Ao ver o sangue seco cobrindo todo o moletom, Ramona gritou.
-Tira isso da sua mão tá te incriminando, isso se não for você mesmo que fez.
A encarei percebendo a verdade, tínhamos uma testemunha ocular, roupas da vítima sujas de sangue e um local deserto. Óbvio que seríamos suspeitos.
-Tem alguma outra porta? -perguntei me recordando que nós não podíamos ser suspeitos de algo assim.
- Não tem outra porta além da que entramos e eu levei a chave.- Aliana pensava enquanto ainda segurava o moletom com 2 dedos para não tocar muito.
- Pega umas sacolas grandes para pormos o moletom rápido.
Ramona me lançou um olhar de negação, ela sabia o que eu íamos fazer? Provavelmente ela foi a primeira a me conhecer depois que me mudei para a cidade, não sou nascida e criada aqui mas vivo desde os 9 com meu tio aposentado, minha mãe não era a melhor pessoa para me criar. Pelo menos foi o que a psicóloga do conselho tutelar me disse.
Enquanto colocamos o moletom de Akira em sacolas plásticas para ninguém ver o próprio Akira corria pela a floresta.
Ao sair do jardim cinza tentávamos agir o mais natural possível, ou seja, estávamos todos amontoados e andando com passos pequenos enquanto cochichavam.
- ALIANA!
Ao ouvir Aliana parou e se virou para a porta da varanda dos fundos da casa, e lá estava o velho pescador, usava uma calça social e uma blusa de botão azul, ele era um pouco alto, gordo, com cabelos brancos e nos olhava sério.
- O QUE ELES FAZEM AQUI? JÁ DISSE PRA NÃO TRAZER VAGABUNDO PRA CÁ!
- Calma tio Elvir, são só amigos de escola, temos um trabalho para fazer, mas, nós vamos fazer na casa da Morgana.
A mentira escorreu e respingou em mim, que obviamente concordei ainda sem saber se deveria falar com aquele velho. Elfried olhava para ele como se ele fosse Gandalf e Ramona mantinha uma postura tão séria quanto a dele como se estivesse esperando um "FIGHT" e pudesse sacar uma katana.
- O que faziam lá? Querem estragar meu jardim? Não ranquem minhas rosas!
Ele dizia em um tom de voz alterado de mais para serem só rosas enquanto mancava até nós com uma bengala, ela era marrom escura mas tinha um enfeite prata em cima mas por sua mão estar segurando não conseguia ver.
- Nós só queríamos ver a mansão de perto- Elfried tomou as rédeas do assunto, se aproximou do velho - Sabe de longe não conseguimos ver os jardins lindos que o senhor tem aqui, tenho certeza que gasta muito tempo cuidando dele para manter tudo isso.
- Não, é o jardim que cuida de mim, menino. Depois de uma idade não conseguimos nem segurar um lápis- o senhor disse com a voz tranquila, não olhava bravo mas ainda estava sério para nós, não, ele olhava para mim, aquele olhar era só para mim.
- Você não é a menina da Hadassa?
Por alguns segundos deixei o rosto sério para ficar surpresa, aquele velho não tem educação nenhuma.
- Sou.- pronto, não precisava dizer mais nada, não devo nada a ele de todo jeito, velho rancoroso, tinha raiva de mim só porque roubei umas mudas do jardim dele para plantar em casa.
- Eu lembro dela, aqui.... Na cidade.
Ele continuava a falar dela, como se fosse algo do dia a dia, velho ridículo e inescrupuloso, sim inescrupuloso, essa é uma palavra que aprendi com ele e faço questão de usar com ele.
- Que bom que se lembra, pelo menos não está gagá...ainda.
Aliana me repreendia com o olhar, mas, uma preocupação de cada vez, não podia perder a oportunidade de me vingar desse velhote, última vez que o vi tinha 9 anos e estava nesse mesmo quintal roubando uma muda de rosa depois de pular o muro da mansão, achava que estava vazia nunca via ninguém lá mesmo. Mas ele estava, e me viu, me expulsou de lá aos berros e me chamou de ladra e inescrupulosa, eu nem sabia o que era isso. Procurei no dicionário dias depois, queria saber do que o velhote me chamou.
- Nós temos que ir senhor Elvir, quero terminar o trabalho logo pois tenho que ajudar em casa.- Ramona disse tentando nos tirar de qualquer questionamento que poderia surgir da parte do velho, e conseguiu. O Elvir apenas concordou com a cabeça e voltou para a varanda se sentando em uma cadeira. Saímos de lá quase que correndo e abrimos o portão bem mais rápido dessa vez.
- Temos que decidir o que fazer com o moletom.
Ramona, como sempre sendo a voz da razão, nos lembrou da prova incriminatória que tínhamos em mãos.
- O sangue pode ser dele.- Elfried tentava limpar a barra de Akira.
- Se fosse dele já tinha morrido, isso tá pintando sangue mesmo estando um pouco seco. -Aliana tinha razão nisso, aquele sangue era de outro.
- Podemos levar para a polícia e explicar o que ocorreu, nós não temos nada a ver com isso.
Não gosto de me encrencar com a polícia, se descobrirem mais tarde que temos isso podem nos incriminar, não quero ir pra um reformatório de novo.
- Mas vão achar que Akira é um assassino.- Elfried estava se coçando de curiosidade, era óbvio que ele queria descobrir primeiro.
- Ou vão ajudá-lo caso alguém esteja atrás dele.- Ramona estava certa, devíamos ouvir ela, devíamos mas não fizemos.
- Akira andava com Camus e Madalena, acho que podemos dizer assim já que ele raramente fala algo, se ele fugiu da mansão então ele correu para a floresta, não para a cidade. Deve ter ido até a Madalena.
Eu disse tentando juntar um pouco das informações que tínhamos, e foi o suficiente para todos concordarem em dar uma volta pelos arredores da casa da Madalena apenas para ter certeza se deveríamos entregar ou não para a polícia.
- Apenas por um tempo, se não virmos nada levamos ainda hoje para a delegacia.- todos concordamos, ambos com curiosidade de mais para esperar.
Primeiro crime cometido em grupo, já podíamos ser considerados uma família?
Peguei a bicicleta do meu tio e levei Aliana na garupa, enquanto Ramona levava Elfried na pedaleira. Não era tão longe a casa mas era estrada de chão, e bem ruim até, não sei como esse prefeito continua no cargo.
A casa de Madalena ficava na clareira da floresta, sempre ouvi histórias sobre a mãe dela, alguns mais crentes diziam que ela jogava tarô, via a sorte e até fazia alguns trabalhos, mais sempre preferi a versão de que ela é uma traficante internacional de drogas e planta maconha na floresta para revender e por isso ela consegue se sustentar sem trabalhar e se esconde na floresta para ninguém notar. É algo que eu faria se vendesse drogas.
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mistérios em Hausþoka
Mystery / ThrillerVivo em uma cidade velha e antiga porém esquecida chamada Hausþoka, todos vivíamos nossas vidas mesquinhas e sem graça, guardando nossas segredos. Até o corpo ser achado. (TW)Alerta de gatilho: suicídio, abuso de drogas, depressão, auto-mutilação, a...