O noivo

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Estava encostado no muro fumando um cigarro. O cigarro em uma mão e o terno na outra. Fumava como quem não tinha pressa, diferentemente, das pessoas que cruzavam com ele naquela situação. Na camisa aberta despontava alguns pelos do peito e em um fone de ouvido que cruzava o seu corpo podia se ouvir, caso chegasse bem perto, uma música do Kings of Leon – Knocked up. Tragou lentamente observando a fumaça sair de seu corpo. No seu semblante parecia que precisava tomar uma importante decisão que mudaria sua vida e o cigarro era um momento de paz, um limbo, em que ele não precisaria decidir nada. Um minuto de paz para um cigarro. Jogou a bituca longe e soltou o terno no chão.

-- Não atende! – Disse a senhora balançando o telefone – toca, toca, cai na caixa e nada. Eu não sei o que fazer.

As pessoas na sala paroquial pareciam extremamente preocupadas, até um homem tempestuoso entrar sem ar.

-- Onde que está o cretino do seu filho? – Ele gritou com a mulher.

-- Não fala assim com a minha esposa! – Interveio o marido da senhora que tentava ligar para o filho.

-- Por que ele está fazendo isso com a minha filha? Eu sabia que algo assim poderia acontecer, logo hoje! Eu tentei avisar.

-- Eu tenho certeza de que tem alguma explicação plausível para isso, deve ter acontecido algo, algum acidente. Ele jamais faria algo assim.

-- Eu não vou ficar aqui ouvindo você falar o que quiser sobre o meu filho. Ele tem caráter sim, não vou deixar você abrir a sua boca suja para falar qualquer coisa dele.

O rapaz no fundo da sala paroquial acompanhava a discussão, pensando que a qualquer momento teria que separar uma briga entre os sogros.

-- Então onde ele está? Me diz! Já era para ele estar aqui! Por que ele não atende a merda desse telefone? Minha filha está esperando dentro do carro, pronta para entrar na igreja. Os convidados estão esperando. Onde está o seu filho?

-- Eu posso tentar encontrá-lo – disse o rapaz.

-- Eu vou com você – disse o pai da noiva furioso.

-- Eu acho melhor você ficar aqui, sua filha pode precisar de você.

-- Você faz ideia de onde ele pode estar? – Perguntou a senhora.

-- Eu acredito que consigo encontrar ele, tenho algumas ideias de onde procurar.

-- Por favor, traz ele para cá.

Ele assentiu e saiu pela porta.

Não fazia ideia de por onde começar. Como encontrar alguém que não queria ser encontrado? Só esperava que o motivo do sumiço não fosse o que ele estava pensando. Com tantos dias para ele ter uma crise, logo hoje. Crise? Ele já fugiu outras vezes quando precisava tomar decisões difíceis, era padrão dele. Sorriu com a lembrança. O sorriso sumiu de seu rosto ao lembrar que estava no olho do furacão, ele também estava envolvido dessa vez, querendo ou não. Parou o carro no estacionamento do mercado onde eles costumavam ficar bêbados até tarde da noite quando eram jovens e inconsequentes. Lá estava o paredão do estacionamento com um grafite. Desceu do carro e andou naquela direção. O cigarro no chão, os lábios dele haviam tocado aquele cigarro há pouco, e o terno também. Pegou o terno e sentiu o cheiro inebriante dele. Olhou em todas as direções tentando avistá-lo em algum canto. Voltou para o carro colocando o terno no banco do carona, deu ré e seguiu. Não fazia ideia de onde ir agora. Tinha um lugar, um posto abandonado na saída da cidade, que eles costumavam ir.

Crônicas de um mundo gayOnde histórias criam vida. Descubra agora