III

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O som de passos a acorda e ao olhar para o relógio na parede do seu quarto, Flora constata que já passa do meio-dia, então resolve levantar-se e ao fazê-lo nota algo estranho, há lama pelo quarto e um par de sapatos arruinados perto da porta do banheiro. É quando as lembranças voltam, todas de uma vez, o baile, o beijo, a chuva e o corpo...

Ela corre para o banheiro e despeja todo o pouco conteúdo que tem em seu estômago, ficando com o amargo gosto de vômito em sua boca. Senta-se ao chão enquanto tenta organizar os próprios pensamentos e sente os efeitos da noite anterior, suas mãos ardem com os recentes arranhões e todo o seu corpo dói, principalmente por ter corrido tanto com aqueles saltos, junto ao vestido apertado e encharcado.

Flora olha ao redor em busca da vestimenta destruída, e outra prova da péssima noite que tivera. Como pudera esquecer-se de algo como aquilo? As lembranças de dez anos atrás sempre lhe foram vagas, mas havia um corpo, não poderia, não deveria esquecer-se disso, mesmo em tão tenra idade.

Muito tempo se passa, ou aparenta passar, com ela ainda sentada ao chão do banheiro antes que batidas na porta a tirem de dentro da própria cabeça. Ela manda a pessoa entrar e depara-se com André e duas xícaras de café nas mãos.

-Achei que gostaria um pouco depois de ontem - ele entra cautelosamente.

- Por favor - fala com uma cara de cansaço.

André entrega-lhe a xícara e observa enquanto ela bebe um pouco ainda sentada no chão, assim resolve juntar-se a ela.

- Então... quer falar sobre o que aconteceu? - Flora pensa um pouco, decidindo se deve ou não contar ao amigo.

- Talvez outra hora.

Eles ficam onde estão por um tempo, apenas a apreciar a presença mútua, antes de Clarisse entrar no quarto afirmando que mesmo tendo passado a noite em claro Flora deveria levantar pelo menos para comer, mas para quando a vê.

-Está tudo bem, querida?

Mesmo sabendo da tempestade, Clarisse não sabia que Flora estivera no meio da mesma, quando André descera para pegar café, ela supôs que trouxera a garota em segurança para casa. Mesmo tendo fobia a esses temporais que tendiam a acontecer no Vale do Itapira, Flora sempre acordava bem, sabendo que o mesmo acabara. Contudo, as olheiras em seus olhos, junto a algum sentimento muito ruim e a postura dela denunciavam que algo de muito errado tinha acontecido.

- Fui pega pela chuva - sussurra Flora.

O instinto maternal de Clarisse e todo o amor que sente por Flora a fazem abaixar-se e abraçá-la com força. O que a faz sentir-se segura, mas também a lembra do que há de errado, e tudo o que sente vontade é de chorar, e o faz.

Na tarde daquele mesmo dia, o inconfundível som acústico da dupla Anavitória pode ser ouvido acima dos outros sons da casa, principalmente na sala a qual está o celular dono deste toque. Quanto à proprietária do celular, ela sorri ao olhar o visor e reconhecer a foto e o nome de Fabiano, seu melhor amigo, na tela.

- Como vai minha mais querida amiga? Tão querida... - suspiro - que ignorou todas as minhas mensagens e ligações, será que fui esquecido? Trocado? Abandonado...?

- Deixa de ser dramático Fabian, você sabe que eu nunca te abandonaria, eu só... - suas palavras tornam-se um sussurro - não estou tendo um bom dia.

- O que aconteceu? O baile foi ruim?

- Choveu... muito, e eu me molhei um pouco – Fabiano hesita, como se com medo de que o que falar, possa machucar ainda mais a amiga.

Quando as Estrelas MorremOnde histórias criam vida. Descubra agora