Capítulo 6

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- Capítulo 6 -

Taissa

Engoli em seco e caminhei até ao escritório do Evan. Tinham passado alguns dias desde a tarde no parque, e desde aí tínhamos falado mais. No entanto, não tinha boas notícias para lhe dar.

Haveria, supostamente, uma reunião muito importante por causa da venda de uma coleção de jóias muito importante para a empresa, e tinha acabado de ser adiada para mais tarde.

– Sr. Peters?

– Sim. – Entrei no seu escritório após a sua ordem. – Vamos para a sala de conferências?

– Na verdade, senhor, a reunião foi adiada agora mesmo. – Ele franziu a testa. – A empresa canadiana teve alguns problemas informáticos e só poderão reunir ao fim da tarde.

Ele bufou, irritado, e passou as mãos na face.

– Que merda. – Murmurou e respirou fundo. – Que seja. A que horas?

– Ficou para as 18h:15m, senhor.

Ele confirmou com a cabeça, abrindo o computador à sua frente e começando a digitar furiosamente nas teclas.

– Precisarei que fiques até mais tarde então. Quero que assistas à reunião comigo.

– Sim, senhor. – Murmurei e permaneci no mesmo local, observando-o a mexer no computador.

– Porque ainda estás aqui? – Ele perguntou, olhando-me de soslaio, sem parar de digitar.

– É que... Senhor, eu já tinha tudo organizado para hoje, então se o senhor não tiver mais trabalho para mim hoje, ficarei com quase 4 horas livres. E eu estava a pensar se, talvez...

– Vai direta ao assunto. Precisas de sair? – Ele parou de digitar, fitando-me.

– Sim, senhor.

– Tudo bem. Desde que estejas aqui a horas. – Ele encolheu os ombros e eu sorri.

– Obrigada. – Virei-me para sair, mas fui interrompida por ele.

– Espera. – Ele acabou de digitar rapidamente e fechou o computador com força. Rico... – Que tal companhia?

Sorri ao ouvir aquilo. É, eu até que gostava de estar com ele.

(...)

– Então, resumindo, estás a guiar-me para um lar de terceira idade perto dos teus bairros? – Ele franziu o sobrolho enquanto conduzia. – Achei que quisesses passar as tuas livres num sítio mais produtivo tipo... Não sei. Algo mais... Sofisticado talvez.

– Aquele lar é muito importante para mim. – Expliquei. – Muitos idosos que lá estão foram abandonados pelas famílias, e eu estou longe da minha. De certa forma sinto que eles são parte da minha família também... – Expliquei e ele sorriu, permanecendo em silêncio.

(...)

Sorri, admirando a fachada degradada do edifício. Eu sentia-me em casa ali. O Evan, ao meu lado, retirou os óculos de sol para observar melhor aquilo, franzindo a testa num misto de confusão e surpresa. Acho que ele não esperava que aquilo tivesse um aspeto tão abandonado.

– Isto está muito...

– Degradado? – Completei-o e ele concordou. – Os funcionários fazem o que podem, e os idosos têm muita sorte por os terem aqui. É um sítio feio, admito. Mas a iniciativa é linda.

Antes que ele pudesse responder, caminhei para o interior das instalações. Os idosos estavam na sala grande a ver televisão e começaram a festejar mal entrei.

– A minha netinha! – A senhora Rose riu, pousando no seu colo as agulhas de tricô.

(...)

Evan

– Boa tarde. – Uma senhora de meia idade aproximou-se de mim com um sorriso no rosto. Pela bata branca que usava, deduzi que se tratava de uma funcionária dali. – Está com a Taissa?

– Boa tarde. Sim, estou. – Respondi simplesmente, observando a Taissa a conversar animadamente com as pessoas. Ela tinha jeito para cativar, e eles pareciam adora-la. – Sou o Evan.

– Anne. São namorados? – Ela sorriu e eu neguei rapidamente. Era estranho pensar sequer nisso. – Ah, que pena. Ela é uma pessoa excelente. Às vezes acho que o mundo não a merece.

Enquanto a senhora falava, fui observando o local. Aquilo estava de facto muito degradado. As paredes estavam a ficar negras e rachadas e a decoração era muito simples e já velha. Alguns sofás tinham arranhões, e as peças de madeira estavam bem danificadas. Além disso, o ambiente ali era gélido e triste.

– Ela vem cá muitas vezes? – Interroguei, embora soubesse a resposta.

– Sempre que pode. Ela tem um coração de ouro. Sabe, Evan, muitos idosos aqui foram simplesmente abandonados pela família. Eu e os meus colegas unimo-nos para lhes podermos dar um lar, e a Taissa encontrou-nos por acaso. Embora ela não tenha uma vida perfeita, sempre que pode faz pequenas doações para ajudar os idosos com o pagamento de consultas e medicamentos. Mas veja só, só a companhia dela já anima o local.

A Anne sorriu com adoração, observando a Taissa pintar as unhas a uma das senhoras. Eu sorri com a visão. Ela sentia-se mesmo bem ali.

– Eles parecem gostar dela.

– Eles adoram-na. Mas a dona Rose, aquela idosa ali. – Apontou para a senhora ao lado da Taissa, que tagarelava enquanto a Taissa pintava as unhas a outra senhora. – Ama-a. Ela chegou aqui perdida, veio diretamente do hospital. Os filhos abandonaram-na, e ela ficou sem visitas. Ela passava a noite a chamar pelos netos, e isso partia o coração a todos. Até que chegou a Taissa. Para a animar, ela disse que era neta dela, e desde aí que a dona Rose a trata mesmo como neta.

Fiquei pasmo a ouvir aquele relato. Era incrível como a bondade da Taissa era tão grande. Surpreendentemente, nunca me tinha apercebido do quanto a admirava.

– Hey, filho. – Um idosos chamou a minha atenção. – Senta-te aqui connosco um pouco, vamos jogar damas.

Taissa

– É o teu homem? – A dona Rose perguntou enquanto eu pintava as unhas da senhora Elisabeth.

– Ah, não vó. – Eu tratava a senhora Rose por avó desde que ela tinha chegado do hospital. Ela achava mesmo que eu era neta dela, e isso animava-a e deixava-me feliz.

– O senhor Anthony já o roubou. – A senhora Elisabeth riu. – Lá vai ele começar a contar as histórias da guerra enquanto obriga o rapaz a jogar.

Ergui o olhar, sorrindo ao ver o Evan rodeado pelos senhores. Eles tinham saudades de ter alguém com quem falar, e ver ali o Evan foi uma oportunidade para a maioria. Ri ao ver a careta de desconforto do Evan desaparecer à medida que conversava com os idosos. Era incrível ver esse lado bondoso dele.

We ain't AshesOnde histórias criam vida. Descubra agora