Capítulo 2

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NOTA DA AUTORA: Olá leitorxs!! Muito obrigada por estarem acompanhando a obra até aqui e espero que se sintam instigados a continuarem. Esse início é, de fato, mais lento devido ao universo ainda estar sendo apresentado, mas prometo que em breve as cenas eletrizantes começam. 

Deixem comentários para eu saber o que estão achando/ teorizando (hahaha). E, para me ajudar, deem estrelinha ao final da leitura. 

Obrigada!!

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Acordei com o carro sendo estacionado em um gramado verde, atrás de uma casa de estilo vitoriano, mas com aspecto mais rústico com suas paredes de pedras brancas e janelas amplas. Meus olhos vasculharam o espaço e, em frente à casa, estendia-se o mais amplo azul claro. Atrás de nós, em contramão, uma longa e espessa floresta se erguia sobre o solo úmido.

Eu menti mais cedo. Eu nunca seria capaz de me esquecer desse lugar. Pelo menos não completamente.

Saí do carro e caminhei pelo gramado em direção ao lago.

Era como se o vento soprando meus cabelos sussurrasse para mim. Casa. Toquei o chão e respirei fundo. Eu poderia ficar mil anos longe daqui e eu ainda me lembraria desse cheiro. O cheiro de quando a brisa do lago toca a terra e sobe para os céus. A forma como o vento zumbia uma canção esquecida. Ou como toda vez que a água recuava minimamente, ela voltava a tocar a margem como se pudesse sentir saudade da terra fresca.

Quando toquei meus pés na água ainda gelada de fim de março, meu mau humor desapareceu de vez. Fazia dez anos que eu não vinha aqui, mas a sensação continuava a mesma.

Havia algo naquele lugar. Algo que o tornava dez vezes melhor que qualquer outro.

—Eu disse que iria te fazer bem.

Minha mãe parou ao meu lado, também colocando os pés na água.

—Esse lugar é...

—Mágico. —minha mãe terminou por mim.

Concordei. Se havia algo que pudesse explicar este lugar, a forma calmante como as pequenas ondas tocavam meus pés, com certeza seria mágica.

—Há uma lenda antiga que diz que há um tesouro guardado pelo Lago e a magia desse tesouro torna este lugar diferente de qualquer outra coisa que já existiu. Por isso a água é tão azul e brilhante. Por isso o verde aqui parece mais verde e a terra é mais fértil. Por isso que, mesmo quando a neve cai, ainda é o melhor lugar para se respirar.

—Talvez seja porque a cidade mais próxima fica a mais de uma hora daqui.

Minha mãe sorriu.

—Acho que isso ajuda também.

Olhei para os lados procurando alguma movimentação. Mas além da casa vizinha, toda fechada e com um lindo jardim de flores, não havia ninguém por perto.

—Sempre foi assim tão vazio?

—As pessoas preferem ficar na parte sul do Lago porque tem mais comércio.

Apontei para a casa à nossa direita.

—Pelo que eu me lembre havia uma família ali, não é?

—Pai e filho. —foi tudo o que minha mãe disse.

Assenti.

Não me lembrava muito bem daqueles anos. Minha memória nunca foi uma das melhores, principalmente quando se tratava de acontecimentos que ocorreram quando eu ainda era criança. Mal me recordava do que havia jantado na noite passada, quem dirá o que fiz quando ainda era uma criança.

Minha mãe não disse nada por um longo tempo. Apenas tomou mais um segundo para respirar fundo e então tirou os pés da água e se agachou para pegar as sapatilhas que deixou sobre a grama.

—Vamos ajudar seu pai a tirar as malas do carro.

Arrumar esta casa era, definitivamente, um trabalho muito mais simples do que o que tivemos com as outras nas quais moramos. A casa estava exatamente como havíamos deixado dez anos atrás. Nossos porta-retratos, apesar de desatualizados, estavam espalhados pelos cômodos. Meu quarto ainda tinha minha cama e meus brinquedos de quando era criança, além de ainda ser das cores branco e lilás. Nem parecia que tínhamos ido embora dali há mais de dez anos. Não precisávamos fazer nada demais para tornar aquele lugar um lar.

Agora me lembrava que quando nos mudamos pela primeira vez, mal tivemos tempo de levar alguns dos meus brinquedos. O Bichinho —como chamava uma pelúcia em forma de cachorro surrada que tenho desde meus dois anos —foi esquecido em cima da minha cama. Meus pais precisaram me aguentar chorando por semanas por causa desse cachorro de pelúcia.

Pulei na cama e agarrei Bichinho. Cheirava a mofo, mas continua macio como anos atrás.

—Se eu e sua mãe soubéssemos o quanto você iria chorar por causa dessa coisa, teríamos voltado correndo para buscá-lo.

Sorri para meu pai parado no batente da porta, alto e forte, tão estranho em meio ao mundo lilás que era meu quarto. Seu olhar era calmo, como sempre, coberto por seus óculos de grau que o fariam parecer um grande nerd se não fosse seu corpo malhado.

Meus pais sempre se preocuparam com a minha segurança, mas me esconder não foi a única coisa que fizeram. Também me treinaram, para que eu fosse capaz de me defender caso precisasse. Desde que posso me lembrar sou treinada em artes marciais. Por anos, minha mãe foi a minha principal treinadora, mas meu pai também me ajudou bastante, apesar de ser sempre mais tolerante —o que a irritava às vezes. E enquanto meu pai era alto e musculoso como uma parede, mamãe era baixinha e cheia de curvas e, mesmo assim, não havia dúvidas de que ela poderia acabar com papai a qualquer momento em nossos treinos. Talvez não levasse mais que dois minutos para isso.

Agora, olhando para os cabelos escuros do meu pai —os quais herdei — despenteados e os óculos de grau meio tortos no rosto, as mangas do suéter erguidas até o cotovelo, era difícil me lembrar deste lado dele. O homem capaz de lutar se preciso. Diferente da minha mãe, papai se encaixava muito mais como um acadêmico despojado. Mas não mamãe, ela seria assustadora mesmo se usasse óculos e estivesse enfiada atrás de livros. Ela era como um animal selvagem à espreita.

—Por que saímos tão apressados? —perguntei. —Minhas coisas ficaram praticamente todas para trás.

Meu pai deu de ombros.

—Não me lembro bem. —ele curvou a cabeça. Segui o seu olhar para meus pés pendendo para fora da cama. Era uma cama muito pequena. —Acho que vamos ter que comprar uma cama nova para você. Aparentemente meninas crescem. —ele jogou as mãos para o alto, fazendo uma careta confusa. —Eu não acredito que ninguém me avisou.

Mostrei minha língua para ele.

—Lembre-se que meninas crescidas amam camas bem grandes.

Ele riu com ternura nos olhos. Meus pais eram loucos em muitos aspectos, como em sua obsessão por segurança, mas nunca me trataram com nada menos que amor. E eu não podia ser mais grata por isso.

—Vou me lembrar disso.

Ergui um joinha com a mão, sorrindo.

Eu não esperava gostar deste lugar, não imaginava que respirar aquele ar fosse diferente das dezenas de mudanças que fizemos. Mas a verdade era que ali parecia diferente e eu estava feliz por estar de volta.

ESCOLHIDA PELO DESTINOOnde histórias criam vida. Descubra agora