4 - Imperdoável

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Vitor

Passo três dias inteiros com um peso enorme na consciência por ter escondido os documentos dela. Sei que estou errado, mas do jeito que as coisas estavam caminhando, ela iria embora se pegasse tudo aquilo, ainda mais com o bilhete da irmã, meio que autorizando.

Eu não podia deixar. Por isso agi impulsivamente, guardando tudo e deixando que a situação se ajeitasse por aqui, antes de devolver os pertences dela.

Eu preciso devolver. Vou fazer isso assim que chegar em casa. Acho que ela já está um pouco mais confortável agora, que parei de implicar.

Entro em casa no comecinho da noite e vejo ela e minha avó ralando milho. Pelo visto, minha avó está lhe ensinando sua velha receita de pamonha, a mesma que ela repetia que era de família e que nunca passaria adiante.

Vó Laura não esconde o quanto gosta dela e as duas até já fizeram um pacto de mesmo depois que a vida da Laura voltar ao normal, elas irão continuar amigas, se visitando sempre. E eu não duvido disso.

― Boa noite. ― cumprimento-as.

Passei o dia cuidando da colheita e nem tive tempo de vir em casa almoçar.

― Boa noite. ― minha mãe responde, enquanto Laura e minha avó parecem entretidas demais, preparando a receita enquanto assistem algo no tablet.

Olho para elas e me preocupo. O combinado era a Laura ficar longe de aparelhos de comunicação.

― Vó, o que seu tablet está fazendo aí? Posso saber?

― Ela está me dando umas dicas de maquiagem e penteados elegantes para a minha idade.

Pego o tablet e confiro. Elas realmente estão assistindo algum vídeo sobre o assunto que citaram. Devolvo à Laura:

― Não está aproveitando a ingenuidade dela para usar suas redes sociais, está?

Laura fica séria.

― Parece um velho ranzinza, desconfiando dos outros o tempo inteiro. Eu sei muito bem o que não devo fazer, Vitor, não sou louca de me expor e expor vocês.

― Só fiz uma pergunta, enfezadinha. Perguntar ofende?

― Você nunca é inofensivo comigo. Julga minhas roupas, meu caráter, minha profissão, meus canais... Se soubesse meu tipo sanguíneo, julgaria também.

― Não seja dramática. Ah, e antes que eu me esqueça, seu afilhado está na porta, esperando a cenoura dele.

Ela larga tudo e pega duas cenouras na mesa, correndo para fora da casa para ver o Donkey. Sim, ela deu o nome do burro em inglês para ele.

― Você pega demais no pé dela. ― minha mãe resmunga ― Desnecessário isso.

― Até você, mãe?

― Ela é boa gente. Está sempre animada, disposta a ajudar. E foi a sua avó quem teve a ideia de ver os vídeos antigos dela.

― Sim, fui eu. No meu login e senha. Laura não se conectou em momento algum.

― Já entendi!

― Vá pedir desculpas a ela então. ― minha mãe ordena ― Ela não é a Isadora. Não pode maltratá-la só porque um dia você confiou demais na pessoa errada.

― Quem falou em Isadora? ― pergunto, nervoso.

― Você nunca fala, mas repele todas as mulheres que estão ao redor, temendo que elas façam o mesmo com você. Já faz oito anos e você ainda age como se ela tivesse ido embora com outro ontem. Até quando vai deixar aquela imbecil governar a sua vida?

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