nessun dolore

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As ondas embalavam morosamente seus pés, escorrendo devagar pelos dedos até que se desfizessem em meio aos seixos e à areia acinzentada da praia. Calma e cristalina, Alberto podia enxergar quase completamente o seu reflexo sobre a água — via bem o bastante, é certo, para que percebesse as duas mãos que rodeavam seu abdômen por detrás, até que o envolveram completamente. Luca beijou-o na nuca, e descansou a cabeça sobre o ombro dele. "Quanto tempo", sussurrou-lhe à orelha, devagar. Em seu abraço, sentia eriçar os pelos das costas do rapaz.


No dia anterior, o menino chegara tarde em Portorosso, devido a um atraso nos trens de Gênova. Exausto pela viagem e pelos trâmites de mudar-se de volta à cidadezinha, Luca sequer pôde aproveitar a companhia de Alberto, senão para dormirem lado a lado, feito faziam no começo da juventude. Entre suspiros de carinho, lembraram-se da inocência com que acreditavam ser as estrelas um cardume luminoso. O tempo tornou-os maduros, mas não perderam nem seu amor um pelo outro nem pela paisagem equórea. E agora, lá estavam: uma vez mais, juntos no litoral.


Luca segurou Alberto mais fortemente; gostava de sentir o calor de sua pele bronzeada pelos sóis do mar aberto, seu cheiro salso carregado com a brisa da maré. Alberto juntou suas mãos às do rapaz, acariciando-a com o polegar, e encarou o horizonte infinito a frente. Todas as palavras que precisavam trocar, tinham-nas no silêncio dilapidado pelo vento que cantarolava na enseada. No ouvido de Alberto, a respiração de Luca parecia imitar o sopro das conchas, pois contavam uma história: a da odisseia por eles empreendida somente para que enfim pudessem estar ali de novo, em tranquilo repouso na orla lígure.


"Vorrei soltanto da te, che mi comprendesse e decidesse di ritornare qui da me [Só queria de você que me compreendesse, e decidisse retornar aqui para mim]", entoou Alberto uma velha versão italiana de uma canção brasileira. Afagava os cabelos ondulados de Luca, que sorria com o cafuné. "Ma non sono tornato qui, Alberto? [E eu não estou aqui, Alberto?]", desceu os dedos devagar pela bochecha de seu companheiro, deixando-o vermelho. Deitaram-se na água, flutuando, mudos, sob o céu contemplativo.


Quando Luca enfim convidou o companheiro para que saíssem — queria conversar, trocar casquinhas de sorvete, redescobrir o lar —, os instantes e a eternidade confundiam-se. Alberto assentiu ao pedido e, voltando à costa, pôs a mão sobre o ombro do jovem, puxando-o carinhosamente para mais perto de si. Porque continuasse o maior entre os dois, beijou-lhe na cabeça. "Non mi manchi più... [Já não sinto mais tua falta...] Chega de saudade."

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