I - Apartamento 184

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Acho que pode ser normal as pessoas se sentirem tristes, terem suas mágoas, chorarem em silêncio. Eu sempre fiz isso. Na verdade, muitos dos meus dias recentemente têm se resumido a isso.
Eu simplesmente pensei em acabar com tudo de uma vez por todas. A cada degrau da escada que eu subia indo até o terraço do prédio, imaginava como as coisas poderiam melhorar, como tudo ficaria bem se eu não estivesse ali.
Eu senti o vento frio no meu rosto ao abrir aquela porta corta-fogo. Dei alguns passos à frente e pude ver a cidade inteira. Minha grande New York. O céu estava escuro, as ruas iluminadas. O meu coração acelerou, meus olhos se encheram de lágrimas e eu não sei explicar o motivo de um sorriso ter aparecido em meu rosto.
A cada passo que eu dava até a beirada, me sentia com mais medo. Talvez 'apavorado' fosse uma palavra melhor para descrever. Realmente eu senti como se eu quisesse fazer aquilo, mas eu tinha medo do resultado.
Eu coloquei as mãos naquela grade baixa de proteção. Olhei para baixo e vi os carros passando, percebi que era um caminho sem volta, eu tinha que tomar uma decisão, precisava decidir o rumo que daria à minha vida.
Tenho a impressão de que passei uns dez minutos ali apenas olhando para baixo, meu corpo estava travado, eu não conseguia voltar e nem seguir em frente. Minha mente parou por um tempo e eu conseguia apenas chorar pensando em tudo que já passei.
Quando realmente respirei fundo, consegui tomar uma decisão. O melhor para mim seria acabar de uma vez por todas com aquilo. Coloquei uma das minhas pernas para o outro lado e senti meu corpo estremecer com o puro medo que tomou conta de mim.

–Ei! O que tá fazendo aí? Ficou louco?

Eu ouvi aquela voz e olhei para trás, vi um rapaz ali sentado no chão com as costas apoiadas em um pequeno muro. Ele tinha um cigarro em uma das mãos, me olhava como se realmente eu fosse louco.
Ele se levantou, jogou o cigarro fora e foi andando até onde eu estava.

–Sai daí, não sei porque tá querendo fazer isso mas não vale a pena.. vai por mim.

Ele disse se apoiando na grade e olhando a cidade, assim como eu estava antes.
Fiquei em silêncio, o olhando ali, ainda com uma das pernas para fora da grade.

–Tenho certeza que tirar sua vida pode fazer com que você não tenha mais problemas, mas vai dar a outras pessoas o trabalho de lidar com isso.

–Não tenho nem a quem dar esse problema, então acho que tá tudo bem.

Ele me olhou, me pegou pelo braço e me tirou dali de onde estava.

–Para com isso. Já disse que não vale a pena. Vai pra sua casa, tome um banho e durma, é o melhor que você pode fazer a essa hora.

O olhei ali, passei as mãos no rosto para secar as lágrimas mas era óbvio que ele já tinha me visto chorando.

–Eu nunca te vi por aqui. -Tentei mudar de assunto.

–Me mudei essa semana. 184.

–128.

O olhei por alguns segundos, realmente não conseguia descrever se ele parecia ser simpático.

–Me desculpe por isso.

– Não tem que se desculpar comigo. Eu só não queria ver alguém morrer hoje. Também acho que já deu a minha hora de voltar para o meu apartamento. Tente não morrer, por favor.

É, realmente não muito simpático naquele momento.
Ele pareceu dizer de forma irônica, deu uma risadinha e virou as costas para mim. Aquele rapaz saiu de lá e eu fiquei sozinho novamente. Me sentei no chão perto de onde ele estava antes e vi a caixa de cigarro esquecida ali. Fiquei olhando para ela por alguns segundos. Peguei e coloquei no bolso.
Acabei ficando sentado ali por um bom tempo, talvez mais de uma hora apenas olhando o céu com aquelas poucas estrelas e a lua cheia.
Ouvi o barulho daquela porta pesada se abrindo novamente. Continuei ali sentado e logo aquele rapaz apareceu, enrolado em um casaco que parecia ser bem quente.

Almirante Vermelho {Markson}Onde histórias criam vida. Descubra agora