Sobre segredos e palavras que ferem

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     Akaashi achou que Bokuto "voltaria ao normal" no dia seguinte.

     Achou errado. Bem errado, aliás: completava-se uma semana desde aquele dia e ele não voltou ao normal.

     O Ace passou a analizar a todos que interagiam de alguma forma com Akaashi, como se eles fossem monstros da mitologia grega disfarçados de humanos como nos livros do Riordanverse e quisessem o moreno bem enterrado a sete palmos do chão.

     Isso se aplicava até aos membros do time.

     Quando não observava a todos (às vezes sem nem piscar por minutos completos), colocava o "biquinho do pensamento importante" e esquecia do mundo ao seu redor.

     Ah. E ele trocava mensagens com Kuroo.

    A toda hora. O dia todo.

     O pior foi que isso afetou a performance geral do time.

     Depois duma conversa séria com o treinador, o levantador decidiu que precisava colocar razão na cabeça do mais velho. Nem que para isso precisasse abrir a cabeça do mesmo aos socos.

Por que você tem agido assim, Bokuto-san?

     O mencionado quase teve um infarto e seu celular voou de sua mão pelo pulo que deu. Recuperou e bloqueou o aparelho, mal sabendo disfarçar:

— "Assim" como?

— "Assim" como se um assassino profissional não identificado tivesse se disfarçado p'ra me matar. E "assim" como você anda pensando em algo que considera importante durante todo o período que não ' de segredinho com o Kuroo-san.

     Se a situação não estivesse tão crítica e o veterano não tão suscetível a fugir do assunto até a morte, Keiji com certeza não teria sido tão ácido e muito menos tão incisivo. Mas a situação estava séria.

     Koutaro piscou várias vezes, processando o que ouviu. Um vermelho vivo pintou-lhe até as orelhas.

— Eu- eu não sei do que ' ' falando, Agaashie!

Por favor. Eu ' falando sério. Isso ' atrapalhando todo mundo.

     O mais velho apertou os lábios numa linha fina. Desviou-se do olhar penetrante e sério de Keiji.

— Isso ... é particular.

— Deixa de ser particular a partir do momento em que o treinador me pede p'ra resolver.

— Continua sendo particular.

— Ok. — respirou fundo para manter a calma — É particular. Pode dividir essa coisa particular comigo p'ra resolvermos ela juntos e deixar de atrapalhar o time todo?

— Não.

     "Senhor, dai-me paciência. Se me der forças, eu faço churrasco de coruja."

— Bokuto-san, o negócio é sério.

— A minha coisa particular também é séria. Não acha que eu tenho capacidade de cuidar de coisas sérias sozinho?

— Você é perfeitamente capaz de lidar com coisas sérias. A questão é que esta coisa séria ' te fazendo atrapalhar o resto do time, e por isso precisa de ajuda. P'ra isso estou aqui. Me conta, vai ...

— Você não conta os seus problemas p'ra ninguém, por mais sufocantes que sejam. ' mesmo reclamando de mim?

     Arregalou os olhos de leve.

— Mesmo- mesmo assim, eu não atrapalho ninguém.

— Você atrapalha a minha paz fazendo isso! Eu sou seu melhor amigo, e nem assim você fala dos seus problemas!

— Acho que sempre deixei bem claro como não quero chamar a atenção, e muito menos preocupar os outros. Principalmente quando eu me importo com as pessoas em questão.

— Não é porquê os seus pais não se importam em te dar atenção que a gente vai fazer o mesmo!

     Akaashi gelou.

     Bokuto percebeu que falou o que não devia.

     Akaashi ignorou Bokuto gritando pedidos de desculpa e o fato de que tinha treino naquele dia.

Pela primeira vez, Bokuto tornou as coisas difíceis. Muito, muito difíceis.

     Não houve chocolate quente na mesa-de-cabeceira. Nem notebook com um desenho sendo reproduzido sobre a cama. Muito menos comentários diversos.

     Mas houveram cobertas felpudas. E lágrimas. E dor no peito.

     E solidão. Solidão do tipo que achou ter superado.

"Quando rola o tchan" [Bokuaka]Onde histórias criam vida. Descubra agora