No pequeno altar de jade branco, duas placas e dois incensários pareciam frios e distantes. Na mesa, frutas e pedaços de pão foram dispostos em tigelas de porcelana.
Enfim, chegara o dia do memorial dos Hong.
Yue tinha onze anos quando seus pais se foram. Geralmente, é comum ouvir que as pessoas morrem de acidente de carro, uma queda súbita de um avião ou de doenças graves. Mas esse não foi o caso deles. Em uma manhã bonita, eles saíram pela porta sorrindo e, após um breve sumiço, os irmãos receberam a notícia de que não voltariam mais.
O filho mais velho, Timo, tinha apenas 15 anos na época. Ele teve de lidar com boa parte da carga sozinho.
De família estritamente tradicional e conservadora, ao escolher se casar com uma mulher estrangeira e sair da China, o filho caçula dos Hong teve de aceitar que ela seria sua única família a partir de então. Além dos avós paternos e o tio, que moravam na China, Xiao Yue e Timo não tinham nenhum parente consanguíneo por perto. Naquele momento, o carisma de seus pais e suas redes firmes de amizades foi o que os mantiveram. Seus amigos os acolheram durante os dias de luto, fazendo o possível para quebrar o clima pesado, em memória a suas personalidades brilhantes.
Mais tarde, a avó voou até Vale D'Oro para buscar Yue, a caçula. Talvez por obrigação ou um traço de empatia, ninguém sabia dizer. Então, por um tempo, ela teve de morar na casa menos aconchegante que já vira em toda a vida, em um país completamente diferente e com uma senhora tão distante quanto o pico do monte Everest.
Alguns anos depois, após se formar e ter renda estável e idade suficiente para usar sua parte da herança, Timo finalmente convenceu a avó de que conseguiria cuidar dos dois. Com o apoio dos pais de Angela, a namorada de toda vida, Timo conseguiu manter os estudos, usar as notas fenomenais e, por fim, abrir a própria empresa. E, depois, trazer a irmã para casa.
Desde então, eram somente os dois — e Angela, a agora noiva. E os pais de Angela. E o cachorro dos pais de Angela.
— Sua vez. — Timo sussurrou ao lado.
Com dois incensos acesos nas mãos em concha, Yue abaixou a cabeça e fechou os olhos.
— Mãe. Pai. — começou. — Sou grande agora, huh? Mês passado foi a competição e sabem de algo? Sua garotinha conseguiu o primeiro lugar! — tirou a medalha do bolso e a pendurou no gancho. — Timo já disse que vai se casar, mas esqueceu da parte em que é um bobo apaixonado maior ainda. Em um dia me mandou umas 10 fotos da noiva, acreditam? Tenho certeza que vocês ririam dele...
O riso abafado soou atrás dela. Não havia nada que pudessem fazer além de sussurrar para o vento.
Sem conseguir formar mais frases, ela se ajoelhou. Uma, duas, três vezes. Em seguida, enterrou os incensos no incensário; então foi para o lado de Timo.
Na cultura oriental, a noção de alma é diferente da ocidental. A crença é de que cada pessoa possui 3 almas e sete espíritos — que é a energia vital. Depois da morte, uma das 3 almas ascende ao além, outra acompanha o corpo na terra e a última passa a residir na estela funerária.
Pensar de tal forma era reconfortante. As duas estelas com os carácteres dos nomes deles estavam de frente para eles. Era como se, de alguma forma, uma parte deles sempre estivesse presente. Fosse em seus corações, fosse ali, naqueles carácteres bem desenhados.
Apesar das desavenças, o senhor Hong ainda era um cidadão chinês de família tradicional. Manter os aspectos foi uma forma de demonstrarem respeito e manter suas memórias. Eles amavam cada pequeno aspecto uns dos outros.
— Ela veio? — Yue perguntou, ainda olhando para frente.
— Mesmo se viesse, sabe que ela não passaria do portão. Mas não acho que cruzaria o planeta. — a resposta saiu junto com um suspiro. Então passou o braço pelos ombros da irmã e sorriu. — Vamos, temos bolo também.
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Romance"Ela pode correr 100 metros em 11 segundos, como eu conseguiria alcançá-la? Enfim, o amor é assim. Às vezes dura, noutras não; às vezes nem acontece - acho que esse é o nosso caso. Ou o meu. | | Alguém-que-ainda-não-desistiu-de-você." Após con...