1°Capítulo - Súbito Suspiro

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Brasil, São Paulo, 20 de setembro de 1997.

Aos doze anos de idade meus pais se mudaram do Brasil por conta de alguns problemas dos quais eu desconhecia – e desconheço até hoje – o que os motivou a fazer isso. Até hoje eu lembro-me exatamente como fora. Fui arrastado, arrogantemente, pela minha mãe que puxou o meu braço, na calada da noite, sentindo o frio da madrugada baforar o meu rosto através da janela que se abriu com a força imponente do vento.

Aproveitou algumas roupas e jogou-as dentro de uma mala de couro esturricada de pertences, puxou-me novamente e descemos a escada polida em forma de L, pulando de três em três degraus, a pressa era o que mais importava naquele momento.

Sentia meu coração martelar minha garganta. Meu corpo tremia, fiquei imaginando se eu melhoraria mais tarde, se eu conseguiria superar aquela viagem repentina.

- Mamãe, o que está acontecendo? – perguntara, o coração à mil, chacoalhando a caixa do peito.

Ela aproveitara o tempo extra e se ajoelhou para olhar-me.

Tudo ficará bem, o papai dará um jeito, ele sempre tem uma solução, não é mesmo, querido? – ela sorriu.

Dentro do carro o papai dirigira em alta velocidade, nos levando a um lugar totalmente desconhecido. Eu ficara encolhido, sentindo um profundo medo.

Só lembro-me de termos entrado em um jatinho pousado numa pista clandestina. Sentando em um banco confortável, eu chorara muito por saber que nunca mais iria ver meus amigos. A vovó ficara para trás, os bolinhos de chuva em manhãs de sábado acabariam. Eu sentiria falta de tantas coisas; do sol aquecendo as tardes durante as “peladas” no fim de semana, das paqueras, até mesmo dos professores, eu deixara minha vida para trás.

 

Estados Unidos, Nova Iorque, 20 de fevereiro de 2015.

Já era tradição Melissa aguardar Tony, seu irmão, e Victor, seu pai, chegarem da concessionária às sete horas da noite. Sua família era muito religiosa, durante as noites de domingo eles iam à missa, em seguida passavam em algum restaurante para jantarem juntos, obviamente todos só jantavam após uma oração e agradecimentos.

Ela os aguardava para o jantar.

Ela estava lendo um livro sobre o comportamento humano na sociedade para o próximo debate que teria no dia seguinte, todos deveriam interagir, debater, e se possível criticar a posição dos seus colegas de classe. Ela cursava sociologia, o que a deixava contente já que achava o ser humano muito complexo e previsível, simultaneamente, queria desvendar seus questionamentos, buscava algo que refletisse a vida de uma forma categórica. Sempre achara sociologia uma matéria interessante.

A chuva caía sobre o telhado da casa.

Os fones de ouvido tocavam "Pretty Hurts" da cantora Beyoncé, o volume relativamente baixo para não comprometer seu entendimento. Não importava o que estivesse fazendo, seja lendo um livro da faculdade ou um que queria muito ler, ou até mesmo no metrô ou ônibus, Melissa só conseguia ler se caso estivesse com fones de ouvido tocando alguma música pop, r&b, ou jazz.

Ela nem respirou direito, foi saindo do ensino médio e migrando para o superior com seus dezessete anos e meio – o jeito que ela falava.

No último parágrafo do segundo capítulo – eram seis – Melissa retirou os fones de ouvido, escutando subitamente os pneus do carro do seu pai entrar na garagem que abriu-se automaticamente. Largou o livro marcado por uma pena de pavão perfumada e levantou-se, apressada.

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