Capítulo 06

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No jantar da noite seguinte, Harry perguntou sobre o questionário, e ficou surpreso com o quanto ela havia decorado. —Diga o que sabe sobre o meu trabalho. —Ele disse, enquanto cortava seu churrasco de picanha.Ela respirou profundamente. —V... Você estudou na escola de medicina e se especializou em c... Cirurgia, mas percebia que as máquinas usadas para manter coração e pulmão funcionando poderiam ser melhoradas... —Faith? Ela levantou os olhos como um coelho em uma armadilha, mesclando no olhar dor e temor. Ou possivelmente uma antecipação da dor. —Sem mais gagueira. Falo sério. Está se tornando cansativo e só temos quatro dias. Tem que parar com esse temor ou então não tenho outra alternativa a não ser encarcera-la no calabouço. Harry colocou uma mão sobre as dela, ela retirou a mão e olhou para o prato. —Olhe para mim. Ela levantou os olhos e seus lábios tremiam. —Não quero fazer isso. Se quisesse, não perderia tempo com você. Mas cuido da minha família. As mulheres não precisam saber sobre este negócio licencioso. Entende? Ela concordou. —Agora tente falar naturalmente e dizer o resto. Com grande esforço, ela impeliu as palavras para fora de sua boca, tentando não gaguejar.
—S... Seu desenho promoveu uma considerável melhoria nas m... Máquinas e obteve a patente, e agora as vende para hospitais e cirurgiões de todo o país, que é de onde vem seu dinheiro. —Reuniu coragem enquanto falava. —Ainda faz cirurgias duas vezes por semana. E foi com o seu dinheiro que construiu a clínica particular aqui, em sua casa. —E? A respeito do sangue? —Oh. —Ela avermelhou pelo descuido. —Você também está envolvido com produção de sangue artificial e consultoria, é muito ocupado realizando alguns testes clínicos que faz em seu próprio laboratório,onde montou o centro de operações. Começará a produzir quantidades regulares de sangue no final da próxima primavera. Harry não esperava que esse assunto surgisse, mas se alguém falasse sobre o seu trabalho, era o tipo de coisa que seus parentes esperavam que ele discutisse com sua noiva, particularmente porque ele não estava envolvido nos negócios da família. —Muito bem. E sobre o pessoal da casa? —Perguntou Harry, voltando para o questionário. Ela ficou confusa por um instante. —Oh. Você mandou alguns deles para a escola de enfermagem, e outros para serem capacitados como assistente nas cirurgias e em pós-operatório, permitindo cuidar da casa e ajudar em seus negócios. —Quantas salas de recuperação existem na clínica? —Três. Sua voz estava tão baixa quando ela falou que ele ficou em dúvida sobre o que mais desejava: amarrá-la, açoitá-la, ou confortá-la. Acreditava que seu gesto de deixá-la viver em outra ala era muito nobre, mas não estava seguro de quanto seu autocontrole duraria. Quando tomaria o que era dele?
—Diga-me como nos conhecemos. —Conhecemo-nos em uma loja na cidade. Havia esquecido minha carteira e você se... Ofereceu para pagar. —Respirou profundamente. —Então me chamou para sair. Eu aceitei. —Ela apertou os olhos como se a mentira fosse muito dolorosa ao falar. Harry acariciou o braço dela. —Não tem com que se preocupar, Faith. Confie em mim. Tudo o que quero é proteger esse amor. Não permitirei que Angelo vá para a prisão. Mas se você magoar as mulheres da família, especialmente minha mãe, deixando-as saber a verdadeira natureza do nosso relacionamento, vai lamentar-se. Esta é a única razão pela qual deve temer. É tudo,é muito simples. Enquanto ela o olhava por baixo dos grossos cílios, soube que queria acreditar que se desempenhasse bem seu papel, estaria a salvo. —H... Harry? Forçou a si mesmo manter seu temperamento. Não era sua intenção zangá-lo com a gagueira. —Sim, Faith? —O que acontecerá após o Natal? Ainda estarei viva? Que tipo de pergunta era essa? —É obvio que ainda estará viva. Se quisesse a sua morte, teria deixado você com o Angelo. Ela reuniu coragem, fez uma longa pausa. —E o que acontecerá depois? Ou no próximo ano? Ficarei encarcerada no calabouço? Não podemos fingir estarmos comprometidos para sempre. Era aonde ela queria chegar. —Eu sei. Teremos que nos casar. Pensei no próximo mês de junho. Todos amam casamentos em junho, e minha mãe estará no paraíso preparando o casamento. Feche a boca enquanto mastiga a comida, por favor. —Ele pediu devido a sua expressão pasmada.
—Não posso fazer isto. —Ela sussurrou. Faith saiu correndo pelo corredor e subiu rapidamenteas escadas para o quarto. Entrou no quarto e trancou a porta, encostou-se contra a madeira e se deixou deslizar pelo tapete. Os soluços surgiram,ofegantes e estrangulados.O que ele esperava dela era muito cruel. Representar o papel de mulher apaixonada.Fingir serem um casal. Um casamento falso. E ao mesmo tempo ser como uma princesa trancada em uma torre sem um amor verdadeiro ou uma vida para chamar de sua. Queria sobreviver e estar segura, mas que tipo de vida era esta? Ele a teria deixado sair por aí, se isso significasse segurança?—Faith, abre esta porta, agora! —A voz de Harry reverberava do outro lado da porta, enviando vibrações ao longo de suas costas como se suas mãos estivessem nela. Não conseguia respirar. Se abrisse a porta, ele poderia machucá-la. Se não abrisse, ele poderia quebrar a porta e machucá-la. Sua mente recordava a noite em que ele a espancou por uma transgressão similar. Faria de novo? Ou pior? Por que fechou a porta? Por que deixou a mesa? —V... Vai... Machucar-me? —A machucarei se não parar com a maldita gagueira! —Gritou. Ela desbloqueou a porta e correu para se esconder no armário, encolhendo-se no canto. Tudo o que queria era se afastar dele. Deus me tire daqui para outra dimensão por mágica, para longe deste lugar. Por que ele não a deixava sozinha? Abraçou a si mesma,enquanto os passos se aproximavam do lugar,inequivocamente.
—Saia! Agora! —A raiva ainda estava ali, porém suavizada por um precário controle. —Por favor, Harry... A respiração dele era dura. Rogou que ele pudesse conter seu temperamento sem descontrolar-se com ela. —Sinto muito. Sinto muito. Sinto muito. —Ela caiu como se apanhada em um espiral e não parava de repetir as palavras, esperando que pudesse acalmá-lo. A respiração de Harry retornou à normalidade, e então ele se afastou. Foi o suficiente para lhe dar coragem para deixar o esconderijo. Harry sentou na borda da cama, olhando-a. —Venha aqui! —Por favor... —Venha! Aqui!Quando ela chegou, ele a rodeou com os braços e a sustentou. Uma intenção de conforto? Ele sabia que seu toque não a confortava. Mas o fez mesmo assim. Quanto mais a tocava, mais ficava sensibilizado com a situação dela. —Sinto muito. —Ele disse contra seu cabelo. —Não tenho outra opção. —Pode me deixar ir embora. Juro. Nada direi sobre o que vi, ou sobre ser aprisionada aqui. Voltarei para minha vida e ficarei calada. Nunca falarei disto. Por favor. —Então disse algo que esperava que fosse verdade, mas não tinha certeza. —S... Sei que não quer fazer isto. Pode confiar em mim. Prometo que não falarei. Ele acariciou seu cabelo. —A família vem em primeiro lugar. Não arriscarei. E você não tem ideia das coisas que posso fazer quando fico irritado. Reze para nunca saber. A despeito da irracionalidade do seu ato, ela se agarrou a ele,porque era a inusitadamente a única coisa que poderia fazer. Ele poderia protegê-la de Angelo. Tinha que se recompor caso quisesse continuar tendo sua proteção. A voz dele era tranquila quando falou novamente. —No próximo verão se tornará minha esposa, só de nome. Não a forçarei. Não a machucarei. As coisas continuarão como até agora. Sei que está perdendo muito. Desejaria que as coisas pudessem ser diferentes para você. Por favor, acredite nisso. Afastou-se dela e a ajudou a ficar de pé. —Vamos terminar nosso jantar. Ainda precisamos praticar e terminar de repassar nossas respostas ao questionário. Faith colocou uma mão tremula na dele e lhe permitiu que levasse de volta à cozinha. Ele colocou seu prato dentro do forno de micro-ondas para aquecer por cerca de um minuto, então fez o mesmo com o dele. Enquanto comiam, ele acariciava seu braço e ela tentou não fugir mais. —Tem alergia a alguma comida? A pergunta a tomou de surpresa. —Não, por quê? —Ocorreu-me que sendo irlandesa, não comemora o Natal, poderia não estar familiarizada com nossas tradições. Nossa ceia comemorativa é na véspera do Natal. Temos muitos pescados e frutos do mar. Também temos muitos tipos de biscoitos e bolachas crocantes que contêm nozes, tipicamente uma mesa italiana. Faith fez uma careta. —Pescado para o Natal? —É uma coisa católico-italiana. Chamamos de A Festa dos Sete Peixes. Nem todos os italianos o fazem, mas é uma tradição que está na minha família no Brooklyn desde antes que eu nascesse. Temos sete diferentes pratos de frutos do mar, mariscos, lagostas, camarões,polvo,lula, mexelhão e vongoli com massa e em molho vermelho, e outros preparos com salmão ou truta, bacalhau. E é claro, teremos outras coisas que não seja frutos do mar, como espaguete sem a carne e antepasto. —O que é antepasto? —Está brincando? Alface, pimentões assados, azeitonas, anchovas, e queijo principalmente. Na mesa de sobremesas temos Baci DiDama, temos “cookies”de estrela de avelã e cereja, e “pignoli”, essas são bolachas de sementes de um tipo de pinheiro típico do Mediterrâneo. Minha tia Lily as faz em forma de meia lua recheadas com uma avelã, penso inclusive que não é italiano. E encontrará “cannolis“ que são tubos de massa frita recheada com creme de ricota com frutas cristalizadas e vários tipos de frutas. Harry encontrava-se em um tipo de consternação. Sem dúvida perdido nas memórias das festas que Faith pretendia entender. Depois do jantar passaram para o resto do questionário. Ela sabia todas as respostas. Repassou uma e outra vez, a ameaça do calabouço estava pendente sobre sua cabeça. A parte difícil era fingir que o amava. A parte fácil era os fatos e as cifras. Aplicou-se com obstinação a aprender tudo o que ele havia escrito, esperando que pudesse impedir que a encarcerasse durante o Natal. Quando ele ficou satisfeito com seu conhecimento, levou a outro cômodo diferente. Este tinha uma grande tela plana contra a parede. Pôs um CVD na unidade de reprodução, apagou as luzes, e se uniu a ela no sofá em silêncio. Era uma paródia sobre um encontro, um filme para garotas e colocou o braço ao redor dela. O filme era uma comédia romântica com o típico argumento. Se já havia visto uma, havia visto todas. Seria lindo se perder na história, mas não podia. Ela se perguntava se seria capaz de imaginar tudo que estava vivendo, ou algo parecido, caso tivesse ficado em casa com seu gato naquela noite ao invés de sair. Na metade do filme,Harry girou o rosto dela para ele, e seus lábios se encontraram com os dela. Ela estava gelada, incapaz de relaxar sob seu toque, naquela circunstância. Ele se afastou. —Relaxe, Faith. Tudo o que trocarei com você serão beijos castos. Pode retribuir. Trocaremos muitos assim quando minha família chegar. Seria melhor se acostumar ao meu beijo. Ele tentou de novo, e desta vez ela se forçou a relaxar e fingir que era um encontro com um homem a quem disse sim. —Melhor. Trabalharemos nisso depois. Harry a atraiu para dentro de seus braços e continuaram vendo o filme. Sustentou-a como se fosse seu namorado, mas mesmo debaixo da coberta da escuridão, ele não a tocou. Quando o filme terminou, ele acendeu a luz. —Conversaremos de novo amanhã. Vá dormir. Não teria que pedir duas vezes. Não podia voltar para o quarto suficientemente rápido, o único lugar onde se sentia segura. À noite, Harry  protagonizou seus sonhos. Exceto que em vez de ser um filme de terror, de monstros, ele era seu noivo, era amável e divertido. Quando houve beijou no sonho, ela derreteu contra ele e gemeu, abrindo a boca para aceitar a exploração de sua língua. Os braços dela agarraram seus ombros musculosos, tentando aproximá-lo, querendo ser consumida por ele. Entre suas pernas começou uma dor palpitante até que a mão dele deslizou dentro da sua calcinha,para acalmá-la. —Vê Faith? Isto não é nada demais. —Harry falou no sonho. —Você pode me dar isto.
Quando ela despertou, a própria mão estava entre as pernas, e estava excitada. Não! Se alguma parte dela na verdade caísse por ele, seria muito doloroso. Não queria ser como uma dessas vítimas sequestradas que começava a simpatizar com seu captor. Não queria começar a acreditar em suas mentiras. E definitivamente não desejava querê-lo, ou suas mãos, ou seus lábios nela. Ela pressionou o rosto contra o travesseiro,com o intento de amortecer a angústia, sabia que Harry não a escutava do outro extremo da casa. Então pressionou o rosto contra o travesseiro para amortecer o som do seu orgasmo.

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