O Problema

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três semanas atrás

O trabalho como fotógrafa não está sendo mais suficiente para pagar minhas contas. Suspiro irritada ao abrir a porta do apartamento e ver todos os envelopes e boletos no chão. Me abaixo os pegando e fecho a porta com o pé.

Abro a geladeira em busca de comida e vejo apenas uma maçã. Eu me esqueci, de novo, de ir ao mercado comprar as coisas básicas para a semana. Solto um gemido alto de frustração ao me jogar no sofá e jogar os papéis não tão urgentes sob a mesinha.

A porta se abre novamente, ao mesmo tempo que a maçã escapa da minha mão e eu me sento no sofá, boquiaberta, encarando a carta em minhas mãos.

- EHEEEEEEE! - ouço o grito de Lisa, vindo da porta recém aberta, mas nem isso seria capaz de me incomodar. - Tem comida caindo da sua boca, aliás, eu estou com tanta fome, o que você comprou pra gente comer hoje? - sinto o sofá se afundar ao meu lado e Lisa puxa o papel da minha mão. - Jichu! - ela dá um tapa na minha testa.

- Leia - minha voz sai em apenas um sussurro, quase inaudível.

- Departamento de Imigração da Nova Zelândia - ela diz em um tom confuso - Devido aos recentes casos de fraudes, vamos investigar, detalhadamente, cada pedido de cidadania para nosso país. Ao receber esse aviso, a investigação já pode ter sido iniciada ou não. Entraremos em contato quando for o momento certo.

Eu saí de Seul porque não suportava mais aquela cultura machista e tão fechada, onde pensam que a mulher deve ser certinha e obedecer a todos os homens, que ela deve ser submissa e recatada.

Eu amo meu país e tenho orgulho de ser coreana, nascida e criada, mas quando comecei a entender e ver a diferença no tratamento entre homens e mulheres, uma revolta enorme começou a tomar conta de mim e eu não conseguia mais viver na Coreia.

Então vim para a Nova Zelândia, por sorte, eu já conhecia Chaengie, o pai dela a mandou para estudar em Seul e nos tornamos melhores amigas. Nunca perdemos contato e eu sempre tive um carinho enorme por ela.

Já na faculdade, eu conheci Lisa e nos tornamos inseparáveis desde então. É quase uma promoção de compre 1 e leve 2.

Isso ficou bem claro em poucos meses depois de nos formarmos, eu avisei a ela que tentaria a sorte em um país novo e ela apenas disse: Quando embarcamos?

Por um momento, achei que ela estava apenas brincando e levei na brincadeira, mas dias depois, ela quase derrubou a porta do meu quarto, invadindo o espaço e me jogando papéis de anúncios de apartamentos na Nova Zelândia. Eu cheguei a me engasgar com o leite que estava tomando e ela teve que dar alguns tapinhas em minhas costas até que eu voltasse ao normal.

Quase um mês depois, desembarcamos nesse novo país, cheio de possibilidades e, o melhor de tudo, um país livre e aberto. Até o ar aqui parecia mais puro, pelo menos até agora, quando me dou conta de que podem me deportar para Seul e me proibirem de pisar aqui novamente.

Lisa não precisa se preocupar com isso, por algum motivo, ela nasceu com a bunda virada para a lua e rapidamente eles concederam seu visto definitivo, enquanto o meu ficou parado por meses e meses. Eu ainda havia brincado com ela e dito que se até a metade do ano, eles não tivessem me dado o visto, eu obrigaria Lisa a se casar comigo e tudo estaria resolvido, nós rimos e zoamos por meses até que eu me esqueci de tudo isso.

Logo agora que eu havia conseguido um emprego mais estável como fotógrafa e havia conseguido um trabalho extra, como assistente de uma professora de fotografia na universidade.

Pelo menos uma ou duas vezes por semana, ela me chama para ajudar na revelação e tratamento das imagens. Quando o fim de cada semestre se aproxima, ela me chama com mais frequência e eu acabo tirando uma grana realmente boa de tudo isso.

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