A ideia do almoço foi a pior possível.
Como ela poderia almoçar com ele se seu estômago não parava de dar voltas?
Eda queria saber tudo, ao mesmo tempo que a ideia de saber a aterrorizava. Sua mente já criava os piores cenários possíveis antes mesmo de ter escutado uma palavra que fosse. As linhas das cartas escritas por Serkan diziam a ela uma coisa, mas o mundo dizia outra.
Ela ajeitou o cabelo, retocou o gloss e respirou fundo. Não havia outra forma de saber a verdade a não ser enfrentando-a.
Se Eda estava pronta? De forma alguma.
Mas ela jamais deixaria de ouvir seu coração. Então ela guardou o que precisava na bolsa, respirou fundo mais uma vez e saiu, para encontrar Serkan e o futuro que os aguardava.-xx-
Serkan estava completamente impaciente andando de um lado para o outro na frente do pequeno bistrô. Ele sabia que não adiantava ficar aflito daquele jeito. Ela iria aparecer, eles esclareceriam tudo e se acertariam.
Ia dar tudo certo.
Tinha que dar.
Ele não conseguiria lidar com nada que não fosse aquilo. Como seria sequer possível viver sem seu coração? Não era vida.
Ele estava disposto a contar tudo. Não deixaria que nenhuma mentira ou omissão ficasse no caminho de ambos. Serkan estava pronto para recomeçar com Eda ao seu lado, e nada além disso importava.
Óbvio que ele estava com medo. Ele tinha medo de perdê-la. Medo que a verdade os afastasse. Medo de que ela decidisse que o tempo deles havia passado.
Então ele engoliu o medo e olhou para o relógio mais uma vez. Tentando se acalmar, Serkan esfregou a testa e apertou a ponte do nariz. Quando abriu os olhos novamente, seu coração voltou a bater da forma que ele mais gostava: descompassado, desabalado, completamente fora do controle.
Eda se aproximava, olhos baixos e as duas mãos segurando a bolsa. Quando os olhos dos dois se encontraram, um sorrisinho brotou no canto da boca da menina e tudo se iluminou na vida dele.
O medo ficaria para depois. Agora, Serkan iria lutar pelo amor de sua vida.-xx-
Eda bebeu mais um gole do seu chá enquanto assistia Serkan tirar as cascas do pão para ela, um hábito antigo desde quando ambos eram criancinhas. Algo tão natural que ela duvidava que ele sequer tinha noção de que não era automático.
- Então ela pegou o Ferit e o Ceren quase sem roupa? Mas eles nunca aprendem mesmo. - Serkan riu, seus olhos se estreitando no canto, o som aquecendo o coração de Eda.
- É, hoje eu consigo rir, mas foi extremamente constrangedor no dia. Ele é meu irmão, eu não quero saber o que eles fazem, sabe?
Eles riram e conversaram mais um pouco. Eda sabia que Serkan não estava por fora de tudo que acontecia, uma vez que apesar dos dois não se falarem, os amigos continuavam a conversar com ele. O almoço fluiu tranquilo, a sobremesa marcada por olhares e toques roubados mas mãos.
- Você quer andar um pouco? - Serkan perguntou, preparado para uma possível rejeição.
Eda sabia que era ali, naquele passeio, que a conversa relevante finalmente se daria. Catando todos os caquinhos de coragem, ela concordou. A tensão agora pairava no ar, ambos se preparando para o momento que a corda penderia para o bem ou para o mal.
Eles passearam ao longo da orla, o sol refletindo no Bosforo implacável e luminoso. Eda segurava a correntinha da bolsa com as duas mãos, tal como se fosse uma âncora, com medo de afundar em si mesma, enquanto Serkan revirava as mãos no bolso da calça, desesperado para estar mais perto dela.
- Então... - disse ele ao mesmo tempo que Eda falava "Serkan, eu...".
- Você primeiro - disse ele.
Eles se sentaram num banco de frente para o mar, suas pernas se encostando. Eda tomou um longo fôlego antes de começar a despejar tudo que conseguiu controlar ao longo do dia.
- Eu li a carta. Reli, na verdade. Ambas. E eu queria poder dizer que estou aqui pronta para retomar de onde paramos, começar do zero ou qualquer coisa do tipo... Mas eu sei, Serkan. Eu vi, eu sei dela. E eu não posso, não consigo viver com isso no fundo da minha mente, martelando, eu não posso... - a voz dela foi morrendo aos poucos conforme a dor no seu coração foi aumentando.
Era o pesadelo de Eda. Aquela foto queimava no mundo de sua mente, não importava quanto tempo passasse. Quem era ela? O que ela significava para ele? Aquelas perguntas sem resposta a consumiram dia após dia e ela não conseguia...
- O nome dela é Selin Atakay, ela é amiga de uns amigos e por acaso estava lá naquela noite. Era o dia do nosso aniversário de cinco anos, Eda. Deveríamos estar comemorando juntos, viajando ou com nossa família talvez? Eu jamais senti tanta dor, jamais senti tanto sua falta. Eu queria poder dizer que jamais fiz nada, mas não quero mentir para você... - ela se preparou para o pior quando ele se virou para confessar em voz baixa. - não que seja uma justificativa plausível, não é e nunca será. Mas eu bebi, tentei afogar toda aquela dor com copo atrás de copo e... Em um momento ela tava lá, e no outro nós nos beijamos. Mas não era você. Não tinha seu jeito, seu cheiro... Não era você, Eda. E doeu ainda mais porque não era.
Serkan olhou para suas mãos que tremiam. Era o silêncio antes da bomba explodir, quando o fogo percorria o pavio e a expectativa fazia o ar ao redor crepitar. Ele arriscou um olhar para Eda só para vê-la perdida em pensamentos, mordendo os lábios em completa concentração.
Ela realmente esperava que o exterior não mostrasse o caos que ocorria por dentro. Metade dela estava pronta para perdoa-lo enquanto a outra metade tentava assimilar o fato de que Serkan havia beijado outra pessoa enquanto ela havia se fechado para o mundo, pois jamais haveria ninguém além dele.
- Se você precisar de um tempo, eu entendo. Eu quero seu perdão, quero você em minha vida... Mas acima de tudo, eu quero te ver feliz. Eu preciso te ver feliz. Nada me importa além disso.
Incapaz de se manter afastado, ele a puxou para si. E ao mesmo tempo que se refaziam, que o mundo se reencaixava, o medo ameaçava derrubar aquelas frágeis peças que um novo começo tentava assentar.
Enquanto chorava baixo, deixando limpar toda mágoa de seu coração, Eda pesava os prós e os contras.
Sim, ela o amava. Com tudo que era. Com cada grama de seu ser. Ela havia esperado por aquele momento nos últimos anos, ela finalmente estava nos braços dele, com a promessa de todo amor que eles mereciam viver.
Sentindo o perfume dele, ela viu por trás das pálpebras fechadas todo o futuro que a aguardava: ela e Serkan se casando, eles em sua casa nova, uma menininha de maria chiquinhas correndo pela grama.
Era o que eles mereciam. O amor que nasceu ainda na infância com uma amizade bonita e virou o centro de tudo conforme eles cresciam.
O medo não ganharia, não dessa vez.
Secando os olhos na camisa dele, ela levantou a cabeça.
- Serkan?
- Efendi, hayatım?
- Você pode... Você pode me beijar?
E todo amor que ela viu nos olhos dele antes que seus lábios se encontrassem lhe deu a certeza que faltava: eles pertenciam um ao outros e estavam onde deveriam estar.
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Cardigan - Edser
Romansa"When you're young they assume you know nothing." 5 anos atrás, Serkan Bolat deixou sua vida, sua família e seu coração para trás quando a oportunidade de estudar arquitetura na Inglaterra lhe foi dada. Agora, ele está de volta, pronto para lutar po...