CAPÍTULO 3

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  — Eu sei o que você está pensando, não precisa sentir pena de mim. – Ela suspira pesado. – Nasci com essa doença, e convivo com ela dês de então.
  — Sinto muito. É tudo que consigo dizer enquanto a encaro.
  — É por isso que eu não queria contar para ninguém sobre a minha doença, as pessoas irão me olhar exatamente como você está me olhando e o que eu menos suporto é que sintam pena de mim.
  — Estou tentando formular uma frase mas nada parece certo, nada que eu fale ira te confortar. Me mexo sobre a cadeira para afastar o desconforto.
  — Apenas não fale nada. – Elis se senta na cama e olha para mim. – Não podemos ser amigos, fique longe de mim.
  — O que? Por quê? Fico confuso.
  — Não quero que mais pessoas se sintam obrigados a cuidarem de mim além de meus pais, não suportaria ter mais pessoas a quem me despedir no dia que eu partir, é doloroso demais para ambas as partes. Vejo um vislumbre de lágrimas escorrerem por seu rosto pálido.
  — Mas e se eu quiser ser seu amigo e prometesse que jamais olharia com pena para você novamente? Me levanto enquanto espero uma resposta.
  — Você seria um idiota se fizesse isso, para que desperdiçar seu tempo, sua vida, com alguém que a qualquer momento pode morrer?
  — Você é uma pessoa especial, acredite se quiser mas em apenas dois dias já troquei mais palavras com você do que com qualquer outra pessoa do nosso colégio.
  — Você é uma pessoa estranha. Ela sorri para mim.
  — Eu sei. Retribuo o sorriso.
  — Olá Elis, como se sente hoje? Um médico entra na sala e nos interrompe.
  — Aconteceram algumas coisas no colégio hoje de novo, acabei ficando agitada e minha pressão abaixou e desmaiei na frente de todos.
  — Você continua com essa história de não contar para ninguém sobre sua doença? O homem a repreende enquanto mede sua pressão.
  — Não quero que seja que nem no meu antigo colégio, já conversamos sobre isso. Elis olha para mim, ela sabia que aquilo me intrigou.
  — Também já conversamos sobre você não passar por situações extremas, isso só faz seu quadro piorar. Os dois suspiram forte antes do médico abandonar a sala e nos deixar sozinhos novamente.
  — Como ele não me viu aqui? Pergunto me aproximando dela.
  — Ele te viu, apenas não se importou com sua presença. Ela dá de ombros.
  — O que aconteceu no seu antigo colégio?
  — Todos no meu colégio me tratavam da mesma forma que me tratam no Florence Maier, eles eram maus, aprontavam poucas e boas comigo. Um dia uma garota ouviu uma conversa da minha mãe com a diretora e a pauta principal dessa conversa era minha doença, de repente comecei a receber ajuda de todos e as garotas começaram a ser educadas comigo. Por um tempo pensei que elas haviam se arrependido e queriam ser minhas amigas mas um dia fui ao banheiro e ouvi uma conversa de um grupo de garotas falando que eu poderia morrer e todos poderiam culpa-las.
  — Essas garotas são piores do que Margot. Digo com raiva.
  — Foi ai que eu percebi que tudo o que elas faziam não era por arrependimento e sim para não sentirem culpa e nem serem incriminadas. Nesse dia eu me senti suja, não por mim, mas pela ação dessas pessoas, elas eram nojentas e horríveis.
  — E foi nesse momento que vocês mudaram de cidade? Ela acena com a cabeça em concordância.
  — Foi por isso que decidi que jamais contaria a ninguém sobre minha doença, prefiro ser desprezada e sofrer várias coisas do que me sentir suja novamente.
  — Você parece cansada. Digo tentando distrai-la de seus pensamentos.
  — E estou, nesse horário é normal me sentir exausta.
  — Deite-se. Digo e ela executa a minha sugestão.
  — Nos mudamos também pois. soubemos que esse era um dos melhores hospitais do pais e que talvez eu pudesse ter uma chance de viver. – Ela deita-se de lado. – Mas sei que isso é mentira.
Os olhos de Elis começaram a se fechar lentamente e por um segundo meu coração parou de bater, as batidas só se tornaram frequentes novamente quando vi que ela ainda respirava.
  Quando o pai de Elis chegou no hospital, Elis já tinha recebido alta. Eles me ofereceram uma carona e eu aceitei de bom grado. Me despedi de todos eles e fiquei em casa no final da tarde.
  No dia seguinte o assunto da escola era o que havia acontecido ontem. Quando cheguei recebi milhares de perguntas se Elis estava bem pois ela não foi para escola – todos hipócritas. Quando o sinal tocou sai da escola o mais rápido possível e corri até a casa de Elis, quando cheguei lá encontrei com Sherley – mãe de Elis – e ela disse para eu entrar para fazer companhia a sua filha enquanto ela dava uma pequena saída.
  — Oi. Digo ao bater na porta semiaberta e ver uma Elis assustada escondendo algo atrás de si.
  — O que você faz aqui?
  — Vim lhe fazer uma visita. Adentro o quarto mesmo sem convite. – O que é isso que você está escondendo?
  — O que? Isso? Ela me mostra um papel amarelo com vários enfeites ao redor de o que me parecia uma lista. – Não é nada demais.
  — Posso ver? Estendo a mão.
  — Não, é uma coisa de garota. Bufo. – Tudo bem, estou mentindo.
  — Isso é óbvio. Rio. – O que é isso realmente?
  — É uma lista. Ela diz enquanto pensa se me entrega ou não. – Uma lista de afazeres antes de morrer.
  — O que? Fico preocupado.
  — Você me prometeu que não iria me olhar com pena.
  — Você tem razão. Respiro fundo e tento apagar minha cara de preocupação.
  — Posso te contar uma coisa? Ela tentou esconder, mas pude ver sua preocupação em seus olhos.
  — Eu estou morrendo.
  — Mas isso não é novidade. Pela sua cara minhas palavras a ofenderam. – Desculpe, não quis ser grosseiro ou indiferente.
  — Você levou a sério o “não vou me preocupar” não é mesmo? Ela ri. – Está tudo bem, eu gosto de que você não finja que não tenho uma doença e que eu vou morrer em menos de um ano.
  — O que? Fico paralisado e sinto um peso enorme pelas minhas palavras anteriores.
  — Agora pouco minha mãe recebeu uma ligação do meu médico e ouvi a conversa deles atrás da porta.
  — E o que seu médico disse?
  — Há algum tempo atrás fiz uma série de exames e o resultado saiu hoje e não foram nada bons, pelo contrário, minha doença está piorando e minha estimava de vida é no máximo um ano.
  — Um ano? Repito tentando digerir a informação.
  — Minha mãe se segurou até agora pois fiz ela prometer que não choraria perto de mim, não suportaria ver ninguém sofrendo perto de mim, foi por isso que ela saiu, para poder chorar.
  — E como você se sente com tudo isso?
  — Não sei dizer ao certo e foi por isso que fiz essa lista. Elis finalmente me entrega o papel e eu leio toda a lista.
  — Você quer fazer tudo isso antes de... – não completo a frase.
  — Sim, quero fazer tudo isso antes de morrer.
  — Algumas dessas coisas são insanas. Dou um sorriso fraco.
  — Eu sei e é por isso que quero fazer, quero poder viver tudo o que não vivi até hoje.
  — E por que você está mostrando essa lista para mim?
  — Por que você foi a única pessoa que se preocupou comigo mesmo antes de saber sobre a minha doença, por que apesar de você saber que vou morrer em um ano ou menos você não me olha com pena, sei que você sente preocupação mas não demonstra, por que você é meu amigo. Elis limpa uma lagrima que escorreu por seu rosto. Apesar de seus olhos marejados de lágrimas ela sorri.
  — Sim, sou seu amigo. – Sorrio apesar da vontade enorme de chorar. – E é por isso que vou te ajudar você a cumprir todos os itens dessa lista.
Sem aviso prévio Elis se atira em meus braços e me abraça forte e foi nesse momento que eu soube que o que eu estava fazendo era o certo e que eu seria muito feliz, pelo menos  por um momento.

Um momento de felicidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora