Contos Lago das Carpas

2| Linfael

Eu já havia desistido. Já era a sexta ou sétima vez? Sequer me lembro. Build me up buttercup estava repetindo sem parar na junkbox da lanchonete. Em todas às vezes o casal alegre da mesa 8 cantarolava, uma vez baixo, na outra vez alto. Era um canto desafinado, fora do tom e do tempo, eles se perdiam na letra cafona quase todo verso. Entretanto, era um cantarolado feliz, recheado de gargalhadas, com incontáveis sorrisos e era palpável o amor existente ali.

Era palpável que eram almas gêmeas.

Meu coração se aperta com essa conclusão. Estava a espera da minha suposta alma gêmea. Minha paixão era imensa. Seus cabelos escuros eram sedosos, seu perfume delicado e um tanto fraco fazia meu peito dançar de uma forma alegre e fervorosa. Sua pele alva se tornando corada por vergonha me fazia ser grato por ter a oportunidade de ver algo tão lindo assim. Sua gargalhada me trazia uma felicidade genuína. Seu sorriso era mais lindo do que qualquer constelação.

Amanda era apaixonante e estupidamente perfeita

Sempre me interessei por esse assunto, chegando a conclusão que alma gêmea está ligada a uma conexão entre pessoas onde há sobretudo afinidade. Isto pode ser relacionado com a similaridade, o amor, romance, a intimidade, sexualidade, espiritualidade, compatibilidade e confiança. E Amanda é tudo isso. É minha metade, minha paixão, minha confidente, minha razão, minha melhor amiga.

Ela é a alma que me completa e que aparentemente me deu um fora.

Desde que fiquei sabendo que existe alguém que te completará por inteiro eu pesquiso sobre isso. Já dizia o meu nome: Linfael, uma pessoa que procura e se sente atraído por aquilo que é novo e desconhecido. Gastei muitos minutos idealizando e imaginando a minha outra metade. Procurei um olhar que me conectava em todo lugar que eu ia, e, quando eu finalmente sinto que eu achei, a suposta alma que me completará me deixa esperando por 40 minutos e tem a coragem de dizer que estava cuidando da avó.

Avó essa que nem na cidade está.

Suspiro frustrado. Minhas mãos tremulas, meu sangue circulando de forma fria, alguns arrepios que vinham de forma inusitada, as lágrimas presas em meus olhos e meu coração extremamente apertado evidenciavam o quanto eu estava chateado, envergonhado, magoado e me sentindo patético.

Afogo meus sentimentos em um gole da bomba calórica em minha frente. O milk-shake que está mais quente a cada segundo, cria uma sensação confortante com a minha pele fria. Tento engolir o meu choro enquanto encaro a mistura de leite e sorvete em minha frente. Chorar em um lugar publico só reforçaria o quão ridículo eu sou. Sinto-me idiota por acreditar que Amanda me daria uma chance.

Sinto-me idiota por procurar algo há tanto tempo e perceber que é só uma idealização boba criada para que acreditem no amor.

— Almas gêmeas não existem Lin, é apenas mais um pedaço falso de esperança — sussurro para mim mesmo.

— Na verdade, existem.

Viro-me para a voz melódica e feminina que me respondera. Sentada ao meu lado há uma menina aparentemente baixa, já que sentada no banco ela é menor que eu. Suas madeixas negras perdem aquele ar pesado pela mecha violeta perdida entre os fios. Seu rosto era incrivelmente delicado, tão delicado que parecia ter saído de alguma obra de arte. Limpos de maquiagem, seus olhos cinzas, que me lembravam a cor de uma lua nova, me encaravam sem muita emoção, porém com um certa curiosidade.

— A idealização de alma gêmea, aquela que todo mundo acredita não faz o menor sentido. Eu, por exemplo, estou em uma metamorfose infinita e sem ponto de parada. Não sou a mesma de ontem e não vou ser a mesma amanhã. Como vou achar alguém que me complete todos os dias? Acredito que temos varias almas gêmeas. Almas que se entendem por um momento e talvez não para sempre.

— Faz um pouco de sentido — concluo após alguns segundos em silêncio que usei para refletir.

Amanda e eu fomos conectados por algum tempo. Não importa se foram por dias, horas, minutos ou segundos porque isso é um fato. Eu sinto isso e tenha quase certeza que ela também sinta.

— Meu nome é Serena — diz estendendo sua mão — Uma garota boba que levou um fora do cara mais bonito do ensino médio.

—Linfael — aperto sua mão — Um garoto patético que levou um fora da melhor amiga.

— Achei minha alma gêmea do momento.

E é com essa frase que toda a angústia, a vergonha, a frustração e a chateação começam a se dissipar no meio peito. Uma minúscula chance de esperança cresce em meu coração. Minha curiosidade se multiplica a cada segundo. A voz doce de serena pouco ao pouco me acalma

Build me up buttercup ainda se repete na junkbox antiga. O casal da mesa 8 ainda comemora algum aniversário de namoro. Esqueço do milk-shake de chocolate. Esqueço minha paixão por Amanda. Esqueço os meus sentimentos. Eu esqueço a música cafona. Esqueço as lagrimas que tentava segurar. Esqueço as minhas mãos tremulas. Esqueço de tudo em volta de mim.

Alma gêmea está ligada a uma conexão entre pessoas onde há sobretudo afinidade. Isto pode ser relacionado com a similaridade, o amor, romance, a intimidade, sexualidade, espiritualidade, compatibilidade e confiança.

Gastei muitos minutos idealizando e imaginando a minha outra metade, procurei um olhar que me conectava em todo lugar que eu ia. Por algum tempo esse alguém foi Amanda.

Mas agora é Serena.

E Amanhã eu já não sei.

É isso que me atrai.

Linfael: uma pessoa que procura e se sente atraído por aquilo que é novo e desconhecido.