Eu admiro os passivos. Eles que fazem todo o esforço e ainda são chamados de "passivos": sentam em um membro às vezes bem maior do que o seu corpo comporta:
-- Espera só um pouquinho, não tá entrando. Pega mais lubrificante. – disse agachado segurando o pau do cara deitado. É como diz a internet "se deus fez é porque...".
Quicam; ficam com as pernas abertas em posições contorcionistas; e nem sempre os caras valorizam o cu que ganham:
-- Você já gozou? – perguntou após ouvir o urro do cara atrás dele.
-- Já – respondeu ainda revirando os olhos – desculpa, gato, não consegui segurar mais. – Sentiu o pau saindo de dentro dele. O cara levantou e foi até o banheiro sem perguntar "você gozou também? Se não, vou te fazer gozar". Virou-se de costas e ficou olhando o teto, ainda de pau duro.
Dizem que os ativos estão em extinção, que há mais passivos em um quilômetro quadrado do que um ativo:
-- Passivo, passivo – disse rolando a barra do Grindr verificando o que os caras ao seu redor curtiam. – Mais um passivo... outro passivo. Olha, um ativo. Passivo, passivo. Versátil.
Versátil. Antigamente as pessoas chamavam de relativo quem curte as duas coisas. Agora tem os versáteis ativos ou passivos. Tipo, prefiro essa posição, mas estou aberto a fazer essa outra, para mim não tem tempo perdido. Aberto a possibilidades. Pois é, como se dois ativos não pudessem ficar juntos sem um penetrar o outro.
Ser ativo tem lá o seu fardo, nada comparado, claro. Pelo menos para mim. Ter que ver os sinais se os caras estão curtindo para ter uma segunda vez, no mínimo:
-- Tá tudo bem?
-- Tá ótimo! – respondeu sorrindo.
-- Posso fazer do jeito que você quiser.
-- Tá tudo bem? – perguntou para outro.
-- Tá sim.
-- Certeza?
-- Você não precisa ficar perguntando, se não estiver ok eu te falo.
-- Ai! – exclamou um outro num gemido que não sabia se era dor ou prazer.
-- Te machuquei? – perguntou parando de foder.
-- Pelo contrário. Não para, por favor.
Bom sinal. Vai, continua, fode.
Ou tentar controlar o gozo.
"Não, não, não, não goza agora. Pensa em outra coisa. Na mãe não, cérebro, pelamor. Nem na morte da minha avó. Pode ser uma tragédia qualquer."
-- Tá tudo bem? – Perguntou o cara rindo com as pernas abertas em um frango assado. – Você está fazendo uma careta.
-- A gente pode mudar de posição?
-- Claro! Como você quer fazer?
Ufa, tempo para respirar. Se controle, pinto. Vamos lá...
Sem falar na virilidade que o ativo tem que ter. Tem que ser o machão heteronormativo. Como se caras afeminados não pudessem ser ativos.
Para mim tem mais uma complicação meio grande.
-- Você está ficando com alguém?
-- Nopes.
-- Por que você não entra no app? Tem uns caras interessantes aqui perto. Se você quiser, eu deixo você trazer alguém aqui, tem um quarto vago.
-- Ah, não, hoje eu estou de boa.
A pressão de ser o ativo comedor. A verdade é que eu já tentei sexo casual algumas vezes:
-- Você quer que eu tente te chupar.
-- Calma, vai dar certo. – Já estava na punhetinha da misericórdia tentando fazer o pau levantar. O cara olhava para ele com uma certa comoção.
-- Tem algo que eu posso fazer?
-- O problema é comigo, desculpa.
-- Tudo bem, a gente pode gozar de outra forma.
Esse dia foi foda, não literalmente, claro.
O problema dos apps é que eu não vou conseguir sair de imediato.
-- Tá afim de quê?
-- De bater papo e ver o que rola e você?
-- Sexo.
-- Tá afim de quê?
-- Ah, de conhecer alguém legal e ver o que rola.
-- Em um app de pegação? A galera aqui tá afim de sexo.
Não dá para cozinhar o povo em banho maria por muito tempo para tentar ter um mínimo de conversa, ver se rola uma química. É claro que eu queria passar meu pinto na cidade inteira, comer vários cus todos os dias, mas não vai...
-- Tudo bem se a gente sair só para conversar?
-- Por mim tudo bem.
Observava ele falando, era como se o mundo ficasse em câmera lenta. Seus lábios se movimentando, esboçando um sorriso. Ele falava com tanta paixão sobre as coisas que gostava de fazer que fez o seu pau latejar de tesão.
-- Você está prestando atenção no que eu tô falando? – Perguntou sorrindo.
-- Em cada palavra. – respondeu tocando o pau debaixo da mesa.
-- Seu pau está muito duro – disse sentando nele, naquele quarto mais tarde.
-- Que bom...
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Crônicas de um mundo gay
Short StoryHistórias do dia a dia que poderiam acontecer comigo, com você ou com qualquer pessoa no mundo gay.