe Diego, desviando a atenção de ambos. "Eu já fiz o que me ordenou", disse ela, seus lábios visivelmente avermelhados pela repreensão anterior.
"Eu vejo... " disse Damiano com ódio em sua voz, frustrado por não ter testemunhado a humilhação que esperava para sua "cadelinha". "Retire-se, Mescla. Ainda há trabalho a ser feito!"
Mescla deixou o salão tão rapidamente quanto entrou, mas desta vez não percebeu o olhar do príncipe herdeiro a seguir. O ambiente carregava a tensão das decisões tomadas, enquanto o lorde e os príncipes enfrentavam as complexidades de suas relações, e Mescla, a sombra que dançava nas bordas do caos, desapareceu na penumbra, pronta para os desafios que ainda estavam por vir.
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Raposa Negra
DiversosEm um mundo onde os poderosos reinam , uma raposa nasce entre lobos , repudiada por uma parte de seus parentes e forçada a fazer escolhas difíceis muito nova , mudaram seu modo de ver o mundo . Ela não sabe o que lhe aguarda com chegada repentina d...