Prólogo

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Vitor – oito anos antes

Isadora andava pela casa, repetindo que tudo havia acabado.

― Você em meu lugar faria a mesma coisa, Vitor! ― Com os exames incompletos nas mãos, ela chorava enquanto tentava me fazer entender que não ia mais haver casamento.

Isa estava terminando comigo dez dias antes de nosso casamento. Sequer teve a paciência e a decência de aguardar o diagnóstico para sabermos de fato se a infertilidade era minha.

― Eu preciso ser mãe, você mais do que ninguém sabe o quanto quero isso, o quanto sonho com isso desde criança!

― É claro que sei, amor! Mas ainda estamos fazendo exames. Tenho ultrassonografia pélvica semana que vem, aquele tal exame microbiológico que nem sei ainda do que se trata... Até exame de tireoide eu agendei. Eu marquei tudo o que o urologista pediu. Nós vamos descobrir se sou eu que realmente tenho problemas de fertilidade e vamos cuidar disso. Ei, somos nós dois como sempre, lembra?

― Claro que é você! Fiz incontáveis exames e eles não deram nenhuma alteração. Meu problema é você!

Respirei fundo, tentando ser paciente. Realmente ela estava fazendo exames há muito tempo, mas quando eles não apontaram qualquer problema, a médica dela sugeriu que era a minha vez de verificar se a infertilidade era minha.

Então, meio relutante devido aos exames invasivos e desconfortáveis que certamente eu teria que encarar, protelei um pouco, mas acabei cedendo porque ter um filho não era apenas um sonho dela. Era o meu grande sonho também.

Sou filho único. Não tive sequer um primo para me fazer companhia na infância, pois minha mãe também é filha única, então sempre imaginei que quando me tornasse adulto e encontrasse a mulher da minha vida, eu teria ao menos dois filhos para que eles não se sentissem tão sozinhos e para que os filhos deles tivessem primos. Eu idealizei uma família grande e linda, mas olha aonde cheguei?

Isadora abriu uma mala e começou a jogar suas roupas dentro dela. Estava nervosa, irritada e nitidamente com ódio de mim. Sei que por ela já teríamos um filho faz tempo.

Namoramos desde que ela tinha 15 anos e eu 16. Desde então, foram sete anos juntos. Planejando uma vida e descobrindo o mundo juntos. Isa foi meu primeiro beijo, minha primeira transa, assim como fui a dela. Não é possível que ela estivesse realmente considerando a ideia de me deixar.

― Tenta se acalmar, Isa. Quando os exames ficarem prontos, se realmente apontar para algum grau de infertilidade em mim, ainda teremos opções. Meu médico disse que eu não precisava me apavorar, que existem diversos tipos de tratamentos hoje em dia e...

― Sinto muito. ― ela tirou a aliança e colocou sobre a bancada da cozinha. ― Não vai mais ter casamento. Acabamos aqui, Vitor, é melhor você aceitar isso. Depois pego o restante das minhas coisas.

E ela foi embora, arrastando sua mala.

Não foi apenas embora da minha casa e da nossa história. Foi embora da cidade também.

Tantos anos de relacionamento e ela sequer teve a sensibilidade de terminar comigo de um modo mais amigável. E enquanto eu engolia o choro e devolvia presentes – a casa estava cheia deles – ela partia definitivamente para a cidade grande.

Nunca contei a ninguém o real motivo daquele fim. Não queria que minha mãe e minha avó ficassem com mais raiva da Isadora, nem que ficassem tristes porque seu único filho e neto, não daria continuidade à família.

As pessoas comentaram pela cidade que eu traí a Isa, por isso ela foi embora às vésperas de nosso casamento, mas Deus sabe que nunca olhei para outra mulher depois que demos nosso primeiro beijo. Eu a amei incondicionalmente.

Ela afirmou que se fosse eu no lugar dela, que faria o mesmo, insinuando que eu a abandonaria se o problema de infertilidade fosse nela. Mas um nunca faria isso. Eu já estava pesquisando todas as possibilidades: Inseminações, adoção... Sei que daríamos um jeito. E fiz isso antes do espermograma apontar algum tipo de problema em mim. Mas Isa estava decidida a me deixar, nada que eu dissesse ou fizesse, mudaria sua cabeça.

Ela foi embora sem olhar para trás, sem me pedir desculpas por ter sido tão inflexível. Não passou para dar um beijo em minha mãe e minha avó. E seis meses depois de sua partida, descobrimos que ela tinha acabado de se casar. Foi aí que entendi que eu a amei sozinho. 

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