O último suspiro

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Luísa olhava para o oceano, alaranjado devido ao pôr do sol. Estava sentada na areia, e apertava a bolsa enquanto os pensamentos fluíam pela sua cabeça. Ela sempre gostou de água, especialmente do mar. Admirava a maneira como uma gota de água era inofensiva mas, quando as gotas se juntavam no imenso oceano, eram perigosas e temidas. 

O oceano sempre esteve presente na sua vida. Quando era pequena, os seus pequenos pés corriam o extenso areal com os primos, brincando á apanhada e colhendo conchas para a sua coleção. No fim do dia, a família reunia-se e comeriam todos no pequeno restaurante familiar mesmo á beira da praia, observando o sol a desparecer por entre as ondas. 

Esses tempos de felicidade já eram. Desde há um tempo que não sentia mais a felicidade nos encontros, já não tinha o sorriso brilhante de antes, já não conseguia sentir a felicidade a preenchê-la depois de assistir a um pôr do sol, e as memórias felizes vão se tornando cada vez mais distantes, ao ponto de já nem parecer reais. 

A jovem de 16 anos estava a afundar-se perigosamente, gota a gota, discreta e silenciosamente. Luísa só se apercebeu quando era tarde demais, quando a água já lhe ia pelo pescoço e estava a ficar difícil de respirar.

Ela poderia ter gritado, mas ninguém se aperceberia, e a mesma não tinha coragem para tal. A adolescente até mandou sinais, mas eram demasiado ténues e nunca foram levados a sério. Não duvidava nada que, se gritasse a plenos pulmões, iria ser julgada e atacada. Iria ser chamada de sensível, fraca e de só querer atenção. Ou tudo ao mesmo tempo. 

De qualquer forma, Luísa nunca tencionou dizer nada. Nunca teve intenção de magoar os seus pais, fechando-se e não desabafando com eles. Mas quem a poderia julgar? Os pais educaram-na com base no "respeito" (ou seja, medo) sendo difícil contar-lhes seja o que for. O controlo dos mesmos era sufocante, e as discussões horríveis e frequentes. Eles não fizeram o mínimo para a tentarem compreender, e em vez disso, chamavam-na de preguiçosa, de vítima e desvalorizavam cada vez que tentava falar sobre a saúde mental. E pior, faziam-na crer que ela era a culpada, reforçando que a amavam e coagindo-a emocionalmente. 

Os sorrisos foram-se. A sua autoestima estava mais baixa do que nunca. Cada vez que se olhava ao espelho só conseguia pensar em como estava gorda, feia e em como nunca ninguém a iria mar. Só conseguia pensar em como se odiava e em como gostaria de ser alguém completamente diferente.

As amizades também não estavam muito bem. Devido ás suas experiências anteriores, não se conseguia abrir com elas, e sentia-se desconfortável em conversar sobre assuntos íntimos como a saúde mental. A sua ansiedade falava mais alto, ficando a pensar sobre o que aconteceria se lhes contasse, como o clima entre elas poderia mudar e o que iriam pensar dela. Mantinha um rosto sorridente, um sorriso falso que magoava. Mas pelo menos, pensava ela, elas não ficam preocupadas. 

Aos poucos, foi perdendo a razão de viver. Os seus dias, que costumavam ser brilhantes e variados, tornaram-se cinzentos e escuros. A dor só aumentava, a ansiedade só aumentava e afundava-se cada vez mais numa depressão profunda. 

Ela tentou batalhar, mas sabia que era uma batalha perdida. A luta era cansativa e dolorosa, e exigia uma força que já tinha esgotado, uma força que lhe tinha sido tirada aos pouco pelos pais, pelos "amigos", pelos sorrisos falsos, pela escola, pelo insucesso. Doía demasiado.

Mas tudo iria acabar. Luísa decidira abraçar os seus sentimentos, e deixar de lutar contra si mesma. Com um corpo a lutar para viver e uma mente a lutar para morrer, a mente ganhou.

Luísa mirava o mar uma última vez, com lágrimas nos olhos. O seu sangue manchava a macia areia, mas ela não sentia nada. O seu último suspiro foi de alívio e libertação. Pelo menos, Luísa morreu com um sorriso nos lábios e no seu lugar favorito. 

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⏰ Última atualização: Dec 27, 2021 ⏰

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