Mundo

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Como poderia introduzir meu eu se não fosse ao mundo? Como eu poderia ser introduzido se não fosse no mundo?

E este foi o meu primeiro cavaleiro, sorriso largo, olhos de mel e cabelos cor de ouro, era ele lindo e cordial como um príncipe. Ele foi o meu primeiro passo à liberdade. Ele era o meu mundo.

A simples troca de olhares iniciou minha introdução ao amor, o perigo e a tudo que até hoje me é conhecido e desconhecido. Era quase um convite de mão estendida ao pecado. Mal sabia que o pecado moldaria faces diversas de um mesmo individuo.

Quando sai da sombra da macieira e mergulhei pela primeira vez na margem do mar de independência, assisti o êxtase com meus olhos, contando todas as inverdades possíveis para mascarar tamanha rebeldia da recusa ao que me fez fruto.

O primeiro contato com o mundo me ferveu emoções capazes de evaporar tudo ao meu entorno. Foi assim que se formou a primeira nuvem.

Seus lábios, tão carnudos e rosados me encaminharam a rumos que jamais descobriria. O primeiro, o melhor e pior dos lazeres, os prazeres.

Ainda como uma criança, brinquei de saltitar pelas ruas, gritar e me confiar a desconhecidos que jamais veria novamente, eram meus melhores amigos de uma noite. Me viam rir, mas nunca tiveram chance de me assistir chorar, pois ao cair da manhã já nos encontrávamos com nossos destinos.

Meu destino me guiou ao além, mas nas alturas, o ordinário é facilmente descartado. Preso entre o nem lá e menos cá, vivi o Limbo, para que assim fosse aceito onde me permitissem. Até que a aparência não se sustentasse mais. E a cabeça também.

Pulando faixas etárias, quase como um garoto finge ser o pai e a garota fingindo ser a mãe, fui fingindo ser adulto. Me fiz e frequentei os diversos pontos em que os meus próprios jamais imaginaram pisar, e, como em toda brincadeira, o gozo é datado.

O fim do prazo e o surgimento de mais das nuvens se deu junto aos olhos da cor do mar e os cabelos loiros da bela moça. Deitou-se no chão e nunca mais se levantou. Junto com a sua alma, foi-se a minha inocência e imortalidade. Jamais seria eu ali, não poderia ser eu. Minha pele ainda tinha o bronzeamento, minhas bochechas ainda eram rosadas e meus olhos ainda se abriam. Os dela não e, talvez, um dia seria eu.

Eu nunca soube seu nome, eu nunca estive aquele local, abstrai.

Mas o mundo, jovem e travesso, não parou por ai.

Depois de pouquíssimas semanas de descanso, ele me levou aos lugares mais lindos que eu poderia conhecer. Eu novamente me sentia livre e completo, mais irracional do que nunca. Mas sempre existiu mais de um porém, e entre todos eles eu fui a pessoa mais feliz e infeliz de todas. Ao menos pra mim.

Numa altura insustentável, onde a carapuça já cansava e meu eu já não era mais o verdadeiro, meu mundo me tirou o chão, e sem ele, não havia onde pisar. Então eu caí, jamais sobrevoei, apenas cai. Supliquei para que ele reconstruísse, mas sempre se quebrava tão fácil. E é o que acontece quando se faz de malgrado. Tornei-me sua responsabilidade, assim como um filho é o de sua mãe. Isso me fadou ao fim de mim mesmo

Foi decidido ali, no ar, que já não me reconheceria mais como uma criança. Era tão pequeno e ingênuo, mas corri para multidão, que me abraçou com seus braços maliciosos e me devoraram com as mãos e os olhos. Mas o verde, azul e roxo não pertenciam àqueles milhares, meu coração cru pertencia a ele. Até que as maiores artimanhas e graças se tornarem habituais o suficiente para me jogar em esquecimento e tornar outro o seu ursinho predileto.

Em queda livre, não há mais como voltar ao que estava num altura tão distante. Então, pela primeira vez, arregacei as mangas e construí meu mundo sozinho. Falho, com paredes de vidro e sem suas devidas vigas, mas ainda assim, ousei chamar de meu.

Diante de diversas tentativas falhas de avanço, me recolhi de volta à terra firme, aonde agora eu era um estranho fruto de uma árvore desconhecida. O fruto que caiu tão longe, se refez com seus iguais em uma arvore fictícia, onde nuvens só cresciam cada vez mais, grandes o suficiente para serem notadas, mas leves o suficiente para não causar uma precipitação. Uma tempestade em formação.

Maças verdes e vermelhas rolam colina abaixo, mas nunca na mesma intensidade, até encontrarem sua arvore correspondente. Minha frágil ficção morreu em meses, então reflorestei sozinho, para que mais chuvas não me afogassem em solidão. Mas nuvens tempestuosas criam seu escuro, pairando sobre o ar, estacionei no terreno escuro. De cabeça içada, procurava no ar o meu eu, tão distante daquilo que definia o meu tudo, me fez perdido, irreconhecível e sozinho.

Preso entre a vida e a morte, solto num limbo.

Familiarizado, tornei-o eu.

O meu apocalipseOnde histórias criam vida. Descubra agora