II | Tempestade

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Corri as mãos pelos meus cachos bagunçados, desfazendo os nós com os dedos, desejando ter um pente para desembaraçá-los decentemente. Quando formulei meu plano de fuga, ainda em terra, decidi cortar as longas mechas de meu cabelo escuro e volumoso em cachos na altura do queixo, de modo a chamar menos atenção. Ainda era estranho passar os dedos pelos fios e senti-los tão pequenos.

Eu fingia ser um jovem rapaz há quase duas semanas e imaginava que, em algum momento, as coisas ficariam mais fáceis. Desejava fervorosamente que eu pudesse me acostumar com o papel que representava, mas agir como um homem era mais difícil do que eu havia antecipado. Vinte e dois anos sendo educada para agir e pensar como uma "dama respeitável" não eram fáceis de simplesmente ignorar.

Os homens naquele navio comportavam-se de maneiras que eu nunca havia visto em toda minha vida. Eles fediam feito porcos, brigavam como touros em época de cio, bebiam como esponjas mergulhadas num balde e conversavam exclusivamente por meio de palavrões e ofensas. Quando uma briga estourava, em geral envolvendo apostas e trapaças, o imediato ou o próprio capitão precisavam intervir antes que a coisa terminasse em morte.

Muitas vezes, a água que eu usava para limpar o convés acabava vermelha do sangue derramado em desavenças.

Logo nos primeiros dias de viagem, Bailey May me presenteara com um punhal pequeno e fino de lâmina enferrujada.

— Dê um jeito nessa faquinha e mantenha-a sempre com você — ele aconselhou, exibindo a própria coleção de facas que guardava em lugares diversos de suas roupas. — Nunca se sabe quando vai precisar de um espeto para se defender ou palitar os dentes.

Saquei o punhal do cinto e avaliei meu reflexo no metal brilhante. Eu passara dias lixando a ferrugem de sua superfície e afiando a lâmina; agora, ela seria capaz de cortar uma folha de papel ao meio sem grande esforço. Eu não tivera que me defender até então, mas não era tola a ponto de acreditar que isso duraria por muito tempo. Estivera evitando conflitos durante todos aqueles dias, mas cedo ou tarde não conseguiria mais me esconder pelos cantos. Noah Urrea e Bailey May não podiam me defender para sempre.

— Guarde isso, idiota.

Quase deixei a arma cair no mar com o susto. Virei-me rapidamente, encontrando os olhos azuis do capitão Beauchamp encarando-me com irritação.

— Ficar exibindo seu punhal em plena luz do dia é um convite para perder todos os dentes. Se quer mesmo botar medo em alguém, precisa de mais que um brinquedinho como esse.

— D-desculpe, senhor — murmurei, atrapalhada, enquanto tentava esconder o punhal novamente sob meu casaco. O capitão pareceu ainda mais irritado, se é que isso era possível.

— Não se desculpe — resmungou de maneira ríspida. — Você é fraco e quebradiço. Se continuar agindo feito um frouxo, será importunado pelo resto da vida.

Uma dama a bordoOnde histórias criam vida. Descubra agora