II - Helena

42 17 64
                                    

          Manhã de domingo e Helena estava terminando um de seus livros. Foi acordada pela sua mãe para que fosse tomar café. Apesar de ter nascido no Rio, seus pais eram portugueses e até hoje mantinham suas tradições. Ou seja, uma família tradicional portuguesa... Ela tinha um péssimo relacionamento com eles. Sabia que seu pai traía sua mãe em vários bordéis pela cidade, e ela se fazia de cega, afinal, ela cresceu acreditando que isso era normal e homens tinham suas ''necessidades''.  E com a sua mãe, o relacionamento era muito bom, até ela perceber as covardias e desonestidades que ela fazia com as suas subordinadas, e não só com elas, mas com qualquer outra pessoa que ela julgasse inferior. As duas viviam discutindo por causa da hipocrisia da mãe. Ela odiava quando a mãe mudava totalmente na presença de outras pessoas. Mas o inferno começou de verdade quando ela começou a insistir que Helena desposasse. Levava homens e mais homens para que ela conhecesse, mas nunca se interessara por nenhum. Foram sete no total. Todos com a ideia de que, quando ela se casasse, seria a dona do lar mais feliz do mundo. Mal sabiam eles que, era exatamente esse tipo de pensamento que a fazia desgostar cada dia mais de homens. Helena, apesar de ser feminista e acreditar que casamento não era o finalidade da mulher no mundo, sonhava em se casar. Seu relacionamento dos sonhos era um onde ela pudesse ser quem realmente era: tagarela, inquieta e curiosa. Tinha sede de conhecimento e sabia que custaria a achar um homem que a compreendesse tão bem que ''a deixasse'' estudar o que quisesse.

          Mal chegou à sala e sua mãe agarrou suas mãos, e a arrastou até ao lado de um senhor que parecia ter idade para ser seu pai.

— Bom dia, filha! Venha conhecer o Josué, ele é um médico muito respeitado aqui em Salvador e está doido para te conhecer.
— Olá, sua mãe falou muito bem de você!
— De novo isso? Eu não aguento mais essas insistências. Já disse que não me interessarei por ninguém que tu trouxeres.
— Ora Helena, não seja rude, ao menos fale com o rapaz – disse Catarina rispidamente
— Perdão senhor, vamos caminhar no jardim? – disse Helena
— Claro – respondeu Josué surpreso com o convite

          Antes que pudessem sair da sala, sua mãe a puxa pelo braço e sussurra

— o que você está inventando agora? – perguntou

          Helena apenas ignorou e seguiu com o senhor para o jardim.

— Então, fiquei bastante curioso com o convite, o qu...
— Não diga nada, não estou interessada em papo furado – disse Helena, o interrompendo
— Mas eu achei que tivesse se interessada
— Eu? E o que te faz pensar isso?
— Bem, sou um médico reconhecido na cidade, posso te dar tudo que você quiser
— Pode me dar liberdade? – indagou Helena
— Liberdade?
— Sim, quero liberdade. Quero o direito de ser o que quiser e estudar o que quiser
— Ora, não fale bobagens, mulheres não servem para estudar, mas posso lhe dar uma mansão maior que a sua

          Helena para de caminhar por um instante, se abaixa e cutuca a terra por uns instantes e logo em seguida o encara

— Se me permite perguntar, quantos anos o senhor tem?
— Quarenta quatro
— E por que procura alguém tão nova?
— Sou viúvo e não tenho filhos, preciso de alguém mais nova para cuidar de mim e me dar herdeiros
— A pois, saiba que não posso lhe oferecer nada disso, a dona Catarina não lhe contou? Na verdade, sou um homem
— O que? Não brinque comigo, estou vendo claramente seus traços femininos
— É verdade, chegue perto, vou te mostrar

          O senhor se aproximou de Helena, na esperança de ver suas intimidades, e quando ele chega perto o suficiente, ela joga terra em seus olhos

— ORA SUA PIRRALHA, BEM QUE EU DEVERIA SABER QUE ÉS INFANTIL – disse ele gritando, e indo para cima dela. Helena sobre o rosto esperando pelo pior, quando de repente ela sente respingos de água na sua roupa. Quando ela descobre o rosto, o senhor metido a valente se encontrara encharcado.

— QUEM FOI O FILHA DA PUTA QUE JOGOU ÁGUA EM MIM? – perguntou ele gritando e olhando ao redor – TENHO CERTEZA QUE FOI ALGUMA EMPREGADA ENXERIDA! SAIBA QUE PERDEU SUA CHANCE, ADEUS!

         Ele sai pisando forte, e ela procura pelo jardim quem teria feito algo tão incrível. Ela então segue um mínimo rastro de terra molhada até o banheiro das empregadas. Não conseguiu ver quem tinha se trancado lá dentro, mas já fazia uma breve ideia.

          De volta a sala, sua mãe vai furiosamente ao seu encontro

— POSSO SABER O QUE FOI QUE VOCÊ FEZ DESSA VEZ? – perguntou ela gritando – VOCÊ SEMPRE FAZ ISSO, JÁ NÃO SEI O QUE FAZER COM VOCÊ
— Por que você só não para de me trazer esses velhos nojentos? Eu já não consigo ter um café normal, sempre tem que ter um senhor de idade que veio conferir a oferta.
— Você tem razão, não vou mais me estressar com isso. Quando você for mais velha, vai entender que tudo isso que tu fazes, não vai dar em nada. Eles sempre vencem. Não adianta você tentar lutar contra isso, só reze, apenas reze, para achar alguém que faça o mínimo e depois me agradeça.
— Eu sei que você está falando do papai, e eu sei que você não aguenta mais isso... Então por que você apenas não vai embora?
— Você não sabe o que está falando, vá para o seu quarto. Vá para os seus livros, se encha com mais mentiras. Não quero mais ver você hoje.

          Helena deixa a sala, e, de longe, consegue ouvir o fungar da sua mãe. Talvez ela devesse ter sido tão dura. Mas agora já era tarde.

          No seu quarto, ela se senta a sua escrivaninha e pensa nos acontecimentos de hoje. Será que realmente foi Alira que jogara a água? Ela se levanta, vai em direção a janela e encontra Alira regando a horta. Não sabia que alguém tão acanhada como ela, teria a coragem que ela teve hoje. Nesse momento ela começa a se questionar sobre ela. Não sabia muito sobre ela, apenas que tinha vindo do Pará. Mas por quê? Ficou intrigada pensando nas possibilidades. Passou uns vinte minutos a observando, até que ela Alira olha para a janela, abaixa a cabeça e vai embora caminhando o mais rápido possível sem parecer que estivesse fugindo. Helena sentiu suas bochechas gordinhas queimarem. Talvez elas tivessem ficado vermelhas com o olhar de Alira.

          Voltou para a sua escrivaninha e continuou a ler o seu livro de onde havia parado na noite passada.

          Voltou para a sua escrivaninha e continuou a ler o seu livro de onde havia parado na noite passada

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
Beijos de NataOnde histórias criam vida. Descubra agora