Nenhuma das cinco armadilhas que tínhamos montado no riacho durante a manhã havia funcionado. Eu não era muito boa com armadilhas e pesca, mas Bailey May afirmara que minha tentativa fora razoável. Infelizmente, os peixes naquela ilha pareciam ser espertos ou cautelosos demais para cair nas nossas arapucas. Talvez eu devesse esperar mais um dia antes de me dar por vencida, pensei, verificando se a isca ainda estava firme no anzol.
Ergui os olhos para o horizonte, afastando os cabelos do rosto. Do ponto em que as armadilhas foram engatilhadas podia-se enxergar o caminho que levava até a gruta no topo da colina; àquela distância seria impossível identificar a entrada, encoberta por videiras que formavam uma fachada aparentemente impenetrável. Eu descobrira aquele lugar por acaso, enquanto procurava por frutas na floresta, e havia mantido segredo desde então. Os homens não pareciam saber de sua existência.
No interior da caverna havia um lago tão belo que parecia um santuário. As paredes da gruta eram forradas por cristais brancos, azuis e violeta, cujas cores suaves se refletiam na água quando a luz da lua entrava por uma abertura no topo da caverna, criando a ilusão de que o lago abrigava nuvens coloridas.
Na noite anterior, durante meu turno de guarda, aproveitei o momento em que todos dormiam para escapar do acampamento e subir até meu lago secreto. Escondi as roupas atrás de uma pedra e entrei na água. Eu esperava que a água estivesse gelada, mas me surpreendi ao sentir a temperatura morna que envolveu meu corpo; pedrinhas redondas e lisas faziam cócegas em meus pés conforme eu avançava até estar submersa pela cintura, iluminada pelos reflexos prateados e azuis que dançavam em minha pele. Nadar naquele lago era como ser banhada pelo céu noturno.
Senti todos os pequenos ferimentos em minha pele lentamente abrandarem, como se tivessem se dissipado no líquido cristalino. O inchaço em meu braço pareceu diminuir e a dor praticamente sumiu. A sensação de estar imersa era maravilhosa, mas eu não podia me demorar, correndo o risco de que alguém notasse minha ausência. Voltei à superfície e passei a desembaraçar meus cabelos, tomando cuidado para não danificar os cachinhos macios.
Pela primeira vez em muitos anos, senti vontade de cantar.
Quando era pequena, eu costumava cantar o tempo todo. Minha mãe e eu morávamos ao lado de uma taverna, onde o piano tocava noite adentro, cantoras animavam a plateia e dançarinas erguiam suas pernas para o alto em troca de moedas. Aprendi muitas canções populares nessa época, músicas sobre marinheiros perdidos no mar, belas sereias, navios e tempestades. Tentei lembrar da letra de uma dessas músicas, imaginando se ainda saberia cantá-la. Minha voz soou límpida e clara, reverberando nas paredes da gruta como em uma catedral. Cantei como fazia em nosso pequeno apartamento ao lado da taverna, de olhos fechados com um sorriso no rosto.
Tive sorte de não encontrar ninguém pelo caminho ao retornar. Aparentemente, minha falta não fora percebida, pois os piratas ainda dormiam. Derriko, que devia vigiar os botes, parecia atarefado enquanto trocava carícias e beijos sussurrados com outro homem que não reconheci. Cenas como aquela eram normais entre a tripulação; homens confinados em um navio isolado durante meses precisavam encontrar alívio nos braços uns dos outros, e eu frequentemente preferia dormir ao ar livre para evitar ouvir os sons que vinham de algum casal durante a noite.
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Uma dama a bordo
Romance{«𝑩𝐞𝐚𝐮𝐚𝒏𝒚»} Any Gabrielly está fugindo da justiça de seu país por um crime que não cometeu. Desesperada e sem outras alternativas, a garota decide disfarçar-se de homem para embarcar em um navio pirata e deixar para trás uma história de mi...