Capítulo II - Amizades Agradáveis (Revisado)

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Maio de 1988. Enquanto andava entre as árvores cheias de flores e frutos, Hélio podia dizer que não teria problemas. Ele pelo menos tentava não tê-los, mesmo que estivesse fugindo das palestras do pai, um pastor. Não ser alvo de duras críticas era algo difícil sendo alguém como ele era, sendo o tipo de pessoa que ele era, alguém condenado eternamente por duas grandes razões.

A primeira razão era o motivo de isolar-se dos outros lá fora. Ele percebia como as meninas eram belas, como eram bem vestidas e atraentes, mas não para ele. Hélio ouvia os meninos falarem delas e os via as observarem, mas ele não falava com o mesmo desejo sobre elas, nem as via com a mesma faísca que os outros rapazes tinham no olhar. Quem ele enxergava de forma especial era a Heitor, um novo garoto que chegou a cidade em fevereiro com sua família.

O fugitivo das palestras fervorosas ministradas pelo próprio pai sobre o mundo condenado a queimar para que o reino dos céus desça sobre o povo, apenas indagava se devia realmente ser condenado a tamanho castigo, estava realmente condenado a queimar para sempre apenas por desejar estar nos braços definidos de Heitor? Estava realmente destinado a pagar pela sua paixão que é um vil e abominável pecado? Ou era mesmo doente mental como diziam muitas pessoas mesmo que o Conselho Federal de Psicologia tenha deixado de considerar como tal em 1985?

Questionava-se quando observava os peixes nadarem nas águas cristalinas do rio que segue pela floresta. Ele escutava atentamente o farfalhar das folhas, os cantos dos pássaros e os sons dos insetos. Todos vivendo como podem viver. Ali, sozinho, sentia que estava livre para poder exercer sua segunda razão de isolamento, sua segunda condenação eterna que nunca usou para machucar ninguém, nem para enganar ou iludir, pelo menos não aos outros indivíduos, por mais que tivesse motivos; já não podia dizer isso para si mesmo.

A segunda razão para sua condenação eterna era vista rodopiando pelo ar enquanto seus olhos cor de mel emitiam uma luz dourada. Faíscas brilhantes surgiram de seus dedos e logo rearranjaram-se num rapaz de cabelos bem arrumados. A imagem de Heitor foi formada e estendeu a mão a um Hélio feito das mesmas faíscas cintilantes que logo encontrava-se dançando com o outro.

Um bruxo, como se não bastasse ser gay, descobriu que possuía a habilidade de manipular o fogo e a luz.

Mas, naquele momento, nada disso era relevante, somente sua figura que dançava, melhor do que a real capacidade dele, no ar junto do outro jovem. Imaginava que seria interessante dançar com ele em algum evento anual, sempre imaginou como seria se Heitor magicamente se apaixonasse por ele. Riu ironicamente com seus pensamentos impossíveis.

No entanto, o sorriso deu lugar a admiração e espanto quando não eram vistas apenas faíscas mas também uma neve brilhante e azulada que desceu sobre sua imagem como confetes num festival. A imagem de Heitor tornou-se azul, feita de um gelo fino que não derretia com o calor, assim como as faíscas não se apagavam.

O que...

Você é um filho do Sol? — Era perceptível a alegria na voz, era perceptível a curiosidade, era perceptível a surpresa no tom levemente grave. Para Hélio, aquela voz era inconfundível em qualquer lugar.

Desviou a atenção da imagem projetada e viu o rapaz alto de cabelo castanho-escuro de tamanho curto cujos fios esvoaçaram-se por seu rosto. Se ainda não tinha certeza que sentia algo mais pelo garoto, suas dúvidas sumiram como a imagem feita de fogo e gelo ao ver as íris escuras que brilharam em um azul reluzente e celeste, era como observar a infinidade do céu bem ali.

Então o choque de realidade veio. Heitor também tinha magia. Heitor sabia que Hélio tinha magia. Heitor dançou com ele, e, acima de tudo, Heitor sabia que o mais baixo estava apaixonado por ele.

A Cor Do Céu Nos Seus Olhos (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora