Sombras

I

Já não sei sonhar. "Desaprendi" a falar. A escrita é mais fraca que nunca. Não sei como sorrir.

Nada sei, nada tenho, nada preciso.

Vivo sem sonhos, não tenho pesadelos. Não sei falar, não preciso de ouvir. Deixei de ler, a escrita vai morrendo. Sorrisos... já ouvi falar, nunca vi nenhum.

Não tenho objetivos, apenas vivo.

Leve, consciência tranquila, passo vagaroso, sem pressa de chegar.

Não tenho destino traçado, não tenho esperanças. Não penso no futuro nem no passado - eles não existem. O que passou não existe mais e que ainda não chegou, em breve, será presente.

Tempo - não há. Tempo é ilusão. Tempo é pressa. Porquê pressa? A vida são dois segundos, então, passa-lo-emos como se fossem a eternidade. A eternidade é o inalcansável. A eternidade é nada. A vida é passada como um nada.

Divago. Pensamentos aleatórios são expressos.

Não me esforço. Não existem palavras caras, preocupações gramaticais. Escrevo o que penso, escrevo como sei. Escrevo para mim, para me distrair desta eternidade. Pouco me importa embelezar os textos, pouco me importa encher-vos a vista. Vocês e a vossa opinião - tudo isso e tudo mais - pouco ou nada me importam.

Se querem palavras bonitas, procurem textos vazios só para vos agradar a vista.

Se querem sentimento, procurem o simples.

Mas o que querem vocês? Ninguém sabe.

Agradar quem passa a correr? Agradar quem anda de olhos fechados? Agradar a cegueira dos ignorantes? Agrado-me a mim e chega.

Continuo, vagarosamente, no meu quarto, com a minha música interminável, com as folhas a sorrir, com a caneta na mão, a escrever.

Calma. O café não vai arrefecer, o cigarro não vai apagar, a música não vai acabar. Vive cada eterno segundo com calma. Pés assentes, um passo de cada vez.

Quando tudo acabar, quando tudo der errado, sossega. Respira fundo e recomeça, afinal, todos os dias o sol nasce, o vento sopra, as areias movem-se, uma nova vida chega à Terra.

Só precisas de calma, sossego. Só precisas de paz - não no mundo, em ti.