Os trabalhos de César - Parte 1

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Era uma entrevista de emprego informal onde o tímido César conversava com sua provável chefe sentado no sofá. Seus olhos se esforçavam para não denunciar a distração com as grossas pernas cruzadas sob a saia. Procurava olhá-la nos olhos, apensar da expressão dura com a qual ela o encarava. O tom de voz rígido com que a mulher lhe fazia perguntas o intimidava, o obrigando a se esforçar para mostrar uma boa imagem de si, pois sabia que não seria contratado se transparecesse ter medo de sua chefe. Era uma boa oportunidade ser secretário pessoal de uma empresária bem-sucedida. Conseguiu que seu currículo a interessasse e já havia chegado bem longe para perder a vaga por se deixar intimidar, mas não era apenas a voz firme e as expressões duras que o intimidava. Apensar da dureza do olhar, aqueles olhos eram lindos e o distraíam tanto quando aquelas pernas grossas. O rosto apresentava tímidos sinais de idade que não entregam os cinquenta anos daquela mulher com cabelos loiros e curtos. Nem um sorriso e mesmo assim ela o encantara.

Depois de tanto se dedicar ao trabalho, Clara decidiu seguir o exemplo de sua amiga Vera e decidiu contratar um assistente. Alguém muito confiável a quem poderia se confiar até as tarefas mais pessoais. Fez anúncios, pediu indicações e começou a receber currículos. Todos muito interessantes, mas para o que ela queria, necessitava de uma entrevista em que poderia sentir se os candidatos estavam a altura do que ela desejava. Entre homens e mulheres, Clara entrevistou vários, mas ninguém a interessava. Todos tinham excelentes currículos, se portavam profissionalmente, se expressavam bem, mas algo mais. Então aparece este rapaz, César. Tinha um bom currículo, mas não dos melhores e de início demonstrava uma timidez que normalmente a faria dispensá-lo antes mesmo de terminar, mas havia algo naquele rapaz que mexia com ela. Homens, e até mulheres com olhares discretamente desejosos eram comuns. Clara gostava daquilo, mas aquele rapaz gradualmente vencia a timidez na entrevista enquanto a olhava nos olhos, como se encontrasse segurança no fundo dos olhos dela. Aquilo a intrigava, pois, não era comum a encararem daquela forma, pois foi sempre uma pessoa muito intimidadora. César não era assim, mas parecia estar tão disposto a ter aquele emprego que superava a si mesmo olhando no fundo dos seus olhos. Era um olhar sedutor que provavelmente fazia outras mulheres se derreterem, embora ele demonstre não fazer ideia disso.

Depois da entrevista, Clara já disse ao rapaz que estava contratado que já poderia começar no dia seguinte. César saiu feliz, se esforçando para conter sua alegria e manter alguma postura pelo menos enquanto estivesse naquele edifício.

César começou o trabalho no dia seguinte. Tinha um bom porte físico, os cabelos curtos e a barba por fazer e ia ao trabalho sempre com camisa e calça sociais muito bem ajustadas no seu corpo. Clara já o deixara cheio de tarefas. Entre análises, relatórios e idas pelo Bairro Velho levando documentos, passava o dia constantemente atarefado. Era difícil acreditar que ela lidava com aquilo tudo sozinha antes de contratá-lo. Toda a vez que Clara o chamara, o tom de voz rígido dela o fazia pensar que fizera algo errado. Todas as ordens eram dadas no tom rígido de sempre. César foi se acostumando ao jeito frio e ríspido da chefe na primeira semana e levou para o dia a dia o jeito de tratar ela que deu certo na entrevista. Sempre a olhava os olhos. Embora precisasse tomar cuidado para não se perder aqueles olhos que o enfeitiçavam. Clara aos poucos via que acertara na contratação quando a relação entre os dois fluía muito bem, à maneira dela, é claro. Clara gostou do funcionário que a olhasse nos olhos sem abaixar a cabeça ou desviar os olhares quando ela falava com ele, principalmente quando os raros desvios de olhar se direcionavam as suas pernas. Clara começou a usar menos calças usando mais saias e vestidos para ir trabalhar.

Com alguns semas de trabalho, Clara foi sentindo mais confiança em César e começou a lhe passar tarefas mais pessoais.

— César, eu preciso de uma tarefa sua.

Contos do Bairro Velho - 01Onde histórias criam vida. Descubra agora