l - Tom Willians

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Os pés tocavam firme o chão, em um passo ritmado e sem destino, protegidos pelo tênis comum que usava. Apenas caminhava. O céu estava nublado, revelando que em breve choveria. Casas de variadas cores e estilos antes abertas e iluminadas, agora se fechavam, preparadas para a chuva de inverno que chegaria.

Ekhein, sua cidade, agora estava calma, apesar da intranquilidade que o tempo trazia. As ruas, enfeitadas pelas árvores que seguiam seus trajetos, eram preenchidas apenas pelas folhas que caíam com o auxílio do vento. Para si, estava perfeito para escrever. Isso se não fosse pela falta de seu caderno e de seu lápis, que esquecera em casa. Seus olhos avelã reviraram-se, incomodados pelo esquecimento. 

Olhou para o céu, que, em seu ponto de vista, estava belo e místico, enfeitado pelos raios silenciosos que riscavam o céu por detrás das nuvens. Sua mente parecia carregada de ideias, mas os seus dedos, descanardos pela falta de escrita. Não se sentia um escritor, mas sim um pensante. Esperava que sua atual ideia se tornasse por fim um livro. Precisava da essência de se sentir outra vez um escritor.  Ao fundo, o sino da igreja tocou, avisando do fim da tarde e o começo da missa que embreve, iniciaria, o que o fez lembrar que seria um perfeito cenário para seu livro.

 Cenas de guerras embrulharam sua mente e as mais variadas espécies de vampiros lutavam entre si, enquanto humanos tentavam a todo custo lutar pela sua sobrevivência. Criaturas de diversas formas eram rasgadas sem piedades pelos mais cruéis vampiros, competindo pelo pouco alimento que ainda restava.

"Mas afinal, vampiros são realmente apenas meras ficções?" Perguntou-se, com o fio de esperança enrolando-se sobre si, sufocando-o pelo ar da expectativa. 

- Pensar é uma dádiva da vida, meu jovem Tom Willians... Use isso a seu favor! - A voz veio atrás de si, rouca e baixa, enquanto seu braço era agarrado por mãos enrrugadas e esqueléticas. Apesar de trêmulas, eram firmes. Pelo seu tom, podia-se notar que o seu cálice da experiencia estava cheio. Virou-se, notando por fim, a ossada de seu rosto que destacava-se em sua bochecha. Em seus lábios finos e secos era desenhado um sorriso torturoso, carregado de sarcasmo. As sobrancelhas, brancas e grossas acompanhavam a barba de mesma cor que quase alcançava a altura de seu ombro. Os pés, tão magros quanto o restante do corpo estavam descalços, sujos como as roupas que lhe cobria. - Tenha medo das verdades que o mundo oculta...

- E o senhor, é?... - Sabia, não fora educado. Na verdade, pouco se importara com isso. Se sentia incomodado. 

- Mac Drosch, meu bom rapaz... - pausou a fala por breves segundos para tossir, quase voltando a falar enquanto ainda tossia. Sua saúda era frágil, como o restante de seu corpo. - Meu nome atormentará seu sono por muito tempo... 

Se deu conta que o fato que os moradores da cidade contavam, eram verdadeiros. Realmente, o velho louco existia e agora, atormentava-o. 

- Se você ficá-lo repetindo, sim.

- Não, meu jovem rapaz... - A tosse invadiu a frase outra vez. Sobre seu corpo, um velho manto sujo e surrado o cobria. As mãos enrugadas que antes insistiam em segurá-lo o soltou, adentrando o tecido, retirando de seu interior um caderno lacrado pelo elástico manchado, que mantinha suas folhas avulsas em segurança mesmo com o passar dos anos. O cheiro de folhas velhas e sujas era forte, junto com a curiosidade. O caderno foi estendido em sua direção. - A verdade está mais nítida do que pode imaginar... 

As falas do homem eram confusas, questionáveis. Não era atoa que o chamavam de louco. As mãos trêmulas lhe estenderam o objeto e a vontade de recusá-lo era quase nula. Infelizmente, tinha curiosidade por objetos e histórias antigas. 

- Não abra se tiver medo de pensar... - prosseguiu, se afastando enquanto ainda dizia. Se perguntou por qual razão teria medo de pensar, se era um escritor. Os dedos esqueléticos apontavam para si, acusando-o silenciosamente, acompanhados dos olhos negros arregalados, de forma que paressessem que um era maior que o outro. Molhou os lábios enrugados e secos, trêmulos como o restante de seu corpo. - Não abra... - deu uma pausa para outra vez tossir, enquanto a voz diminuia. - Não desperte o desconhecido... 

Quase não ouviu suas últimas palavras, o que, de fato, foi estranho. O velho ainda tossindo se afastou sem explicações, desaparecendo de sua vista de forma tão rápida quanto aparecera. Olhou para o caderno em suas mãos, se perguntando por qual razão estava com ele. Seus olhos outra vez levantaram-se, fitando o trajeto que Mac Drosch segundos atrás, fizera. Sua mente pareceu embrulhar, enquanto tentava se lembrar de toda a conversa que acabara de ter. Sentia-se tentado a descobrir os segredos que o caderno poderia lhe oferecer. Arregalou os olhos, se dando conta de algo que antes passara despercebido. 

"Como ele sabia meu nome?" Sua mente quase gritou. Aquilo, realmente era louco. 

PostumusWhere stories live. Discover now