Na Boca do Inferno

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EXTRA

"Jesus chama, mas deseja que nós O escolhamos no coração de uma fé provada."

O diário há muito permanecia fechado. Os ignóbeis poemas descansavam no fundo do cerne indigno, como uma lembrança melindrosa difícil de esquecer.

Gregori Hoseok foi sucinto em sua homilia, sua última. O dia anterior havia sido estressante, principalmente quando expôs suas razões para deixar a igreja e sua vida de Padre. O diálogo com o bispo e arcebispo fora profuso e fatigante, e ver a decepção estampada nos rostos anciões o fizeram arrepender-se ainda mais de engendrar-se nesse meio apenas por um alguém.

Até onde ele iria em nome do amor? Sequer obteve sucesso em sua tentativa de felicidade.

O solado de seus sapatos preto reverberou pelo piso polido da igreja vistosa, estava vazia, com exceção de um. As madeixas castanhas beiravam a gola da batina, como se repousassem ali à espera de um carinho arrebatado, clamando pelo mínimo toque. Os dedos longos de Hoseok formigavam em anelo de acariciá-los, mas hesitou.

Taehyung estava de frente para o altar, sua voz aveludada glorificava o Senhor em um louvor, um cântico sussurrado que mais assemelhava-se a uma rogação de indulgência. A voz quebrava-se sempre que chegava ao refrão, como se a garganta fechasse em um nó espesso e árido, ele cantava graças, embora não soubesse se a si ou a Deus.

Fustigado, Hoseok sentou-se ao lado de Taehyung. O Padre não precisou olhar para ver quem havia chegado, o cheiro e a presença forte delataram-no. Tautócrono, ambos deram as mãos, entrelaçando os dedos. A sobriedade que pairava ao redor deles era uma ilusão em comparação aos seus corações que carpiam todo o suplício acumulado.

Os dedos longos de Taehyung resvalaram um carinho sobre os anéis prata da mão do outro, adorou em silêncio a forma como a destra de Gregori aconchegou-se repetindo o mesmo movimento. Pouco a pouco a cabeça do presbítero descansou sobre o ombro de outrem, seus olhos cor de mel fecharam-se para o Cristo pregado na cruz e sua boca rogou, pela sobrante vez, por Gregori.

Ergueram-se, ambos, caminhando para o eixo da igreja. Cada passo sendo observado pelas estatuetas douradas, os olhos santos julgando-os. Taehyung permaneceu a ignorar a sua heresia enquanto Gregori pouco se importava com isso, ele nunca foi verdadeiramente um santo nem tinha almejo de ser.

Pararam frente ao lavabo, lugar que primeiro abençoou sua profanação. O Padre não pode deixar de expressar um sorriso nostálgico, ganhando ainda mais cor quando os braços de Hoseok rodearam seu corpo, trazendo-o para colar em seu corpo.

Em um momento primordial eles apenas relembraram os acontecimentos, banhados de tranquilidade e saudades. Sequioso, Gregori grudou os lábios sobre o ombro vestido do mais velho, tracejando um caminho singular de beijos até o ouvido do clérigo. Seus dentes não o pouparam de um sofrimento, porque, afinal, ambos viviam em meio a dor há muito tempo.

— Hoseok... — um gemido lhe escapou, ciciado com tanto amor que machucou o imo.

Gregori deslizou as mãos pelo peito alheio, desfez os botões da batina e deixou que o tecido repousasse no chão. Defronte, acima do lavabo de mármore, um espelho emoldurado em madeira talhada, posto recentemente, refletia a imagem de Taehyung.

— Perfeito — mussitou o mais novo — Em imagem e semelhança.

Indubitavelmente, aquele sopro de voz rouca era louvado por Taehyung, pois cada pelo exposto pela ausência de roupa veio a arrepiar, formando uma camada de bolinhas sobre sua pele imaculada.

Celibato (EM REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora