Capítulo 5

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Assim que chego à boate, depois de furar alguns faróis vermelhos e pilotar no limite de velocidade, tive que estacionar a moto duas quadras de distância da boate por causa da grande quantidade de veículos já estacionados.

Devido ao horário (quase duas da manhã) não encontrei fila na entrada, assim pus os óculos do meu pai, que com um pouco de sorte iria disfarçar o estado dos meus olhos, afinal os seguranças poderiam pensar que estou drogado, ou algo do tipo e poderiam não me deixar entrar. O Rei já foi barrado em uma balada como essa pela aparência dos olhos, embora provavelmente ele estivesse realmente sob efeito de maconha ou algo do tipo.

Pago a entrada e recebo um carimbo roxo nas costas da minha mão com o logotipo da boate. Quando entro vejo um mar de pessoas dançando sobre luzes estroboscópicas, ao som de alguma música eletrônica tocando tão alto que tive a sensação de que minha alma abandonou meu corpo.

Eu já vim nesse lugar em duas ocasiões e fiquei como todas estas pessoas que estão aqui nesta noite: bêbado, dançando e beijando qualquer boca que aceitasse a minha. Mas hoje não estou no clima de diversão e tenho um garoto precisando de resgate.

Enquanto me esgueiro por entre as pessoas, esbarrando e empurrando corpos, fui entendendo o porquê de o Charles querer tão desesperadamente sair daqui. Um lugar cheio de seres humanos em atrito inevitável uns com os outros, fedendo a suor e cerveja, uma música com o volume tão alto que chega a doer os tímpanos e amigos que te deixam sozinho, não combinam com alguém que não vê nada a sua volta e depende principalmente da audição, tato e olfato para se orientar.

Assim que chego ao banheiro masculino, entro e olho em volta procurando por Charles. Esse é um banheiro coletivo masculino comum fedendo a mijo, com cinco cabines do lado direito (onde três deles estão com as portas fechadas) e com cinco mictórios na parede esquerda (onde quatro deles estão sendo usados). Na parede do fundo, abaixo de uma pequena janela e entre as paredes dos mictórios e a das cabines, escorado na parede, vejo Charles.

Acabo ficando paralisado olhando o garoto por um minuto inteiro sem me mover, apenas observando a cena. Ele veste uma camiseta vermelho-sangue colada ao corpo, uma calça jeans preta com um rasgo em um dos joelhos, o mesmo tênis que o vi usando no Shopping no domingo, seu cabelo está perfeitamente penteado com um pequeno topete alinhado. Mas o que me fez congelar no lugar foi observar a situação em si: escorado na parede descansando um dos pés com a ponta do tênis apoiado no chão, mãos nos bolsos da calça, ombros caídos, cabeça baixa e com a musculatura do maxilar se contraindo. Ele está vestido para essa boate, mas não pertence a esse lugar. Outra coisa que percebo são seus olhos fechados, sem estarem escondidos pelas lentes escuras de seus óculos. Ele parece tão indefeso que meu coração bate irregularmente com essa visão.

Com um suspiro de pesar, atravesso o banheiro e vou até ele.

– Demorei? – pergunto ainda sentindo minha voz rouca, mas não tanto quanto antes.

– Marcus? – diz ele se voltando na minha direção, mas mantendo os olhos fechados.

– Sim. Vem, vamos sair daqui.

Sem dizer mais nada, seguro sua mão entrelaçando seus dedos úmidos de suor nos meus e começo a guiar ele puxando-o. Depois de sair do banheiro começamos a cruzar o mar de corpos dançantes que parecem ter como objetivo atravessar nosso caminho.

Em certo momento um casal de jovens se divertindo ao som de um remix de alguma música famosa, acabam esbarrando tão forte no Charles que o garoto quase foi jogado ao chão, mas consegui manter seu equilíbrio firmando ainda mais nossas mãos. Em outro momento eu teria ido tirar satisfação com os idiotas e buscar briga com o sangue fervendo, mas mantenho o aperto firme das mãos o puxo para ficar mais próximo do meu corpo, onde eu abro caminho entre as pessoas como um limpa-neves no meio da multidão.

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