Sobre o conceito de amor e suas nuances

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Na Tarde da Reconciliação, assistiram a "Frozen" pela primeira vez. Akaashi achou que o mais velho previu o tema que atormentaria os pensamentos que teria durante aquela semana.

Como dito anteriormente, Keiji tinha um conceito formado do que era o amor. Ele surgiu depois de muito tempo fazendo o que sabe fazer de melhor (e pior): pensar, refletir e analizar.

O levantador pode não ter tido acesso a desenhos animados quando criança, mas teve outra coisa em abundância em suas mãos durante a fase citada: livros.

Júlio Verne, Monteiro Lobato, entre outros vários nomes fizeram sua infância. Sempre receoso de atrapalhar seus entes queridos, absteve-se de contar sobre seus problemas e lidou com eles de acordo com as atitudes dos personagens em seus livros.

"Quebrou a cara" várias vezes, claro, mas funcionava.

Durante sua pré-adolescência, acompanhou de perto as meninas (em geral) fantasiarem com príncipes encantados que seriam o amor de suas vidas.

(As poucas ex-colegas que viu recentemente namoravam princesas encantadas. Não sabia se ria da situação ou simplesmente parabenizava as sortudas.)

Keiji percebeu logo de cara que o casamento de seus pais não era como suas colegas diziam que deveria ser. E que o amor deles era diferente, também.

Decidiu averiguar por si mesmo o que era o amor da mesma forma que lidava com seus problemas: leria livros.

Vários. Livros. Mesmo.

Leu séries românticas (como "A Seleção"). Releu seus livros favoritos, prestando atenção em todo e qualquer casal que aparecia. Leu livros românticos dos mais diversos (chorou muito ao terminar "A Culpa é das Estrelas"). Arriscou até novos livros de fantasia e/ ou distopia (sendo Percy Jackson e Jogos Vorazes seus favoritos de cada respectivo gênero).

Em realidade, foi nessa época em que descobriu que possivelmente era LGBTQ+.

"Vermelho, Branco e Sangue Azul" e "Aristóteles e Dante Descobrem o Universo" abriram seus olhos e coração para perceber sua atração por pessoas do mesmo gênero que o seu. Anos mais tarde, "De Todos os Motivos" tornou-se seu favorito – pois lembrava a si mesmo e a Bokuto.

Analisou friamente a tudo que reuniu, chegando a conclusões concretas – ou o mais próximo de "concreto" possível.

     Amor é muito esforço, pois você precisa (muitas vezes) ceder a coisas que quer fazer pelo bem de outra pessoa. Precisa perdoar várias e várias vezes. Precisa manter a calma e estar lá quando a pessoa precisar

Amor é convivência, e não necessariamente do tipo presencial. É a troca de mensagens e memes, ligações e chamadas de vídeo. É marcar de se encontrar e não comparecerem por preguiça ou um compromisso urgente. São as piadinhas internas, risadas e silêncios compartilhados.

Amor é respeito. Respeito quanto ao modo de falar, vestir-se, escolher. É não machucar de propósito. É deixar a pessoa ir se ela escolher sair de sua vida.

Amor é mutualidade, pois um só fazer tudo é tóxico. Não importa o quanto a outra pessoa seja gentil, se ela não te amar, tudo o que você ganhará serão traumas e um coração machucado.

E amor é confiança. Confiança de que a pessoa vai cuidar bem de seu coração. Que ela não te trairá de jeito nenhum. Que ela guardará seus segredos. Que ela estará lá quando precisasse. Que estenderia a mão quando caísse e não conseguisse levantar por si só.

O pequeno Keiji de catorze anos odiou saber que, de acordo com seu conceito de amor, talvez nunca tivesse amado ninguém por completo.

O motivo? Nunca confiou em ninguém por completo.

Até então, nunca confiou em alguém o suficiente para pedir ajuda – pelo menos, não quando a coisa ficava séria. Mal contava seus segredos à pessoa que mais confiava, sua avó – que morreu pouco antes de entrar para a Fukurodani.

"Nunca disse 'eu te amo' a ninguém, então acho que nunca menti sobre isso", pensava. "Se eu nunca disser, nunca vou iludir a ninguém e nem a mim mesmo".

Passou um ano e meio conformado com o fato de que era incapaz de amar alguém verdadeiramente – seja como amigo, como filho, como amante.

Nesse meio-tempo, assistiu a Bokuto pela primeira vez. Foi paixão à primeira vista – paixão, e nada que se assemelhasse ao seu conceito de amor.

Não se achava capaz de amar a alguém, porquê nunca confiou verdadeiramente em ninguém. Não esperava que a Estrela notasse sua existência, e nem achava que faria amigos.

O moreno lembrava-se com exatidão como todas aquelas crenças horríveis começaram a cair por terra.

HEY, HEY, HEEEEEY~!— ouviu alguém gritar.

Sabia quem era. Aquele "grito de guerra" era a marca registrada do mais velho. Apenas uma semana no time foi o suficiente para perceber isso.

— Sim, Bokuto-san? Precisa de algo?

Lembrava com exatidão do brilho no olhar de Koutaro. Com suas mãos justapostas atrás das costas, balançava levemente para frente e para trás com certo nervosismo.

"O que a Estrela quer comigo?"

— Pode levantar a bola p'ra mim um pouco mais? Ninguém mais quer continuar jogando comigo ... — pediu, meio acanhado.

Na época, Akaashi não havia assistido a "Divertidamente". Isso não impediu que os bonequinhos que controlavam sua cabeça tivessem um AVC ou desmaio.

     Keiji não conseguia ver motivo algum para alguém tão interessante quanto a Estrela pedir para jogar um pouco mais com alguém tão sem sal como pensava que era si mesmo.

     Mesmo surtando por dentro, manteve a expressão neutra e respondeu:

— Claro, Bokuto-san.

     E aí vieram treinos extras. Depois, troca de números de telefone. Logo, as conversas entre as aulas. E os intervalos compartilhados. A tradição.

     E Akaashi passou a confiar em Bokuto. Passou a contar sobre problemas não tão pequenos que resolveu sozinho.

     Naquele ponto, já tinha certeza de que amava a Koutaro.

     Amava ao Ace não apenas romanticamente: amava-o como amigo, como pessoa, como jogador, como colega e até como confidente.

     Um tipo de amor não necessariamente anula a outro. Às vezes, complementam-se.

     O surpreendente foi passar a amar sua própria mãe – de acordo com seus conceitos friamente calculados, claro.

     Passou a esforçar-se para contar pequenas coisas que lhe aconteciam. Informava sobre cada pequeno "avanço" com Bokuto. Isso queria dizer que confiava na progenitora, nem que fosse um pouquinho. Certo?

     "Existem muitas exceções e variações no amor", ponderou numa tarde fatídica durante a tradição. "Acho que tudo bem ser mais flexível com isso tudo".

     "Talvez eu consiga dizer 'eu te amo', um dia ..."

     Keiji queria isso, mas continuava reservado e tímido e ansioso como sempre.

     Olhou para a bola de cobertores felpudos sobre a cama juntamente consigo. Sorriu pequeno.

     "Queria que esta primeira vez fosse com ele ..."

"Quando rola o tchan" [Bokuaka]Onde histórias criam vida. Descubra agora