Exatamente para tentar desmistificar essa ideia maldosa dos neuróticos obsessivos decidi contar resumidamente minha história de forma desnudada para, quem sabe, ajudar não só as pessoas que convivem com o Transtorno, mas também as pessoas que convivem com o obsessivo a entender minimamente o que se passa na cabeça do seu irmão, namorado, filho, primo... Estamos em todos os lugares, estamos nas suas famílias. A primeira coisa que deve saber é que somos obcecados, por filmes, cantores, cantoras, amores, músicas, histórias, livros, comportamentos, somos obcecados até mesmo pela solidão e sofrimento. Acredite: um obsessivo quando deseja sentir-se solitário, vicia-se nessa solidão e fica bem com isso. Eu, por exemplo, fazia tudo sozinha, desde pequena. Adorava ir sem companhia ao teatro, cinema, shopping... Estava obcecada por ficar sozinha, acredito que por isto não consegui ter muitos namorados durante minha adolescência. E depois fiz amizades, e estava obcecada com elas, comecei a sair mais, durante o fim de semana, durante a semana... E logo queria viver como minhas amigas, vieram as fases dos bares e eu queria viver como aquelas cantoras de rock in roll. Mas esta história eu contarei depois. Você deve entender que o nosso cérebro funciona de uma maneira diferente e até mesmo peculiar... Quando gostamos de algo ficamos nisso até enjoar. A palavra “obcecado” vem do latim obcaecare, que indica um estado de cegueira. A palavra “obsessão” vem do latim obsedêre, o ato de cercar alguém, alguma coisa, ou alguma ideia. Você consegue imaginar o drama? Somos como um disco riscado que repete, repete, repete... Repete até que alguém pare o disco, ou o quebre – e geralmente quebramos. Para evitar que o disco quebre alguns obsessivos (os mais graves) desenvolvem compulsões para evitar os pensamentos, devemos saber diferenciar: A obsessão são os pensamentos repetitivos e fixos, a compulsão é o comportamento, alguns lavam as mãos de maneira insistente e repetitiva sem necessidade. Alguns precisam conferir as portas, janelas e até mesmo embaixo da cama para poder dormir em paz. Você deve estar pensando que faz isso e que provavelmente também seja um paciente portador de TOC, mas pode ficar sossegado: Precaução faz parte da vida... A diferença do obsessivo é a frequência com que isso acontece, um obsessivo confere uma porta, por exemplo, por 16 vezes, ou mais. Caso ele não repita o ritual uma quantidade considerável de vezes (acredite, alguns chegam a conferir até 30 vezes) ele não conseguirá dormir, ficará com isto na cabeça a noite inteira.
Como eu disse, espero que com minha explicação, que será dada com experiências vividas por mim – obsessiva desde sempre – eu consiga ajudar outras pessoas a entenderem como funciona uma pessoa portadora do transtorno, e também ajudar meus iguais a entenderem que é possível sim viver uma vida minimamente normal e saudável. Você não está sozinho. Fixe-se nisso!
Vamos lá:
Meu nome é Paola, eu nasci em 1984 e fui diagnosticada com Transtorno Obsessivo Compulsivo aos meus 26 anos, e em minhas sessões de psicanálise (que me ajudaram mais do que os próprios medicamentos) descobri que fui, na verdade, obsessiva durante toda minha vida. Parece simples eu me definir assim, não parece? Mas acredite: não o é. Como sou obsessiva, leio e fico relendo o que escrevi para saber se ficou da forma que eu desejo – a maioria das vezes não fica, então eu reescrevo ou largo pela metade.
Desde pequena tenho um problema com sentimentos, meus pais sempre me disseram que eu era uma criança muito difícil e que ficava insuportável quando tinha alguma ideia na cabeça. Lembro de um filme que eu assisti no qual algumas amigas se juntavam para acampar e aprontavam todas durante a noite: No dia seguinte lá estava eu armando uma barraca no meio da sala para brincar de acampamento, e brincava todos os dias. Isso durou até eu ganhar uma barraca personalizada dos meus pais, então eu ficava na varanda do apartamento, dentro da barraca... E não saia de lá por nada, levava minhas bonecas e meu travesseiro. Passava a tarde dentro da barraca e quando levava alguma amiga para minha casa era lá que eu as recepcionava. Veio a fase das bonecas, ganhei uma Barbie e na segunda semana eu já estava fissurada: Queria ter a casa da Barbie, o carro da Barbie, o namorado da Barbie... Queria completar toda a coleção, e me lembro de ficar muito angustiada por não ter todos os cômodos, todos os brinquedos e principalmente de não ser como ela. Eu era apaixonada por essa boneca, e como eu não podia ter todas aquelas coisas comecei a não me desgrudar daquele brinquedo. Um dia minha cachorra comeu a cabeça da minha Barbie e não deu outra: Fiquei doente e meus pais nunca entenderam o que havia acontecido. Eu estava obcecada pela vida e pelos brinquedos da Barbie, mas nós não sabíamos que isso iria se agravar com o passar dos anos. Então vieram as fases das leituras complementares da escola, e eu comecei a me apaixonar por livros... Eu lia durante toda a tarde, e à noite. Esquecia de fazer as lições da escola, comprava livros e mais livros, os devorava em questão de semanas, e sentia um vazio enorme quando um deles acabava. Uma lembrança me invadiu agora enquanto eu escrevia: Havia um filme da Marilyn Monroe, “O Pecado mora ao lado”... Eu amava. Eu o assisti por mais de dez vezes em questão de semanas, repetindo durante minhas tardes até o ponto de decorar as falas, começava a fantasiar e imaginar como minha vida seria perfeita se eu fosse a Marilyn, queria viver como ela, morrer como ela.
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Obsessão, meu sobrenome
Non-FictionVocê já ouviu falar em Obsessão? Com certeza já. Duvida? Vamos lá, vou adivinhar o que você pensou: OBSESSÃO - quando você ouve essa palavra deve pensar naqueles filmes de terror e suspense no qual alguém persegue de maneira contínua as "mocinhas" d...