Capítulo 1 - Posso orar por você?

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     As palavras ainda estavam ecoando na minha cabeça enquanto o asfalto sinuoso tornava-se meu único rumo na estrada; os prédios urbanos, iluminados e convidativos eram apenas borrões de concreto e luzes

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     As palavras ainda estavam ecoando na minha cabeça enquanto o asfalto sinuoso tornava-se meu único rumo na estrada; os prédios urbanos, iluminados e convidativos eram apenas borrões de concreto e luzes. Estou repleta de uma dor que parece me dilacerar por dentro, que sempre ameaçou explodir dentro de mim, mas nada disso importa, na verdade, nada me afeta mais. O cheiro de bebida e cigarro estão impregnados na minha camiseta preta de algodão escrito lambe meu rabo, por baixo de uma jaqueta preta de couro.

Na maioria das vezes, sou assim: impulsiva, nada simpática e levanto muralhas intransponíveis para qualquer pessoa. Mas, hoje, depois da revelação da minha tia Lúcia, voltei a ser a pequena Carla, a garotinha que Laura trouxe ao mundo. Hoje descobri que meu pai não era um bom homem. Na verdade, minha vida inteira tinha sido uma mentira, das mais banais.

Minha mãe que fora rejeitada pelo cara que ela mais amou na vida, morreu após um procedimento malsucedido de aborto em uma clínica clandestina. Tudo custeado pelo meu progenitor, o homem que deveria amá-la e respeitá-la até o fim da vida, pagou para que ela sangrasse até a morte em uma cama hospitalar improvisada, fria e suja.

Mas, nem sempre tinha sido assim, em algum lugar, existiu uma Laura feliz e dona de si, o infortúnio foi culpa de seu coração tolo que se apaixonou por um homem que fazia promessas. Um homem que nos rejeitou, que não estava pronto para ser pai, mas nascera pronto para ser dono do templo inviolável da minha mãe, de seu corpo e de sua vida.

A sociedade permite que homens como ele tenham um sono tranquilo ao repousar a cabeça no travesseiro. E, para nós, suas presas fatais, restavam apenas noites mal dormidas e pesadelos que nos perseguirão para o resto de nossas vidas. Repleta de ódio, decido parar no acostamento, tiro o capacete preto e limpo as lágrimas escorregadias no dorso da mão. Suspiro fundo, recobrando minha pose de durona, preciso levantar novamente as minhas muralhas para que ninguém se atreva a tentar me derrubar.

Mas, não posso negar, as letras da certidão de óbito ainda dançam na minha cabeça. Suspiro novamente, fecho os olhos e refaço meu caminho até o bar Garras Infernais e vejo as mesmas motos paradas em fileiras, couro, espinhos e caveiras do moto clube mais temido de Recompensa.

  É um nome meio incomum para uma cidade, mas segundo a história local, muitos devotos da Santa Gratidão acreditavam que esta cidade misturada entre prédios altos e casinhas coloridas, escondia uma energia de fé muito potente. Inclusive, o turismo religioso aqui é o que movimenta nossa economia. Eu não acredito nessas coisas, creio que seja apenas bobagem para arrecadar dinheiro de fanáticos.

    Mas não importa, meu lugar favorito no mundo é bem oposto ao ideal de "fé" dessas pessoas. Por segundos, o bar parece meu destino perfeito. Estaciono minha moto apelidada ironicamente de "Blessed" e me preparo para mais um dia de trabalho. No meu aniversário de dezoito anos, usei o dinheiro que minha mãe economizou para o meu futuro. A minha moto Yamaha preta Mt 07 de 2016, era de segunda mão, mas foi a melhor coisa que comprei na vida.

A Filha Rebelde do Pastor (AMAZON)Onde histórias criam vida. Descubra agora