Olá, amados e amadas! Que saudade estávamos de nos reunir por aqui com vocês! Não é que a Dona Morte resolveu aparecer neste Halloween? Esperamos que gostem deste novo conto, foi escrito com muito carinho e cuidado neste período em que precisamos tanto de esperança.
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Sinopse: Dona Morte anda exausta na pandemia por conta do povo que continua se aglomerando sem máscara, sem cuidados, sem nada. Já Destino, o seu namorado, está deprimido: acabaram as festas, as reuniões, tudo! Desesperado com esse novo normal, ele resolve se esgueirar para as ruas humanas. O que será desse farrista apaixonado por lantejoulas se ela, a "fiscal da higienização", descobrir?Gênero: Comédia, sobrenatural.
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Uma lufada de vento entrou pela janela aberta, balançou as cortinas escuras e derrubou os papéis da mesa de seu escritório. Eram tantos que se espalharam pelo chão, alguns se esgueirando por baixo da cadeira e batendo em suas pantufas do Jack Skellington, o Rei das Abóboras*.
Mesmo assim, Dona Morte não se permitiu perder o ritmo, a ponta de sua pena preta com um tom azulado deslizava vigorosamente sobre as páginas do livro contábil de mortes. Precisava com urgência que o Ser Supremo permitisse uma modernização de todo o sistema de nascimentos e falecimentos. A informática estava aí para isso, era um absurdo que em pleno século XXI cristão ainda fosse obrigada a fazer aqueles registros em livros de pergaminho com caneta tinteiro. Um retrocesso, uma dificuldade, enfim, um desrespeito com os trabalhadores do mundo espiritual.
Focou sua atenção na lista de "Motivos pelos quais os humanos não conseguem sobreviver durante a pandemia". O primeiro deles era um bem simples: "síndrome de super-herói". As aglomerações estavam proibidas, mas a humanidade não parecia entender o significado de "proibido". Bares clandestinos camuflados em pet shops e outros comércios, churrascos e festas de família sendo descobertas pelas fotos nas redes sociais, reuniões de trabalho que na verdade eram encontros de happy hour, jogos de futebol nos quais as máscaras protegiam apenas as redes e cercas onde eram penduradas, sem falar em tantos outros absurdos.
E isso tudo enquanto o número de falecimentos e hospitalizados ainda era baixo, ao qual os humanos chamaram, bobamente, de primeira onda. Dona Morte mal dava conta de ir e vir entre todos os óbitos comuns e os causados pela pandemia.
O negócio ficou feio mesmo na tal da segunda onda de contaminação. Aquilo foi ruim. Mas na terceira, piorou. Precisou barganhar com o Senhor Tempo uma esticadinha nas suas horas pessoais para organizar tudo, mas mesmo assim sua mesa se encontrava abarrotada. O tempo para a Morte era infinito, mas se tornava ínfimo diante de tanta burocracia.
Não que estivesse indo pessoalmente em cada falecimento, ela contratou alguns minions para ajudá-la, claro. Porém, todos os registros e despachos, aquela parte chata sobre a qual só quem era empresário ou funcionário público entendia, isso ficava sob sua responsabilidade.
E se tinha uma coisa que a Morte odiava era acúmulo de papelada.
As coisas andavam tão caóticas que mal conseguia espaço na sua extensa agenda para ver Destino. E o problema maior era que, nas últimas ocasiões em que se encontraram, antes do período das festas cristãs, ele parecia cabisbaixo. Suas roupas não apresentavam nenhum paetê colorido e o cabelo não continha aquele glamour do uso de mousse cósmico com pó de estrelas.
Dona Morte largou a pena no suporte e esticou os braços para cima, alongando-se. Necessitava de uma pausa, de muito chocolate e de uns amassos com o namorado, não necessariamente naquela ordem.
Encarou os papéis atirados no chão, o livro contábil e sua estante de arquivos das grandes desgraças da Terra. A seguir, deu um longo suspiro.
Odiava fazer um atalho, mas era um ser espiritual superior e se não pudesse usar os poderes do universo de vez em quando, então sua existência não valeria a pena.
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As Desventuras Da Dona Morte E Outros Contos
HumorO mundo que nos cerca é insondável e existem mistérios que mesmo toda a existência humana não consegue desvendar. Seres diversos, situações diversas. E entre os mistérios mais básicos e inexplicáveis que circundam a vida humana, está a morte: impied...