Capítulo 1

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Sexta-feira, 27 de maio de 2011

Eu e Sílvia estávamos na lanchonete da faculdade apreciando a paisagem. Para a informação de todos, a paisagem a qual me refiro são os universitários que fazem parte do time de futebol da faculdade. Eles são lindinhos, musculosos e bastante charmosos, eles são o centro das atenções da maioria das meninas da faculdadee sabem como dizem " olhar não arranca pedaço', então eu e Sílvia olhamos descaradamente, eles gostam de atenção e nunca olham de volta.

Sílvia era minha melhor amiga, filha única de pais separados, agradável sempre que queria pedir alguma coisa para alguém, fora isso, ela era sempre ácida e de mal humor, mas quando ela estava de bom humor... a presença dela era ótima e fazia valer a nossa amizade.

Então você me pergunta, se eu falo tão mal assim da Sílvia, será que somos mesmo amigas? Eu achava que éramos, passamos por muitas coisas juntas.

Nos conhecemos quando tínhamos cinco anos. Na escola, brincávamos juntos de fazer cobrinhas com massinha de modelar. Foi então que passamos a dividir nossos brinquedos, trocar os lanches e passar fins de semana uma na casa da outra. Éramos inseparáveis.

Até que quando tínhamos oito anos, Sílvia sofreu um acidente, ela foi atropelada por um adolescente bêbado de dezesseis anos que nem tinha permissão para dirigir. Ela quebrou um braço e ficou com alguns hematomas, mas no geral, teve muita sorte. Lembro de ter passado várias tardes com ela para que não se sentisse sozinha. Até que emprestei meu coelho de pelúcia, o Senhor Coelho (muito original, não é?), que era tão confortável, macio, com orelhas grandes e até uma cartola, tudo isso para que ela pudesse dormir melhor mesmo com aquele gesso a incomodando. Nossa amizade foi testada naquela situação, porém passamos na prova porque nos apoiamos uma na outra e nos mativemos unidas.

Até outra situação aparecer. Dessa vez enfrentamos uma triateza juntas e compartilhamos a dor uma da outra. Aos treze anos, meu cachorro, Hector, morreu. Ele era um lindo pastor alemão que me foi dado de presente quando eu nasci. Hector sempre esteve conosco, principalmente em nossas festinhas do pijama e durante nossos passeios no parque. Lembro de um episódio em que Sílvia e eu passamos um final de semana inteiro fazendo uma maquete do sistema solar, deu um trabalho mas ficou linda. Quando estávamos levando a maquete para o carro no dia que deveríamos apresentá-la a tuma, Hector veio correndo da sua casinha e abocanhou o isopor, ele simplesmente destruiu todo o nosso trabalho e ficamos desesperadas, realmente tivemos que dizer à professora que meu cachorro comeu o nosso trabalho, se minha mãe não tivesse confirmado a nossa história para a professora e a diretora do colégio, duvido muito que teriam deixado a gente apresentar em outro dia. Com a morte de Hector, enfrentamos a dor da perda pela primeira vez e fiquei feliz por ter uma amiga com quem contar.

Mas quando chegamos aos quinze anos, tudo mudou. Os pais de Sílvia se divorciaram. E minha amiga dedicada, amável, alegre e gentil se tornou falsa, rebelde, mal humorada e complicada. Sei o quanto foi dificil para ela ter que viver esse momento e eu tentei fazer de tudo para ajudá-la, mas como ajudar alguém que se afasta de você? Durante um ano inteiro tive que conviver com uma nova Sílvia. Uma Sílvia que pensava em sair para festas todo fim de semana e de usar roupas caras e de pensar em garotos. Eu não sabia o que fazer para ter a minha amiga caseira, que gostava de passar sábados a noite assistindo filmes romanticos na minha casa comendo pipoca com sorvete. Até que eu percebi que eu não podia fazer nada para tê-la novamente. Essa era a nova Sílvia, a "Sílvia crescida" segundo ela. Então eu me acostumei a essa nova pessoa. Me acostumei a encobrir as saídas a noite às escondidas com garotos. Me acostumei a ouvi-la falar mal de várias garotas do colégio e depois tratá-las como melhores amigas. Eu me aocstumei a todas as suas fases: a fase roqueira com roupas pretas rasgadas e cartazes de bandas coladas na parede; a fase roupas caras que ela pagava o preço de uma bota de salto de cano alto de couro legítimo em  sandálias rasteiras só porquie eram de marca; a fase "look novo", onde cada mês ela ia ao cabeleireiro pintar ou cortar o cabelo, Sílvia já teve cabelo ruivo, preto, verde, azul, rosa, roxo, laranja e o arco-íris inteiro. Eu me acostumei a conhecer três namorados em um único mês e também me acotumei a não falar nada sobre suas infidelidades. Eu me acostumei à ela pórque a amava e nossa amizade era a coisa mais importante que eu tinha.

Agora nós estamos aqui, sentadas na lanchonete, babando por jogadores de futebol da faculdade enquanto Sílvia tentava me convencer a ir à uma festa na noite seguinte.

- Ah, vamos Sandra. Não tem graça ir a uma festa sem você.

Mentira. Sílvia já foi a milhares de festas sem mim e já escutei diversas vezes, no dia seguinte, como essas festas foram fantásticas e que eu estava perdendo.

- Você sabe, Sílvia, que eu não vou com a cara do Lucas. - bebi um gole do meu refrigerante enquanto via Issac, o goleiro do time, trocando de camisa e mostrando aquela barriga definida que qualquer mulher gostaria de lavar roupa. - E ele nem me convidou para essa tal festa.

- Mas é claro que ele convidou, Sandra. - Silvia jogou uma mecha do seu cabelo para trás da orelha, ela sempre fazia isso quando queria argumentar. - Ele disse que eu poderia levar quem eu quisesse e eu queria levar você. E se você fosse mais simpática com ele, teria recebido um convite direito.

Eu detesto o Lucas. Ele é um dos ex-namorados da Sílvia, que de vez em quando volta a ser namorado novamente e no dia seguinte já não é mais. Eu sempre tentei ser no mínimo simpática com todos os caras que Sílvia já namorou, mas Lucas é a único que não consigo. Para todo mundo ele é engraçado, mas ele só faz piada com o que machuca os outros, ele gosta de expor, em tom de brincadeira, as imperfeições de qualquer pessoa. Fora que ele é completamente mimado, se acha superior a qualquer um só porque sua familia é rica, do tipo que tem realmente muito dinheiro guardado. Ele vive esfregando na cara de qualquer um os produtos de tecnologia avançada que seus parentes trazem das viagens ao exterior, são sempre coisas que não se encontra por aqui ou se encontrar é um fortuna. Lucas é ridiculo, narcisista e egocentrico, além de ser falso, consegue ser mais fofoqueiro que muitas garotas. Ele adora exibir aquela beleza comprada dele. Digo isso porque seus cabelos loiros são descoloridos mensalmente, seu nariz afinado e suas orelhas de tamanho normal são frutos de uma cirurgia plástica e todo mundo sabe que aqueles musculos não são frutos de horas de academia e sim de remédios que fazem mal à saude. Faço o máximo que posso para evitar ficar perto dele.

- Sinto muito, Sílvia, mas eu jamais irei gostar dele. E além do mais não quero ir a essa festa porque tenho uma prova importante na segunda e passarei meu final de semana estudando.

Comecei a recolher meus papeis que estavam sobre a mesa, dando aquele assunto por encerrado, como se alguém pudesse considerar um assunto encerrado quando a ultima palavra não era da Sílvia Pontes.

- Vamo fazer assim. Vamos à festa juntas, comemos, bebemos, dançamos, conversamos com alguns caras legais e voltamos cedo. Prometo cuidar para que você não fique bêbada e comece a fazer um strip tease em cima da mesinha de centro da casa do Lucas e também prometo que passarei o domingo estudando com você.

Eu não bebo e Sílvia sabe disso, então não haveria riscos de um strip tease. E eu também sabia que Sílvia sairia daquela festa acompanhada e eu não saberia dela durante o domingo inteiro. E mesmo sabendo que eu não queria ir, que eu não deveria ir e que eu me arrependeria, eu sabia também que não tinha como recusar a cara que Sílvia fazia quando queria alguma coisa.

- Tá bom, eu me rendo! - levantei da cadeira, guardei meus livros e papeis na mochila e dei mais uma olhada no time de futebol. - Eu vou a essa festa, mas antes eu quero saber como você sabe que o Lucas tem uma mesa de centro na casa dele?

O garoto da casa amarelaOnde histórias criam vida. Descubra agora