Cura

82 17 28
                                    

AVALON

Quente, ensolarada e rotineira. A manhã seguia típica como todas as outras daquele verão. Avalon passara o café e se sentou na pequena cadeira de balanço do quintal, apreensiva. Encarava o verde da mata em busca de qualquer sinal de desistência, infrutiferamente. Sentiu por sua perna um focinho gelado, Cérbero deslizou o rosto sobre sua coxa clamando por carinho. Ele sentia o odor de sua aflição, ela sabia, e aquela era sua singular maneira de demonstrar apoio. Avalon sorriu docemente, dando-lhe o seu desejo.

_ Eu estou bem, juro _ Confirmou-a em afagos e com um sorriso gentil, porém rápido. Não tardou a voltar sua atenção a mata silenciosa. _ Droga!

O lobo a encarava com aquele olhar de gelo penetrante, e ela compreendia.

_ Sim, eu sei, o destino é dela, não posso interferir, não tenho controle e nem culpa. Mas Cérbero! _ A mulher jogou o corpo contra o encosto duro e vazado da cadeira porquanto massageava suas têmporas_ É claro como o dia, como ela não consegue enxergar?

Não confiava em Eliot, e estava convicta que ele próprio não confiava em si. Suscetível, instável e acomodado. O fato de saber que Escarlate havia partido, ainda em seu sono, para encontrá-lo a enfurecia.

Minha Loba, não interprete isso como uma fuga, jamais. Sei que não me apoiaria se soubesse o que estou preste a fazer, mas é necessário, confie em mim meu amor, preciso desse tempo para fechar esse ciclo, entender-me e tirar essa dúvida que paira sobre o meu peito, se não, nunca conquistarei verdadeiramente a paz. Não se preocupe comigo, sei me cuidar, aprendi com a melhor. Você sempre será o meu grande e verdadeiro amor. Amo-te com todo o meu coração, eternamente e sublimemente.

Raposinha

Relia a mensagem deixada sobre a cabeceira da cama. Ingênua e tola. Não aprendera a reconhecer o perigo nem quando ele gritava em sua face. Mantinha-se obcecada por ideais antigos, afeições antigas, aprisionada a um passado fatídico. Era frustrante. Avalon sabia exatamente onde ela se encontrava, mas lá não iria. Se tempo desejava, tempo teria. Há certos fatos que precisam ser vividos para serem validados.

FLASHBACK ON

ESCARLATE

Os cabelos cor de sangue acolhiam-se ao vento enquanto a jovem corria. Escarlate sorria com os pés se deslocando rápido sobre a grama fofa e molhada. Olhou para trás e reconheceu aqueles olhos azuis, diferentes, pois se encontravam vívidos e fortes, da maneira que nunca viu, mas sempre ouviu falar, sua mãe. Ela era linda. Pele alva. Cabelos suaves em tom caramelo. Sorriso largo, como o seu. Aproximou-se em uma risada gostosa, a puxou, e ambas correram juntas pelo campo aberto, infinito de possibilidades. Embolaram-se os pés e caíram sobre a relva macia.

_ Como eu queria te conhecer, queria que tivesse me dado uma chance de te fazer feliz_ Murmurou Escarlate enquanto tocava a sua pele, apreciava sua textura.

O cenário mudou. A mulher naquele momento semelhava-se mais com a que conhecia. Corpo seco e olhos sem vida, apática a fúria dos que estavam ao seu redor, indiferente a quem dera a vida. Suas mãos estavam amarradas por uma fita frouxa, mas ainda sim continuava imóvel porquanto rodeavam-na, xingando-a.

Burra

Fácil

Puta

Bruxa

Viu a si mesmo de longe, como em terceira pessoa, participando de todas aquelas injúrias. Via Eliot ao seu lado, de olhos inteiramente negros. O mundo parou. Encontrava-se cara a cara consigo mesma.

O Conto EscarlateOnde histórias criam vida. Descubra agora