Eu sinto medo... E sinto sua falta

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— O que está fazendo aqui? - Repetiu. Fica-lo encarando não o faria ir embora também. Era melhor que lhe desse logo o que queria e depois se livrasse dele.

Mas ele ainda não respondeu. Sentiu os olhos escuros percorrem cada linha do seu corpo. Cada espaço de pele exposta e parando no tecido negro da camisola. Coincidentemente, aquela preta era a favorita de Levi. Era uma peça um tanto simples, um cetim de alças finas, que descia até a metade das coxas e com um decote em V nada profundo. Era uma peça simples até demais. Mas Levi gostava. Ele sempre dizia que você ficava linda nela. Você não a usava muito quando ainda namoravam, apenas em ocasiões especiais para agrada-lo. Mas depois que terminaram, você passou a usá-la mais vezes, agora que não teria nenhuma serventia a mais que valesse a pena preservar a peça.

— Zeke me ligou. - Ele respondeu, finalmente.

— É claro que ligou! - Seu tom esbanja a mais pura ironia. — Até porque Zeke é a porra de um fofoqueiro.

— Zeke é a porra de seu quase-irmão-mais-velho! Que se preocupa para caralho com você, já que você mesma não faz isso! - Levi o fez. Ele usou aquele tom de voz. Aquele que lhe fazia se retrair e que remexia uma parte de si. O tom que ele sabia que a fazia se calar e ouvi-lo. Homem insuportável. Era o único que sabia te tornar tão acanhada quando queria. A sua voz mais firme e rouca que o convencional, beirando a irritação e carregando a mais pura autonomia. Ele tinha você a ouvidos agora. — Você foi ver Eren, não foi? - Você não fala nada. — Responde porra!

— Por que pergunta algo que você já tem a resposta? - Ele lhe encara incrédulo, aguardando que você o respondesse devidamente. Você suspira em impaciência. — Você sabe que sim!

— Ah, ótimo! Agora você vai começar a usar as merdas que Eren usa! Maravilhoso! - Ele enfia os dedos das mãos em meio aos fios negros, os desgrenhando mais ainda e depois os arrastando para trás, arrumando-os. — Aquele pirralho tem sorte de Isabel simpatizar tanto com ele a ponto de tratá-lo como um filho, pois se não, eu juro, iria até os subúrbios apenas para lhe dar uma boa surra para ver se toma algum juízo...

— Eren é literalmente o meu melhor amigo! Não passou pela sua cabeça que posso ter ido simplesmente vê-lo? - Você finalmente desgruda na parede do corredor e adentra a sala, com uma irritação nítida. — Ou agora eu também não posso mais sentir saudades?

Ele suspira alto e solta uma risada sarcástica. Mantendo aquele sorriso presunçoso no rosto. Ele estava lhe irritando tanto.

— Faça-me mil favores, [Nome]... Pare de agir como se eu não lhe conhecesse desde o berço!

— Deve ser por que não me conhece?

— É, pode não ser. Mas você ainda tinha dentes de leite. - Você teve que se segurar um pouco para não sorrir repentinamente por conta da memória.

— O que? Eu não tinha não... - Sim. Você tinha. Até porque você era praticamente uma criança quando conheceu Levi, mas negava-se a concordar com o homem tão facilmente.

— Não? E quem foi que arrancou seu último dente de leite? - A expressão de Levi se suavizara agora. Um esboço de sorriso assumiu os lábios finos. Ele também estava segurando um pouco para não sorrir com a lembrança.

— Você. Num banheiro de shopping e com uma brutalidade dos infernos. Fiquei com a boca inchada por uma semana... 

A memória daquela tarde de verão lhe invadiu a mente. Eram férias escolares e Zeke tinha que carregar o irmão, Eren, para todo lugar que fosse, afinal os pais trabalhavam o dia todo e o garoto era muito novo para ficar sozinho. Acontece que seu pai também trabalhava então você costumava ficar na casa dos Yeager, seus vizinhos, consequentemente sendo arrastada junto com Zeke. Você e Eren tinham apenas doze anos, mas sempre tinham que ficar no meio da turma dos amigos de Zeke e fora aí que conheceu Levi.  

Levi se levanta e caminha até onde você estava. Colocando uma mão em cada lado do seu rosto e o inclinando um pouco para que você o olhasse nos olhos. As pontas dos polegares deslizaram suavemente por suas maçãs, num breve carinho.

— [Nome]... - Sua voz agora já havia retomado o natural. Estava um pouco mais baixa, como se estivesse tomando cuidado para não lhe assustar. — Você se lembra do porquê eu arranquei seu dente?

— Por que você me odiava? - Você sorriu.

— Isso também.

— Levi?

— Ah, fala sério? - Solta seu rosto brevemente, apenas para lhe dar leves tapinhas nos ombros. — Eu era adolescente e queria poder fazer merda com meus amigos, mas ai sempre Zeke aparecia com o irmão mais novo e a vizinha e a gente tinha que ficar de babá para pirralho. - Ele também sorria agora.

— Babá? Vocês nos compravam aqueles chocolates baratos e nos abandonavam no canto da pista de skate ou debaixo da árvore do estacionamento do shopping! Isso quando não falavam um monte de sujeiras perto de mim e do Eren, poluindo nossas mentes puras.

— Tudo bem, tudo bem... - Vocês ainda mantêm o sorriso um para o outro. Não dura muito. Logo Levi volta a assumir sua expressão séria, agora séria até de mais, fazendo com que seu sorriso recue também. Ele volta a segurar seu rosto. — Mas, falando sério, você se lembra por que fui eu a arrancar?

— Não exatamente... Tem muito tempo. Só me lembro de você me puxando até o banheiro masculino e Farlan guardando a porta. Depois você me segurou e arrancou com um lenço úmido. - Você faz uma careta. — Doeu...

— Eu fiz porque você estava com medo.

— Estava?

— Estava. Era seu último dente e você não queria arrancá-lo. Dizia que sua mãe que havia arrancado todos os outros e que agora, sem ela, estava com medo de fazer sozinha...

— Eu não lembrava-me disso...

— Pois é. Mas eu me lembro. - Seus olhos vacilam um pouco, indo para longe dos de Levi, focando em qualquer objeto aleatório da sala. — E você se lembra quando aquelas meninas ameaçaram te bater, no seu primeiro ano do ensino médio?

— Isso eu me lembro. - O sorriso retornou aos seus lábios, porém, sem um pingo de graça. — Eu realmente estava com medo delas.

— Quem foi que deixou a faculdade mais cedo só para ir até sua escola mostrar para elas que você não estava sozinha?

— Você... - Sua voz soou fraca.

— Com quem você passou madrugadas inteiras estudando matemática, já que estava morrendo de medo do vestibular e quase desistindo de tentar a prova?

— Você... - A lembrança de Levi invadindo sua janela quase todas as noites e a obrigando a fazer cálculos até amanhecer.

— E quem te deu seu primeiro beijo, porque um garoto da faculdade queria lhe levar para sair, mas você estava com medo por nunca ter beijado ninguém?

— Eu não vou responder isso.

— Diga quem foi!

— Você, Levi. Você - Agora você se permitiu dar-lhe uma gargalhada baixa. — E no fim, eu nem saí com ele porque acabei percebendo que gostava era... De você...

Ele parou de falar. Manteve as orbes escuras focadas nas suas, mesmo que você estivesse desviando bastante o olhar por conta da timidez. Ele a encarou por longos segundos, como se estivesse tentando lê-la. Como se buscasse resposta.

— Não importa o que acontecesse, eu sempre estive aqui quando você teve medo... Não foi?

— Sim...

— Você está com medo agora, não está, minha garota?  

O que eu faço com a saudade? - Levi x LeitoraOnde histórias criam vida. Descubra agora