A sola de seu coturno tocava de forma sorrateira e silenciosa o tronco da árvore do parque de Cromwell. Estava agachado, oculto entre as folhagens das árvores. A noite já havia chego, cobrindo de escuridão e tormento a Ilha de Postumus.
Detrás dos muros entre musgos que protegiam o parque, seus olhos ônix estudavam com atenção cada passo dado pela garota de belas pernas que cruzava a rua abandonada do parque. Se perguntava se a garota já procurava por sua morte. Sentia o cheiro do medo escapar pelo suor frio que escorria por sua pele e em seguida os olhos azuis encararem quase sem vida a criatura humanizada. Oculto entre a escuridão e suas roupas negras, Sharles calmamente dava um passo atrás do outro em busca de sua vítima.
Seus olhos, tão negros quanto os seus agora fitavam com desejo o corpo da vítima em seus braços. Seus dentes rasgaram sua pele frágil, invadindo a corrente sanguínia e sugando de sua essência. Seu corpo foi invadido por aquela vivencidade que o sabor do sangue lhe trazia, circulando por seu corpo e cérebro, lhe permitindo sentir mais uma vez seu coração bater. A dor da vida lhe invadindo era surpreendente e viciante, atacando sua mente como uma droga, alucinando-o. Segundo depois, o corpo foi largado sem vida sobre o chão da rua que levava ao parque, palco de almas perdidas. Seus olhos estreitaram-se. Sharles era um Malkian, uma das raças mais poderosas e procuradas.
O que mais o intrigava, eram os passos que o vampiro dava, sigelos e cuidadosos. Tinha a sensação de que algo grande e poderoso estava sendo planejado pelo culpado de sua morte. E certamente, fazia parte disso.
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"Há um pouco mais de vinte anos atrás, o antigo parque de Cromwell era o centro da cidade. Suas grandes árvores, antes tão vivas, circulavam um grande lago de águas transparentes carregadas de peixes das mais variadas cores e espécies. Suas flores exóticas deixavam o parque com uma beleza natural e apaixonante. O parque era muito frequentado e apreciado por seus visitantes. Os adolescentes decidiram dar uma festa naquela noite, explorando suas lendas mais perigosas.
Cromwell não era uma cidade grande, mas o antigo parque sim. O parque era formado por trilhas e labirintos que atravessavam as árvores diversas vezes, se encontrando, trilhando caminhos falsos entre si. Carroças eram usadas para caminhadas calmas pelas trilhas. Cavalos bem cuidados podiam ser usados para cavalgá-los pelo parque.
Nathan Hoffman estava presente na festa naquela noite. Completaria seus vinte e quatro anos de idade. Dono de lábios finos e olhos tão intensos quanto a cor do mais puro mel. Seus cabelos eram negros como a mais sombria noite e isso só o tornava cada vez mais desejado entre as mulheres."
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"Uma dose de tequila barata fora passada entre mãos pelos amigos até parar na de Michele, que deu um gole rápido, o que fez com que quase vomitasse. Sentia o corpo descoordenado e fraco. Passou os olhos pelo local sem saber o que ao certo procurava, parando sua atenção em Nathan. Um choque percorreu seu corpo. O desejou. Afastou-se dos amigos e caminhou em direção a Nathe - fora o apelido que lhe dera.
Seu andar era sensual. Seu vestido curto marcava seus seios e pernas torneadas. Passou a mão pela barriga do outro assim que passara pelo mesmo, o fitando de forma provocativa, enquanto colava seu corpo ao dele. Nathe estava desatento, mas sorriu assim que a fitou, passando suas mãos pela cintura dela, a puxando para si, enquanto depositava beijos por seu pescoço. Michele estremeceu. Não acreditava que estava ali. O beijou, passando a língua sedutoramente por seus lábios. Seu corpo foi apalpado por mãos firmes. Ele estava sedendo. Puxou-o para algum canto mais afastado. Precisava de privacidade.
Em um canto mais afastado da festa, o casal era fitado de perto por olhos insaciáveis. Era Sharles. Aguardava sua presa com paciência. Seu corpo vibrou de ansiedade.
Com passos silenciosos como o rastejar de uma serpente, esgueirou-se para mais perto. Seu plano havia mudado. Com um inesperado movimento quebrou o pescoço de Michele, que nem se dera conta da dor de sua morte.
O corpo caiu sem vida sobre Nathe, que com desespero o jogou ao chão, enquanto que com habilidade sacava sua arma. A ação foi impensada e o coração em seu peito batendo descompassado provava isso, o que só causava mais desejo em Sharles por sua morte. A risada estrondosa do assassino ecoou, causando-lhe uma estranha pulsação em seu cérebro.
Os passos de Sharles agora eram lentos e altos. Era observado com atenção por Nathe, o que fez seu corpo vibrar. Com uma velocidade sobrenatural agarrou a arma do outro e o prensou contra a árvore, enquanto sua outra mão habilmente prendia a mão do outro sobre sua cabeça.
- Shii... - Emitiu um som baixo com sua garganta. - ... Vai ser rápido... - A voz era rouca e assustadora.
Nathe gelou. Seus olhos estavam espantosamente arregalados enquanto suas mãos tentavam desesperadamente se soltar da força sobrenatural que o prendia. Seu pescoço foi rasgado por dentes afiados. Sentiu seu coração falhar. Era como o veneno de uma Naja. Seu corpo ardia, causando-lhe desconforto.
- Nos vemos em breve... - pronunciou Sharles pesadamente, enquanto desaparecia, parecendo-se desmanchar pelo cenário do parque.
A voz falha e rouca ecoou pelo local, invadindo a mente de Nathe, enquanto seu corpo agora caído se contorcia. Seu sangue fervia e evaporava-se dentro de si. A dor era intensa. Contorcia-se. Suas veias saltaram por seu corpo e, por fim, sua mente escureceu."
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Postumus
Vampiri"Há certos boatos e acontecimentos nos quais deixamos passar despercebidos. Certas realidades que com o passar dos anos, transformamos-as em lendas e as jogamos no mar do esquecimento." A ilha de Postumus estava formada. As poucas vidas que ali rest...