Pandora

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-Ela já está assim há 2 horas! Você deveria ter atirado uma somnum menor! - disse uma voz estranha.

-Não tive escolha, eram muitas crianças humanas! - disse uma voz mais familiar.

-Calem a boca, ela está acordando! - ralhou uma terceira voz.

Lentamente abri meus olhos. Minha visão turva avistou três borrões coloridos que pareciam me encarar. Levei as mãos ao rosto e esfreguei os olhos, como se tivesse acabado de despertar de uma longa noite de sono.

Ainda morosa, olhei para os lados, os olhos semiabertos, procurando por Kris. Pensei estar no quarto dele, mas quando minha visão se tornou nítida descobri que eu não poderia estar num lugar mais distinto do quarto da minha criança.

Com o susto, caí do lugar onde estava sentada. Procurei à minha volta por algo que pudesse explicar por que eu me encontrava num lugar que parecia uma caverna. Antes de despencar, eu estava sentada numa cadeira que parecia ter sido esculpida por um amador no tronco de uma árvore que nascera bem ali. Não havia nenhuma saída, a não ser por uma porta de tamanho humano feita de troncos, atrás de um grande trono feito de cristais brilhantes e multicoloridos. O lugar era muito bem iluminado, não por lâmpadas ou archotes, mas por dezenas de pequenas chamas que queimavam no nada, flutuando a uns 4 metros de altura, ziguezagueando lentamente pelas estalactites. Fora isso, alguns feixes de luz passavam por pequenos buracos entre muitos galhos, trepadeiras, cipós e troncos que cobriam a parede oposta a porta. Mesmo esta sendo a única dose de luz solar que aquele lugar recebia, plantas e hortaliças cresciam muito saudáveis ao pé da parede à minha esquerda e, acredite ou não, até mesmo entre as estalagmites. À minha direita, uma pequena fonte de barro tosca jorrava água a uns 50 centímetros de altura, e julgando pela falta de eletricidade que poderia alimentar uma bomba d'água, a fonte não tinha uma, fazendo parecer que a água que jorrava por meio de magia.

Tentando ignorar completamente o fogo flutuante, as plantas que brotavam da rocha e sem sol, e a água com vida própria, me virei mirando os três borrões que me encaravam, agora com a forma de três leedwees. A que estava no meio era, sem dúvida alguma, Freya. À direita dela estava uma leedwee de rosto lívido, nariz pequeno e lábios rosados, que me olhava expressando um leve sorriso. Ela tinha cabelos azul piscina, que caiam nos ombros como uma cachoeira muito bonita. O outro, à esquerda de Freya, tinha um rosto fino cheio de sardas e queixo pontudo. Seus cabelos arrepiados para trás eram uma mistura de vermelho e amarelo vivos, dando a parecer que sua cabeça estava em chamas. Ele me olhava como se suspeitasse de algo.

Como Freya, os dois eram muito pálidos e, em vez de emplumadas, tinham asas de membrana. A de cabelos azuis usava um vestidinho de couro como o de Freya, velho e remendado, porém consideravelmente mais limpo. O de cabelos de labareda usava somente uma calça, igualmente de couro e igualmente velha e remendada, mas um pouco chamuscada. Não usava nada para cobrir a parte superior do corpo, deixando a mostra seu peitoral e a barriga sarada cheia de gominhos, o que era absolutamente estranho e incomum, visto que leedwees não tinham uma barriga como a dos humanos, muito menos mamilos.

Deixei uma exclamação de espanto sair quando vi aqueles três me encarando. Logo em seguida saiu da minha boca a primeira coisa que pensei:

-Onde o Kris está?

O leedwee de cabelos de labareda deu uma risadinha desdenhosa.

-Ele está bem. - disse Freya se aproximando. Ela estendeu o braço para me ajudar a levantar, mas não me mexi.

-Você...! O que você fez?! Que lugar é este?! - disse eu, sentindo a raiva fluir ao notar melhor Freya.

Freya recolheu o braço e desviou o olhar parecendo envergonhada.

Coração ao VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora